Um dos grandes filões do mercado editorial, a edição capa-filme é aquela que aproveita um lançamento de uma obra derivada para recolocar um livro em destaque e tentar reaquecer suas vendas. De olho na adaptação dos cinemas para Inferno, a Arqueiro preparou uma nova edição do livro de Dan Brown, lançado originalmente em 2013 e que já vendeu 800 mil exemplares no Brasil. Porém, ao término das mais de 400 páginas do livro, fica uma questão: As rocambolescas teorias de conspiração de Brown ainda encontram espaço dentro da ficção comercial?
Em Inferno, a trama começa de maneira diferente de Código da Vinci e Anjos e Demônios, livros anteriores de Brown. Agora, Robert Langdon encontra-se desacordado e desmemoriado em um quarto de hospital em Florença, Itália, e em posse de um cilindro com referências ao Inferno de Dante, obra-prima do poeta italiano. Após sofrer uma tentativa de assassinato por uma misteriosa e decidida matadora de aluguel, o professor passa o restante do livro tentando desvendar os segredos revelados no cilindro junto com a Dra. Sienna Brooks, uma médica de QI elevadíssimo e passado obscuro.
Bertrand Zobrist, vilão de Inferno, morre logo no começo do livro, mas aos poucos vamos entendendo os ideais do bilionário e psicopata patológico, que pretende dar um jeito na superpopulação humana ao liberar na atmosfera um supervírus para restaurar o equilíbrio mundial. O livro levanta algumas questões morais e éticas. É válido o sacrifício de “poucos” para salvar as gerações futuras? A Terra realmente possui a capacidade de se autogenerar quando as coisas saírem do controle? Fugindo dos temas religiosos que permearam sua carreira, Brown se debruça sobre a ideologia do Transumanismo, no qual seus seguidores defendem que a humanidade deve ter o total controle de sua evolução. Mesmo sendo extremista, a linha de raciocínio de Zobrist é bem construída, com uma interessante referência à Peste Negra e como algumas pessoas acreditavam que ela foi responsável por manter o equilíbrio da população durante a Idade Média e deu espaço para o surgimento da Renascença.
Apesar da tentativa de construir uma trama mais atual, os velhos vícios da escrita de Brown estão presentes. A extensa descrição de monumentos, obras de arte e outros cenários que Langdon e Sienna exploram por Florença, Veneza e Istambul é cansativa e sem utilidade para o desenvolvimento da trama. Os comentários de Langdon sobre a história por trás das obras de Dante ou enigmas em obras de artes centenárias parecem forçados e irrelevantes, ainda mais com o professor e Sienna sendo alvos de constante perseguição. Langdon está longe de ser o personagem interessante, inteligente e perspicaz de obras anteriores. Em Inferno, é Sienna quem traz um pouco de ar fresco à trama, com a revelação de seu misterioso passado sendo uma das boas viradas de enredo.
Os momentos de ação também estão mais espaçados do que em outras obras, e, com exceção da parte final na antiga Cisterna de Istambul, Dan Brown não consegue demonstrar sua antes infalível habilidade de criar uma trama onde as páginas praticamente viravam sozinhas. Em um claro sinal do desgaste de uma fórmula de sucesso, Dan Brown terá que mostrar em Origin que pode ir além das trivialidades sobre obras de artes.