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Crítica

Arquivo X - 11ª temporada | Crítica

Chris Carter continua o árduo trabalho de destruição da mitologia da sua própria criação

03.04.2018, às 17H48.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H25

Chega a ser uma reclamação recorrente o quanto Arquivo X está sendo equivocada desde que retornou para seu revival. Igualmente recorrente tem sido todo o trabalho de Chris Carter em macular códigos mitológicos estabelecidos por ele mesmo quando a série ficou no ar entre 1993 e 2002. É claro que todo seu empenho absurdo para fazer o Canceroso funcionar depois de tantas “mortes” seguidas ou de manter a ultrapassada trama de dominação mundial também cansam. Porém, nada é mais alarmante do que a corrosão progressiva de tudo que constituía a série e – por consequência – seus protagonistas. Arquivo X está dando tiros no escuro.

Carter não se abala. Está lá, no seu trono, totalmente seguro do quanto os fãs esperaram por esse retorno e do quanto confiam nele. De alguma forma, ele desenvolveu uma consciência de que precisava surpreender e tão dono de suas próprias ideias, resolveu que manipular tramas que já estavam resolvidas e estabelecidas era o que deveria ser feito. Ledo engano... A cada novo episódio mitológico, um pedaço da dignidade da série escorre pelo ralo; e por uma razão básica: o público se sente enganado acreditando em coisas que vão sendo, uma a uma, desmentidas ou reviradas deliberadamente.

Nesse décimo primeiro ano (com 4 episódios a mais que na temporada 10), o tempo de hiato levou a crer que alguns ajustes no desastre que foi o Season Finale anterior seriam feitos. E até foram, mas da forma mais mequetrefe possível, com Scully (Gillian Anderson) acordando de uma visão, determinando que tudo naquele episódio não tinha de fato acontecido. Planejamento? Não. E a prova disso é que assim que decidiu que tudo aquilo não tinha ocorrido, Carter precisou abrir mão das participações dos novos agentes vividos por Lauren Ambrose e Robbie Amel, que já havia sido anunciada como recorrente. O showrunner não tem a menor ideia do que está fazendo e isso está vazando notoriamente.

A Verdade Está Envergonhada

Os enganos são muitos, começaram com a insistência em tornar o Canceroso (William B. Davis) o executor de uma conspiração de dominação que apagou completamente a boa ideia da premiere do retorno, lá atrás, quando foi insinuado que os alienígenas, embora existissem, não estavam interessados em nós. O desinteresse deles foi mantido, mas isso não torna a trama do Canceroso interessante. Quando esse ano 11 começou com as expectativas sendo massacradas com uma desculpa furreca de “foi tudo uma visão”, o alerta vermelho ganhou força total. Incapaz de pensar em uma nova forma de contar a história central da série, Carter começou a mexer no que já tinha contado antes.

Nos episódios não-mitológicos o problema ainda está ali, mas há alguma boas exceções, como o criativo "The Lost Art of Forehead Sweat" e o realmente original "Rm9sbG93ZXJz", que quase sem texto, leva os dois agentes a um confronto com o mundo moderno, algo que a série precisava muito fazer desde que esse retorno começou. Há episódios presos a vícios do passado, como "Plus One e Familiar", uma boa história de bruxaria que remete ao espírito da série de modo bastante adequado. Esses pequenos acertos, contudo, não fazem com que a temporada se livre de seu processo de agonia.

"Ghouli" é um episódio-chave, que decidiu fazer aquilo que todos estavam querendo há muito tempo: resolver o paradeiro de William, filho dos agentes. Carter tem uma longa tradição de reservar esses segredos por muito tempo, mas com Anderson e Duchovny podendo pular fora a qualquer momento, não era prudente se estender mais. "Ghouli" é um bom episódio, trabalha bem as questões de aproximação entre William e os pais, consegue tornar a angústia de Scully muito palpável, mas termina com a primeira explosão equivocada no que já fora estabelecido antes. Ao bulir com a origem paterna de William, o roteiro joga por terra anos de tensão, de empatia, de respeito; e através de um flashback oportunista, tenta nos convencer de que o que está acontecendo serve ao processo de crescimento do programa. Porém, tudo soa forçado e arrogante.

Não Confie em Ninguém (principalmente no Carter)

[Atenção SPOILERS!]

O último prego do caixão é colocado no final da temporada, que depois da recusa de Anderson em voltar pode acabar sendo a última. Os planos desse episódio eram convergir a busca dos agentes pelo filho com o encontro dele com os pais. Numa espiral de eventos equivocados que beiram a insanidade, acompanhamos o criador da série, no alto de sua prepotência criativa, ir desmantelando a própria mitologia de acordo com a conveniência do que precisa ser dito agora. A jornada de Mulder e Scully em busca do filho – que é parte importante das expectativas dos fãs por todos esses anos – é reduzida a pó diante de nossos olhos, quando a existência dele é atribuída a alguma experiência e sua “morte” é enfrentada com conformidade imediata simplesmente porque Scully está grávida novamente. 

Isso tudo se ornamenta com várias “mortes” que não se efetivam e deixam o criador livre para trazer todos de volta caso Anderson perca a cabeça e queira voltar. A saída do Canceroso nos momentos finais dá o tom do quanto Carter debocha dos fãs deliberadamente. Não há um só movimento dessa que respeite o que Arquivo X já foi um dia e tudo é tão ruim que soa como uma paródia sem graça, onde os atores foram jogados sem perceberem. Não há mais nenhuma chance de recuperação de todos esses absurdos que foram cometidos e ao que parece, até mesmo seu bom legado na televisão foi arranhado gravemente por esses impropérios.

Se vimos mesmo um final de série, o que fica é toda essa frustração. Se não foi, tudo pode piorar categoricamente sem Scully no páreo. Enfim, se há um exemplo de revival que nunca deveria ter acontecido, esse é o maior. A décima primeira temporada se foi e só deixou um rastro de incompetência, vergonha e raiva, muita raiva.

Nota do Crítico
Ruim

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