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Lembra desse? Capitão Marvel

Lembra desse? Capitão Marvel

17.05.2001, às 00H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H12

Para quem ainda não sabe, toda vez que profere a palavra Shazam, o jovem Billy Batson sofre a mais notável das transformações: de um pirralho insignificante, torna-se um adulto!

Tá, mas por que ele quereria desperdiçar sua infância simplesmente crescendo de uma hora para outra&qt;& Aí é que entra um detalhe importantíssimo. Shazam é, na verdade, um acróstico formado pelas iniciais dos seguintes deuses: Salomão, Hércules, Atlas, Zeus, Aquiles e Mercúrio. Providencialmente, essa combinação transforma nosso mirrado infante no mortal mais poderoso da Terra. Nada de Super-Homem ou Incrível Hulk... estou falando é daquele cara com uma suspeita capinha branca (pelo visto, apurado senso estético não estava incluído no pacote de dádivas divinas...) amarrada com uma corda. Aquela mesma, com uns "rococós" que parecem bordados à mão. Sem falar no uniforme vermelho riscado por um raio amarelo, com todo jeitão de embalagem de queijo: o Capitão Marvel!

Tudo bem que a coisa é meio dura de engolir, mas, comparado com outros super-heróis que desfilam por aí, até que a origem do Capitão não é assim tão ruim.

Um garoto abençoado

E os deuses, desde cedo, souberam ser generosos com o pequeno Billy. Não foi à toa que, em 1941, o menino chegou à Hollywood naquele que é considerado o melhor seriado de super-heróis da época: The Adventures of Captain Marvel. O mais irônico na história é que a idéia origina da Republic Pictures era filmar as aventuras do Super-Homem. No entanto, não se entendeu com a National Periodical (a DC Comics de então) e levou o projeto à concorrente Fawcett Comics.

Deu no que deu. Quem sabe, por isso, o Capitão Marvel viva sempre com aquele infame sorrisinho estampado no rosto.

Sucesso de crítica e de público, o seriado valorizou o cachê do astro Tom Tyler, veterano de incontáveis faroestes de matinês; sem falar que lhe abriu as portas para muitos outros westerns, um filme de múmia e ainda outro herói das HQs, um certo espírito-que-anda... mas, disso, falaremos em outra ocasião.

A equipe de produção valeu-se dos melhores efeitos especiais disponíveis na época. Havia de tudo, desde a transformação com direito a explosão de fumaça até as excelentes (e abundantes) cenas de vôo, nas quais, muitas vezes, nosso herói era substituído por um boneco em escala natural, suspenso por cabos. Apesar do roteiro fazer coro com a baba típica dos clichês de matinês, não caiu na desgraceira total dos seriados do Batman. Outro assunto para depois...

Sem dó, mas no capricho

A aventura começava com uma tal Expedição Malcolm que zarpou rumo ao terrível Vale das Tumbas (dramático, não&qt;&) em busca dos tesouros de uma certa Dinastia Escorpião no Sião de milênios atrás. Numa das tumbas, encontraram um ídolo em forma de (consegue adivinhar&qt;&) escorpião, capaz de transformar pedras em ouro e disparar rajadas de energia. Logicamente, como bons arqueólogos, a troupe acionou a traquitana milenar e viu-se presa nos subterrâneos. Na confusão, Billy Batson - Frank Coughlin Jr -, o operador de rádio do grupo, encontrou uma câmara secreta, onde habitava um senhor barbudo chamado (adivinhou&qt;&) Shazam. Este lhe conferiu os poderes do Capitão Marvel a fim de que o ídolo não caísse em mãos erradas. É claro que, logo em seguida, foi justamente isso que aconteceu. O vilão intitulado (só dou uma chance...) Escorpião roubou o tal ídolo. Daí em diante, foi perseguição após perseguição com o Capitão na cola da estatueta e o malvadão tentando eliminar o herói e seus amigos. Por incrível que pareça, para os padrões da época, os episódios eram bem dirigidos, com uma edição ágil e cenas de ação empolgantes; sem falar na produção bem cuidada de seus 12 episódios.

Não vá pensando, porém, que tudo eram flores. Aos olhos de hoje, alguns conceitos americanóides são indigestos. Por exemplo, a expedição foi atacada no primeiro episódio por uma estereotipada tribo de nativos do Sião, fuzilada sem dó pelos arqueólogos e pelo próprio Marvel. O galante herói metralha (isso mesmo!) três deles. Será que não sabiam que os EUA têm o direito de se apossar dos tesouros de qualquer nação sem pedir consentimento&qt;&

Como já deve ter ficado claro, com o Capitão Marvel, meliante não se criava. Ele não tinha a menor dó da bandidagem. Tanto que arremessava os malfeitores através de portas ou do alto de pontes e edifícios sem cerimônia; pior: até motor de carro ele jogou na cabeça de um adversário! E não se iluda. O pequeno Billy não era uma flor comparado à sua contraparte... Virava e mexia, descia o fogo de seu 38 na fraternidade criminosa!

Costeletas Marvel!

Um processo movido pela DC comics manteve o Maioral Vermelho algumas décadas longe das telas e dos quadrinhos, até que os deuses, em sua sabedoria, decidiram que já era hora de devolver Billy à glória; agora através da mídia mais poderosa do momento: a televisão!

Infelizmente, os orçamentos de produções eram bem mais modestos do que o pobre Zeus poderia supor e o resultado foi o seguinte: historinhas água com açúcar, onde não havia ação alguma; só adolescentes imbecis se metendo em encrenca e Billy tendo que apelar para o seu alter ego divino a fim de salvar os toupeiras; sem falar na lição de moral boboca que aplicava na galera e na inevitável conversa edificante entre Billy e o Mentor - Les Treymayne - sobre a questão da semana...

...mas quem diabos era esse tal Mentor&qt;& Acredite se quiser, era um velhote que andava de trailer com Billy (que relação mais suspeita...) para cima e para baixo ajudando as pessoas. Por sinal, o sr. Batson - Michael Grey - em questão era um mala sem alça de primeira; daqueles moleques com cara irritante que, só de olhar, dá vontade de bater. Antes o menor armado do seriado anterior! Pelo menos, merecia o poder que tinha...

O legal mesmo, no entanto, era o que rolava dentro tal trailer. Nada de sacanagem... é que era lá dentro (!) que os deuses apareciam para aconselhar o tonto do Billy. Por sinal, era a única cena decente nos episódios; curiosamente feita no melhor estilo de animação "realista" dos estúdios Filmation, a produtora do seriado. De resto, os efeitos especiais eram tão vagabundos que, quando não voava num efeito de cromakey sem-vergonha, o Capitão Marvel aparecia apenas da cintura para cima, balançando os braços contra um fundo azul... infâmia que nem o seriado de trinta anos antes ousou fazer. E olha que essa palhaçada até que durou. Foram 28 episódios, produzidos entre 1974 e 1976. Por sinal, dois os atores viveram o Capitão durante a série. O primeiro, Jackson Bostwick, é facilmente identificável pelo corte de cabelo em formato de penico e suas alegres "suíças"; algo como o falecido astrônomo Carl Sagan com roupa de super-herói...

Na segunda temporada, foi substituído por John Davey, que, com sua cara de batata, também não tinha nada a ver com o Capitão Marvel. Para piorar a situação, nessa temporada, a série (de apenas meia-hora de duração) ganhou uma irmã: a Poderosa Ísis. Com quem, além de dividir o horário, teve dois crossovers. Aí, não teve estômago que agüentasse e não demorou muito para ambas as séries irem para o vinagre. Graças aos deuses!

Uma família mal animada.

Os deuses, entretanto, não desistiram tão facilmente e deram mais uma chance para que a Filmation reparasse seu erro; desta vez fazendo aquilo que sabia fazer direito: desenho animado.

Caso você não saiba, esse estúdio ficou famoso nos anos 70 graças a suas animações de aventura, de estilo mais figurativo. Foram eles que realizaram os primeiros desenhos animados do Batman (aqueles onde o Batmóvel passava sempre pelos mesmos prédios), o cult Jornada nas estrelas, o excelente Flash Gordon e, em tempos mais recentes, os politicamente corretos He-man e She-ra, entre outros. Uma das características mais chamativas da Filmation era o uso da técnica da rotostopia, onde se filma primeiro um ator ou maquetes e, a partir desse filme, realiza-se a animação dos movimentos.

Desta vez, o espírito irreverente das HQs fez-se presente, dando oportunidade a toda a família Marvel: Mary Marvel, Capitão Marvel Jr., Sr. Malhado, Sr. Cérebro, Adão Negro e claro, o maior de todos os cientistas malucos, o Dr. Silvana. Mesmo assim, o resultado foi morno. A série teve apenas 13 episódios, produzidos em 1981; um trabalho menor da Filmation, se comparado a outros. Curiosamente, muitos de seus episódios foram escritos por um certo Paul Dini, que, anos mais tarde, ajudaria na criação do desenho definitivo do Homem-Morcego; e que, recentemente, produziu em parceria com Alex Ross o gibizão Poder da esperança (confira o preview do Omelete aqui), que tem como herói você sabe quem.

Curiosamente, a série dividia horário com a Escola de super-heróis (Hero High), uma série muito pior, mas que durou 26 episódios! Pobre capitão! Teve de amargar a miséria de fazer uma ponta num dos episódios dessa escola horrível...

Pra quem acha que desgraça pouco é bobagem...

Não bastassem as recentes mancadas, em 1977, os deuses deixaram o pobre Capitão Marvel passar ainda mais um vexame. E desta vez não foi sozinho. A rede NBC produziu um especial em duas partes intitulado Legends of Super-Heroes. Uma infame versão live-action da Liga da Justiça. Queimaram a cara junto de nosso herói, os personagens Batman e Robin (Adam West e Burt Ward reprisando seus papéis na antológica série dos anos 60), Gavião Negro, Lanterna Verde , Flash e Canário Negro contra as maquinações do Charada, Solomon Grundy, Dr Silvana ( vivido por Howard Morris), entre outros. Aqui, Marvel foi interpretado por um tal Garret Craig. Uma pérola do kitsch inédita por estas paragens. Não que alguém vá sentir falta, certo&qt;& E, se por um acaso, alguém conhecer uma palavra mágica capaz de transpor personagens das HQs para as telas com um mínimo de decência, por favor, conte pra gente. Afinal, nem os poderes unidos dos deuses do Olimpo conseguiram fazer muito pelo mortal mais poderoso da face da Terra...

Aí, não teve paciência divina que agüentasse. E pararam de vez as produções com o Capitão Marvel. Quem sabe, um dia, porém, os deuses aprendam com seus enganos e acertem mão em uma nova adaptação para as telas. Até lá, é melhor esperarmos para pronunciar o nome do mago Shazam, somente quando for necessário.

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