Desde que a Lucasfilm foi vendida para a Disney e Star Wars entrou na máquina de produção da empresa, muitos dos seus conteúdos deixam a sensação de “por que preciso assistir isso?”. A verdade é que sempre buscamos algum tipo de justificativa, seja na continuação de uma história, encontro de algum personagem ou a busca por um tema que nos agrade. The Acolyte teve uma grande ideia em sua concepção original, mas que se perdeu no caminho e foi um fracasso. Skeleton Crew contou com ótimos diretores, bons personagens, mas ninguém nem lembra deles. O Livro de Boba Fett mais serviu de retcon para a saída de Grogu de The Mandalorian do que qualquer outra coisa. E é aí que Andor entra para bagunçar toda essa história.
Por que contar a história de um dos personagens de Rogue One, filme celebrado pelos fãs, e que mostra uma história fechadinha dentro do cânon principal? A grande resposta veio já na primeira temporada e aumenta exponencialmente com o segundo ano: porque essa história importa. Se os episódios anteriores mostravam como Cassian (Diego Luna) descobre um propósito para lutar e seu papel nessa grande revolução na Galáxia contra o Império, a segunda temporada fala sobre consequências e até onde estamos dispostos a lutar pela nossa liberdade.
A série comandada pelo showrunner e roteirista Tony Gilroy, mistura novamente a nossa realidade com a fantasia de Star Wars para mostrar a dor e os crimes que governos não democráticos impõem aos cidadãos. Se Star Wars originalmente era uma metáfora para as grandes guerras do século 20 e a Guerra Fria, George Lucas atualizou a história para o governo George W. Bush com a trilogia prequel e agora Gilroy avança sobre os fatos das últimas décadas com Andor. Conflitos bancados como uma desculpa para exploração de recursos de energia, mas que na verdade são por outro motivo, protestos em praça pública, manipulação da mídia e paranoia. Tudo isso é visto ao longo dos quatro blocos de três episódios cada, formato inteligente que a Disney e a Lucasfilm escolheram para o lançamento.
A história da segunda temporada de Andor começa um ano depois do final da passada. A estrutura aqui é simples: cada bloco de três capítulos conta um arco da história dentro de um ano antes da Batalha de Yavin, conflito que marca o calendário de Star Wars desde Uma Nova Esperança. Começamos quatro anos antes e essa contagem regressiva funciona como uma bomba relógio tanto para a criação da Estrela da Morte, quanto para a história de Rogue One. Cassian segue em suas missões, enquanto Bix (Adria Arjona) e os companheiros vivem em um planeta agrícola. O Império logo chega por lá e o comportamento fascista do governo é ainda mais pesado.
Do outro lado da Galáxia, Luthen (Stellan Skarsgard) continua suas maquinações de bastidores, enquanto a sombra imperial cada vez se aproxima mais. Mon Mothma (Genevieve O’Reilly) está ainda mais isolada no Senado e precisa tomar mais atitudes decisivas para não deixar que a Aliança Rebelde seja destruída. Dedra Meero (Denise Gough) segue seu plano de encontrar o Eixo, mas recebe sua missão mais difícil até então: criar um plano para que o Império explore e acabe destruindo o planeta Gohrman, explorando um mineral existente no solo. A trama vai impactar diretamente Syril (Kyle Soller) e antigos e novos personagens.
Um dos grandes méritos de Andor é como essa grande teia de espionagem é escrita. São muitos personagens e pouquíssimos são esquecidos ou deixados de lado nesse emaranhado. Tony Gilroy e os outros roteiristas e diretores misturam a história de guerra com Bourne e John le Carré, com uma precisão praticamente ímpar quando pensamos em grandes blockbusters. O arco de Gohrman, mais especificamente os episódios 7, 8 e 9 estão entre as melhores coisas já feitas em Star Wars. Fica clara a referência aos fatos da Primavera Árabe, movimentos como Black Lives Matter e a forma como as autoridades lidaram com eles. Os episódios trazem uma grande novidade para Star Wars que é a presença da mídia, da imprensa e como o Império a utiliza, dando urgência e relevância para a trama.
É quase chover no molhado falar sobre o elenco, mas impressiona como Diego Luna e Stellan Skarsgard conseguem aumentar ainda mais a profundidade de seus personagens. A luta de Cassian Andor e todo seu caminho na segunda temporada, moldam diretamente o personagem que veremos em Rogue One. Das atitudes e frases que ele diz, tudo tem base nesses quatro anos de rebelião que a temporada mostra. O mesmo vale para Luthen, que eleva ainda mais seu ideal de que a causa é maior do que tudo. Genevieve O’Reilly também merece destaque, assim como Kyle Soller, que faz de Syril um personagem completamente humano. Até Saw Gerrera, personagem de Forrest Whitaker, tem seu espaço na trama, aproximando-o cada vez mais do Walter Kutz, de Marlon Brando, em Apocalypse Now.
Andor consegue fazer Rogue One se tornar ainda mais importante na história de Star Wars. A série coloca o espectador no meio do conflito entre Aliança e Império e não nos poupa das atitudes de nenhum dos dois lados. A falta de liderança dos rebeldes, nos primeiros capítulos, nos deixa aflitos com tudo o que isso vai gerar. Já a arrogância e pretensão imperial nos trazem esperança de que o plano rebelde vai dar certo. Mesmo sabendo o final, o caminho é cheio de surpresas, lições e o principal: valores.
Andor mostra que Star Wars ainda é uma franquia que importa, que os temas ali são universais e a galáxia não é tão distante assim. E garanto: ao final do 12º episódio, será impossível não querer dar play em Rogue One. Eu fiz isso e quando Leia diz “esperança” no fim do filme, tudo fica ainda maior.
Andor
Criado por: Tony Gilroy
Preciso ver.