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Crítica

Demolidor - 1ª Temporada | Crítica

Herói sem Medo volta às telas com dignidade e faz esquecer do péssimo longa-metragem

10.04.2015, às 15H10.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H36

A série do Demolidor da Netflix de cara, logo em seu primeiro episódio, já entende algo sobre o herói cego da Marvel Comics que o filme com Ben Affleck foi incapaz. Apesar de ter seus outros sentidos ampliados pelo acidente que lhe tirou a visão, Matt Murdock não é um super-herói convencional.

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Nos quadrinhos, o Demolidor aparece, sim, balançando-se por Nova York, feito um Homem-Aranha, mas sua agilidade e força são iguais a de qualquer atleta. Dessa maneira, em teoria, suas habilidades deveriam se parecer no "mundo real" muito mais com um Jason Borne do que com o aracnídeo. O Demolidor estabelecido nas HQs está mais para uma história policial do que uma aventura de mascarados superpoderosos, afinal.

Frank Miller entendeu isso perfeitamente nos anos 1980 e aproveitou o personagem, na época de quinto escalão na Marvel, beirando o cancelamento, para extravasar sua criatividade e afinar suas habilidades como quadrinista.

Nas mãos de Miller, o defensor do bairro chamado Cozinha do Inferno logo assumiria posição de destaque no Universo Marvel, como um herói tipicamente urbano. Como seus oponentes, mafiosos, ninjas e psicopatas. O irreal estava presente, mas em doses tão sutis quanto a ideia de radiação ampliando sentidos de alguém.

Depois de Miller, as décadas passaram, os quadrinhos de super-herói viraram mainstream e foram para o cinema e a TV, com vários graus de qualidade. Depois de alguns anos de certa pasteurização hollywoodiana da variedade de sub-universos das HQs de heróis, enfim as possibilidades de gênero começam a aparecer - e ao lado da Netflix, o Marvel Studios entrega em Demolidor sua produção mais enraizada na realidade.

Os elementos consagrados do Homem sem Medo estão todos ali, assim como o universo de coadjuvantes das páginas dos quadrinhos (Josie, Melvin Potter, Leland Owsley, Ben Urich e tantos outros). Mais importante do que isso, o tom de seriado policial visceral é o DNA do programa. Super-heróis coloridos de colante existem no universo da série, mas são tão distantes do cidadão comum quanto ver supercelebridades está do nosso na vida real.

O rastro de destruição causado por superequipes, alienígenas e organizações secretas, porém, é visto e sentido a cada instante, com citações diretas e menções a organizações como a Roxxon (veja Agent Carter). Os moradores da Cozinha do Inferno viram seu bairro desmoronar perante eventos de Os Vingadores e outros filmes da Marvel. Cabe aos sobreviventes a reconstrução - e predadores escondem-se nas trevas, comandando todo o submundo e usufruindo do caos ressurgido na Nova York outrora recuperada por Giulianni.

E ali que Matt Murdock e Foggy Nelson formam seu escritório de advocacia, com o intuito de ajudar os necessitados e fazer sua parte. Não demora muito para que sintam a força do outro lado... Com gangues mafiosas controlando cada aspecto do bairro em reconstrução.

Com cenas de impacto duro, violentas sem serem gráficas demais, e ação estilo parkour, Demolidor apresenta um retrato fiel e centrado do personagem Marvel. A evolução do figurino do combatente do crime na série vai ao encontro disso, com o uniforme começando absolutamente funcional e migrando para uma roupa tática, com uma explicação afetiva - uma homenagem paterna - por trás. É o tipo de mudança para o qual fãs da velha guarda dos quadrinhos costumam torcer o nariz (existe um deus nórdico, mas inexiste o colante), mas que faz grande sentido dentro do estabelecido nos filmes. O Demolidor poderia correr pelos telhados ao lado da Viúva Negra e o Gavião Arqueiro do cinema sem qualquer estranheza.

Em termos de ação, é excelente ver as sequências filmadas de muito perto, em longos takes - incluindo um fantástico plano-sequência -, valorizando a sensação dos combatentes de estar em uma pancadaria daquelas - e o que isso faz com a mente e o corpo. Equilibrada, a série também engata longos diálogos entre seu excelente elenco.

Charlie Cox, Elden Henson e Deborah Ann Woll estão excelentes como Matt, Foggy e Karen Page. Os fãs de quadrinhos certamente reconhecerão sem esforço nuances dos personagens conhecidas de décadas na tela. Do outro lado, Vincent D'Onofrio faz um Rei do Crime fascinante, com a dualidade do personagem como deveria ser. Um homem atormentado e ao mesmo tempo brutal e explosivo, em uma das melhores interpretações de vilão de quadrinhos que a TV já viu. Demolidor é tanto a sua história de origem quanto a de Matt Murdock - e ambos, a princípio, competem pela empatia do espectador.

Ao final, apesar do tom e de se passar no nível das ruas e não nos céus de Nova York, Demolidor casa-se perfeitamente com as demais produções do Marvel Studios, contribuindo para a coesão desse universo.

E mesmo o gênero policial e o realismo - que tornam tudo um pouco arrastado em alguns momentos, mesmo sem os esperados momentos no tribunal - cedem lentamente enquanto personagens como Stick e os Virtuosos são apresentados, entre ninjas e sugestões para os fãs de velha guarda de organizações como o Zodíaco e a Mão e mistérios são deixados sem resposta (seria o Céu Negro um Inumano? Ou, melhor ainda, um nativo de K'un Lun, já criando a primeira relação com a série vindoura do Punho de Ferro? E onde se encaixa em tudo isso a Madame Gao?)

Agora é aguardar pelos próximos desdobramentos dessa série, com outros heróis urbanos da editora - Jessica Jones, Luke Cage e Punho de Ferro (e a torcida por Justiceiro, Cavaleiro da Lua, Elektra - que teve uma breve pista - e Mestre do Kung Fu) - e vê-los formando os Defensores nas telinhas. O futuro é absolutamente promissor para os personagens Marvel na Netflix e sementes diversas foram plantadas neste primeiro e ótimo passo.

Nota do Crítico
Ótimo

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