Na corrida dos streamings pela sua assinatura, a Apple tem feito um esforço interessante, mas que ainda não se pagou. Adaptações de livros bem-sucedidos, biografias e dinheiro pesado em rostos conhecidíssimos como Idris Elba e agora Tom Holland são o que a empresa acredita ser a fórmula do sucesso para o Apple TV+. Entre Estranhos, nova série original protagonizada pelo Peter Parker do MCU - e que ainda traz Amanda Seyfried encabeçando o elenco -, é a aposta do momento. Pelo andar da carruagem, porém, a plataforma da maior empresa de tecnologia do mundo ainda segue tateando no audiovisual um espaço criativo para chamar de seu.
O seriado em dez capítulos é inspirado no livro que conta a história real de Billy Milligan, um homem com transtornos de personalidade. Na série, Holland interpreta Danny Sullivan, a versão ficcionalizada de Milligan, um jovem que foi preso após uma tentativa de assassinato. A trama se desenrola conforme a psiquiatra Rya Goodwin (Seyfried) interroga Danny a fim de entender quem é responsável pelo crime e se havia mais pessoas envolvidas no caso. Aos poucos, a série transita do thriller policial para o suspense psicológico, já que a narrativa aos poucos deixa de ser uma reconstrução dos eventos e passa a ser uma reconstrução da psique de Danny.
A forma como Entre Estranhos aborda questões de saúde mental para potencializar suas viradas de trama tem sido criticada; não é, de qualquer maneira, um terreno novo para o criador da série, o roteirista Akiva Goldsman, cujo olhar sobre o estado clínico do matemático John Nash Jr. lhe rendeu um Oscar de roteiro adaptado em 2002 por Uma Mente Brilhante. Cabe a cada espectador formar sua opinião sobre esse aspecto moral, na medida em que a patologia de Milligan/Sullivan é central à narrativa de Entre Estranhos.
Indo direto à narrativa, essa transição entre o thriller policial e o psicológico é justamente o que mais se destaca na série. Entre Estranhos tem esse trunfo de levar o espectador às profundezas da mente do protagonista, permitindo entendermos razoavelmente que todos acontecimentos do mundo externo são resultantes dos traumas, histórias, cicatrizes e vivências da mente de seu protagonista. É uma pena, porém, que nesses mergulhos na psique de Danny, Entre Estranhos aposte tão pouco na imagem e se preocupe muito mais em fazer o espectador compreender o que acontece pela verborragia da sua exposição.
Tom Holland até se esforça para fazer valer a confusão de Danny, refletindo em uma atuação que está sempre variando entre caricaturas. Como os demais personagens parecem estar apenas tentando conceber, externalizar e explicar o que acontece ao redor deles, o esforço desse mergulho ao mistério do turbilhão interior soa em vão: Entre Estranhos não permite que o público sinta-se, assim como Danny, confuso em relação ao que é real e o que é reflexo projetado de sua condição mental.
Não confiar no efeito de deixar o espectador confuso, assim como seu protagonista, é um erro capital para uma série que havia concebido suas reviravoltas e seus desdobramentos narrativos a partir dessa mesma confusão. Esperava-se que um veterano como Goldsman tivesse uma noção melhor do que funciona ou não na hora de estabelecer esse vínculo com o espectador - cujo elo de empatia com o protagonista por fim se sacrifica em nome das facilidades do didatismo.
Criado por: Akiva Goldsman
Duração: 1 temporada