O enfraquecimento dos sitcoms na última década inaugurou na televisão dois outros tipos de comédias, com risadas ao fundo trocadas por uma linguagem mais elegante: o primeiro tipo é o que foi imortalizado por Modern Family, com uma abordagem mais física, quase pastelão, e piadas bem diretas; O outro tipo é o que costumamos ver muito na HBO, por exemplo, e são quase esterilizadas, muito metafóricas, extremamente adultas e calculadas, como Girls, Looking e Togetherness. Essa podem até apelar para a "torta na cara" em algum momento, mas preferem fazer o tão estadunidense "humor de crise".
Friends From College não é da HBO, mas apareceu tomada do mesmo existencialismo. Diante de um elenco tomado de tantas figuras conhecidas do mundo das séries, o engano era quase impossível. Mas, eis que então, tudo acabou virando erro. Com uma trama bem singela (outra característica desse novo tipo de comédia), o seriado teria que se valer de seu texto e suas atuações. Contudo, não demorou muito para percebermos que, para os roteiristas, só havia um problema latente passível de exploração: o romance extraconjugal entre Ethan (Keegan-Michael Key) e Sam (Annie Parisse). Os outros personagens apenas orbitam em torno disso, o que faz com que quem não esteja envolvido no enredo seja apenas um coadjuvante velado. Todo o arco-central da primeira temporada criou suas tensões apoiadas nesse adultério, sendo essa a razão pela qual, é claro, a segunda temporada também não é muito bem sucedida.
Frenemies From College
Esse "novo" tipo de comédia é toda sobre carisma. Mesmo sem dar muitas gargalhadas, o afeto pelos personagens mantém interessado por todo o processo. É aí, também, que Friends From College encontra outro problema. Ethan e Sam são egoístas, mas ele piora tudo com um senso de humor desagradável e ultrapassado - às vezes ele parece um pupilo de Renato Aragão. Max (Fred Savage) e Ethan são uma das duplas mais estridentes e insuportáveis da TV atual. As piadas e a comédia corporal são ruins, e faltam doses de inteligência e ternura. Lisa (Cobie Smulders) é escrita como uma esposa um pouco megera, abordagem calculada para que perdoemos a traição do marido. Sobram Marianne (Jae Suh Park) e Nick (Nat Faxon), que tem as trajetórias menos desastradas da produção.
É claro que toda essa lista de defeitos é completamente humana e deveria funcionar na ficção, porém a ineficiência dessas construções se dá pela forma pretensiosa com a qual são descritas. Essa antipatia provocada pelo perfil dos personagens não é percebida pelos envolvidos porque o peixe vendido por eles é o de "complexidade". Contudo, tudo no programa é rasteiro. Nenhum dos protagonistas tem vidas pessoais bem contornadas, e quando algo acontece com eles, é para acabar reiterando o interminável plot do adultério. Max pode noivar, casar, Nick pode viajar, Marianne pode perder o coelho ou ir ao funeral do namorado... Tudo vai acabar servindo de pano de fundo para os constrangimentos provocados pelo maldito adultério. Fica cansativo muito rápido.
No segundo ano as mentiras já vieram à tona, e isso só serve para o investimento errado continuar crescendo progressivamente. Se no primeiro ano tudo é sobre a traição que ninguém conhece, aqui tudo é sobre todo mundo já saber quem foi traído. Então, quando você pensa que o roteiro está na busca por resolver a questão, ele vem com piruetas de última hora, das mais clichês da cartilha, para garantir que se houver uma terceira temporada, ela ainda será sobre um casamento infeliz. O texto até que consegue tirar uma ou outra boa piada de algumas situações, mas até quando a série dá certo é pelos motivos errados, como no episódio sobre Atlantic City, quando um sósia de David Beckham, ao lado de Sam (fingindo ser Victoria), presenteiam o espectador com motivos para que as Spice Girls sejam citadas e tocadas por todo o curso dos acontecimentos. Você até não quer que o episódio acabe, mas só porque quer ouvir "2 Become 1" até o final.
Personagens sem carisma, texto frágil, trama estacionada... Não existe uma só razão coerente para que Friends From College permaneça no ar, mesmo porque os "ganchos" que ela constrói são absurdamente desinteressantes e na maioria do tempo todo mundo é tão irritante que só se pode querer que eles fiquem calados. Frustra mais saber que tudo isso já estava sendo sinalizado na primeira temporada e, ao voltarem para um novo ciclo, os criadores continuaram achando que tudo estava indo muito bem. É lamentável, porque o que fica da coisa toda é a certeza de que amizades do tempo da faculdade se tornam relações tóxicas no presente. Ninguém ali faz bem a ninguém. É assustador. Dois episódios e você prefere voltar à utopia terna de Friends, onde a rotina lúdica num apartamento de Nova York poderia não ser verossímil, mas pelo menos era mais agradável.