Séries e TV

Crítica

Manto e Adaga - 1ª Temporada

Série adolescente da Marvel na Freeform esbarra em alguns clichês mas compensa com bons personagens e trama atual

30.08.2018, às 15H37.

Por mais que a qualidade oscile, é respeitável como a Marvel usa e abusa da experimentação nas suas séries de TV. Passando do sombrio-e-realista ao artístico, a leva mais recente de programas da empresa quer conquistar agora os adolescentes: é o caso de Fugitivos, no Hulu; The Gifted, na Fox; e Manto e Adaga, pela Freeform.

Foto promocional de Manto e Adaga, série da Marvel na Freeform
Manto e Adaga/Freeform/Divulgação

O drama marca a estreia nas telas do casal titular, dois heróis com status cult nos quadrinhos pela forma como suas histórias focam em problemas pessoais e sociais. Na televisão, não é diferente. A trama mostra Tandy Bowen (Olivia Holt) e Tyrone Johnson (Aubrey Joseph), dois jovens cujos destinos se cruzaram por conta do mesmo acidente na infância. Suas vidas, por outro lado, não poderiam se diferentes: ela se torna uma ladra de família pobre, enquanto ele dá orgulho à sua endinheirada família por estar encaminhado em uma universidade de peso e integrar o time de basquete.

Manto e Adaga se aprofunda em explorar esse abismo. Cada um dos protagonistas representa uma das formas de se lidar com luto e injustiça, sendo Tandy a parte esperançosa e Tyrone o medo e insegurança. Isso, somado com as diferenças raciais e de classe, cria conflitos constantes entre os dois, que precisam se unir para trazer paz às suas famílias atormentadas pela morte de entes queridos no passado. Enquanto discute as diferenças, a série pontua os problemas dos heróis com o contexto dos Estados Unidos, que passa por uma crise de violência policial, recebida por crescente ativismo. São nesses momentos, em que assume uma postura política sem exagerar ou tornar-se caricato, que o programa mostra sua força.

Ajuda o fato de que o seriado compreende muito bem as suas limitações. Ainda que conte com um orçamento relativamente alto para uma série adolescente, a produção opta por economizar na computação gráfica - raramente utilizada - e investe em um número maior de locações. Nova Orleans, cidade onde a trama é ambientada, carrega quase tanta importância quanto os personagens, frequentemente tendo sua história e sua cultura cruzada com a jornada dos jovens. Mesmo que indique que está em um universo maior ao citar Luke Cage, localizar a narrativa em um espaço menor é benéfico pois faz com que os problemas da dupla também respeitem os limites da cidade, o que se encaixa perfeitamente com a intenção do projeto de tratar dos conflitos reais de adolescentes que, por coincidência, têm super-poderes.

Isso dificulta com que a série torne-se megalomaníaca, e resulta em algo muito mais redondo. A ausência de fillers reforça esse ponto: são pouquíssimos os minutos de tela dedicados à arcos que não se relacionam com o principal. A única subtrama, que acompanha a detetive Brigid O'Reilly (Emma Lahana), é interessante o bastante para justificar o leve desvio - e até essa, eventualmente, se funde com a jornada de Tandy e Tyrone.

A maior complicação é parte visual. Ainda que não seja a mesma forma de sombrio-e-realista dos programas da Netflix, Manto e Adaga peca nas cenas desnecessariamente escuras, paleta de cores sem graça e estética pouco inspirada. Enquanto o roteiro é bom o bastante para prender a atenção ao longo de seus dez episódios, a falta de atenção especial ao visual cria uma série pouco memorável. Nem mesmo episódios como o ótimo "Funhouse Mirrors", inteiramente ambientado na mente de um homem em estado catatônico, experimenta com composições diferentes ou sequer levemente mais ousadas. Ao ritmo que a produção cresce e encontra sua voz, seria bom se o mesmo se aplicasse ao estilo visual.

Manto e Adaga não se parece com nada que a Marvel faz na televisão, e isso é muito bom. A série trabalha bem suas limitações, conhece seu público e desenvolve seus protagonistas na medida certa. Ainda há muita coisa para melhorar, como expandir sua estética e fugir do padrão de edição de "colocar música o tempo todo, mesmo que a ocasião não case", que é tradicional de seriados adolescentes como os da CW. Ainda há trama e conflitos a serem explorados, mas considerando a audiência e uma renovação já garantida, é certo que a Marvel e a Freeform pensam o mesmo.

Nota do Crítico
Bom

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