O choque na mudança da figura de Jack Reacher, do franzino galã Tom Cruise para o grandalhão Alan Ritchson, ainda impressiona. Mais fiel aos livros de Lee Child, o Reacher da série do Prime Video, vivido por Alan Ritchson, bebe muito mais da fonte dos heróis brucutus e exércitos de um homem só, dos anos 1980, do que a roupagem mais Jason Bourne dos dois filmes do astro de Missão: Impossível.
Reacher não é como um Jack Ryan – que já foi de Harrison Ford para Ben Affleck e John Krasinski – rostos diferentes mas com porte "normal". Ritchson, tal qual Stallone e Schwarzenegger em suas épocas de ouro, consegue emplacar bem essa ideia do tanque de guerra ambulante, que combina suas habilidades e treinamentos, para destruir qualquer vilão ou organização criminosa que cruze o seu caminho. Sucesso desde 2022, Reacher chega à sua terceira temporada estabelecida como uma das grandes séries de ação dos últimos anos, mas dependendo mais do que nunca do carisma de sua estrela.
Para crédito da série comandada por Nick Santora, há uma correção de curso essencial. A simplicidade do primeiro ano, uma investigação dentro de uma cidadezinha, deu lugar a uma caçada muito maior na segunda temporada. Com isso em mente, o novo ano volta mais ao ritmo do início, colocando Reacher de volta a um ambiente menor – uma cidade com basicamente uma rua e a grande mansão do possível vilão da história. Logo, descobrimos que a trama vai além disso, e mais uma vez o herói terá que cruzar com uma sombra do seu passado nesse emaranhado de investigação e assassinatos. A diferença: Reacher agora está infiltrado no grupo e precisa trabalhar para descobrir os planos de lá de dentro.
O arco de três episódios que abre a terceira temporada é inteligente ao jogar o herói na ação logo de cara, brincando com a linearidade na forma de contar a história e acelerando o ritmo quando foca em Jack Reacher e a mansão controlada por Zachary Beck (Anthony Michael Hall). Ritchson desfila seu carisma brucutu em praticamente todas as cenas. Das interações com o filho do mafioso, Richard (Johnny Berchtold) ao deboche com que trata os outros capangas – ele não dá a mínima para as fichas criminais de cada um deles – Reacher sabe que nenhum deles será páreo para sua mão pesada, e age como tal.
Pelo menos até o surgimento do maior elemento da temporada, o gigantesco Paulie (Oliver Richters), de nada menos que 2,18 metros de altura. Reacher, o Golias de outrora, acaba se vendo no papel de Davi em determinado momento do terceiro ano e isso cria uma faísca de novidade na relação do herói com os vilões.
Entretanto, a ideia, assim como grande parte da investigação, não vai muito além da proposta inicial. Um dos grandes problemas dessa temporada é a falta de equilíbrio numa história que, por não desenrolar bem sua trama, ainda parece mais complexa do que deveria. Reacher é uma série melhor servida pela simplicidade, e no seu lugar há quase uma bagunça. Os coadjuvantes que ajudam Reacher com o caso são desinteressantes e quase sempre apenas vítimas que correm de um lado para o outro. Um personagem é feito de refém por pelo menos cinco episódios – e jamais serve outra função que não essa – e todo esse drama se resolve sem cerimônias em cinco minutos. Se nas temporadas anteriores tivemos ótimos coadjuvantes, como Roscoe e Finlay e a dupla Neagley e O’Donnell, os novos policiais que acompanham o caso, Duffy (Sonya Cassidy) e Villanueva (Guillermo Montesinos), nunca empolgam de fato.
Em alguns momentos, é nítido que o arco sobre o passado de Reacher e sua perseguição à Quinn (Brian Tee) é o verdadeiro foco de atenção da temporada. O ótimo quarto episódio, quase todo em flashback e contando os motivos do Investigador Especial estar atrás do bandido, é a prova máxima disso. A tensão é bem estabelecida e somos apresentados a figuras que, com pouco tempo de cena, imediatamente superam em química a dupla do presente. Mas mais importante, esse capítulo é quando a temporada enfim nos dá um motivo verdadeiro para querer que Reacher cumpra essa grande missão.
O terceiro ano de Reacher prova que até a mais básica das histórias consegue se sustentar com um bom herói por quem torcemos, e que às vezes era melhor ter só isso. Nos momentos mais vulneráveis e quando voltamos a nos divertir com o quebra-quebra, Ritchson segue sendo o motor da série. Através dele, os tiros à queima-roupa, socos e atitudes quase super humanas, junto com todas as outras gaiatices do gênero, se encaixam. Se os coadjuvantes e a própria trama não ajudam, cabe a Alan Ritchson ser o exército-de-carisma-de-um-homem só. Ele está mais do que pronto.
Reacher
Criado por: Nick Santora