Santa Clarita Diet não deve ser consumida pelo espectador desavisado, que foi levado pelo algoritmo da Netflix por ter visto Nunca Fui Beijada, Afinado no Amor ou Como se Fosse a Primeira Vez. A presença de Drew Barrymore no elenco, porém, é um dos ingredientes que tornam a série de mortos-vivos e cavaleiros medievais sérvios uma opção única no catálogo do serviço de streaming.
Parte dessa personalidade vem da sua assinatura de “filme B”, sem medo do gore e do humor. No terceiro ano essa ideia fica ainda mais clara, com a mitologia se expandindo e os atores cada vez mais à vontade na brincadeira. Há exagero em cada gesto, em cada diálogo, mas aqui a caricatura é sempre bem-vinda. Barrymore (a corretora de imóveis transformada em morta-viva por um marisco suspeito Sheila Hammond) e Timothy Olyphant (o marido atrapalhado Joel Hammond) dão vida a cada momento estapafúrdio, assim como Liv Hewson (a filha badass do casal) e Skyler Gisondo (o vizinho versado nas artes nerds). Em torno deles, um elenco de apoio igualmente sintonizado povoa um universo apto a transformar nazistas e machistas em comida.
Santa Clarita Diet não é uma série essencial, mas a retribuição é imediata quando se compra a proposta. Sem exigir compromisso ou mesmo a atenção plena do público, o seriado é uma distração com doses catárticas, dirigida e estrelada por quem sabe o que é e o que quer. Só não é uma boa opção para acompanhar as refeições, por mais que alimentação seja um tema recorrente, constantemente comparando partes humanas com iguarias culinárias para melhor entendimento - “Orelhas, crocantes e salgadas. Os anéis de cebola do corpo humano”.
Barrymore, que também produz a série, encontrou nessa dieta revigorante da pacata Santa Clarita, uma forma de brincar com sua persona, sempre entre a figura de queridinha da América e a rebelde. Se nos primeiros anos a piada era ironizar as vidas aparentemente perfeitas do subúrbio, a terceira temporada se aprofunda, à sua maneira, em temas existenciais, da busca por propósito à aceitação de si mesmo. É um subtexto que não tem a pretensão de ensinar nada, mas enquanto transforma cabeças em decomposição no funcionário do mês deixa alguma coisa para ser compreendida. A substituição do intérprete de Gary, por sinal, rende um easter egg para fãs de outra série B: Alan Tudyk entra para ocupar o lugar do colega de Firefly Nathan Fillion, que estava ocupado com as gravações de The Rookie.
O gancho do décimo episódio assina uma boa promessa para uma possível quarta temporada ainda mais absurda. Não que isso importe para que se continue a acompanhar a série. A espera não precisa ser ansiosa, mas a chegada de Santa Clarita Diet na Netflix é sempre bem-vinda.