Entre 2011 e 2017, quando Teen Wolf foi originalmente exibida, insinuar que a série criada por Jeff Davis e exibida pela MTV era algo além de uma grande bobagem, um “prazer culpado”, gerava risinhos de escárnio diante do número fabuloso de “dramas de prestígio”, premiados, que estavam no ar ao mesmo tempo. E é verdade que Teen Wolf nunca foi Mad Men ou Breaking Bad, mas nunca fingiu ser, e nunca precisou ser - suas ambições eram outras, o seu metiér era outro, e as suas virtudes (apropriadamente) eram outras. O que não significa que essas virtudes não existiam.
O anúncio, na tarde de hoje (24), de que a série vai retornar em formato de longa-metragem, produzido pelo streaming Paramount+ e escrito pelo próprio Davis, mostra que o legado dela é maior do que a maioria das pessoas parece presumir. Mostra também, é claro, que talvez esteja na hora de revisitar Teen Wolf e dar a ela o crédito que merece.
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Acima de qualquer coisa, Teen Wolf é a obra-prima de Russell Mulcahy, o diretor australiano que assinou 40 dos 100 episódios das temporadas originais. Um verdadeiro mago do trash, Mulcahy é mais influente do que parece: nos anos 80, fez alguns dos videoclipes que definiram a estética da época, como “Total Eclipse of the Heart” (Bonnie Tyler), “Rio” (Duran Duran) e “True” (Spandau Ballet). Basicamente, se você tem uma fantasia fácil para ir naquela balada retrô que ama, e se sua popstar contemporânea preferida tem alguma referência visual para imitar, agradeça a ele.
O estilo do cineasta, no entanto, nunca caiu muito bem com o público mainstream do cinema e da TV. Ele criou clássicos cult como Highlander: O Guerreiro Imortal (1986) e O Sombra (1994), e dirigiu episódios de Queer as Folk e Contos da Cripta, mas foi só com Teen Wolf que conseguiu traduzir sua sensibilidade única, extravagante, anabolizada, para uma audiência maior. Cheia de câmera lenta, sombras diagonais, fumaça de gelo seco, ângulos inclinados e tendências homoeróticas (Mulcahy é abertamente gay), Teen Wolf é indissociável de seu diretor mais frequente - e isso é ótimo!
Esse estilo único da série, de fato, era o que a mantinha íntegra (e divertida) nos momentos em que Davis e sua equipe de roteiristas escorregavam. Durante seus 100 episódios, Teen Wolf passou por dezenas de subtramas e apresentou dúzias de criaturas sobrenaturais, sem se preocupar muito em desenvolvê-las ou integrá-las em uma só mitologia - em muitos sentidos, o calcanhar de Aquiles da série era essa inconsistência, que nascia da priorização da estética, do prazer superficial de algumas decisões narrativas, ao invés do desenvolvimento de personagem ou de trama.
Quando Teen Wolf encontrava uma história na qual realmente se engajava, no entanto, a união dos poderes de Mulcahy e Davis era puro espetáculo. O exemplo mais óbvio é a 3ª temporada da série, uma montanha-russa de influências de horror que ainda serviu para mostrar que Dylan O’Brien não era só um jovem ator bonito e carismático, e sim um talento interpretativo para se levar a sério.
Quando o Stiles de O’Brien foi possuído por uma entidade japonesa maligna (longa história…), Teen Wolf mostrou que podia entregar não só visuais intrincados e deleites kitsch, como também envolvimento emocional e uma conexão real entre os personagens e o público. Como história de amadurecimento, a série da MTV nunca foi especialmente profunda, mas o senso de comunidade que ela construiu com seus protagonistas, fabulosamente diversos, não pode ser subestimado.
Uma das primeiras séries adolescentes verdadeiramente inclusivas - no sentido em que os personagens racialmente diversos ou LGBTQIA+ não eram a exceção, ou tokenizados, ou usados para explorar suas culturas de maneira grosseira -, Teen Wolf é ao mesmo tempo enganosamente influente e deliciosamente datada, se vista hoje. Influente pela forma como, para o bem ou para o mal, abriu espaço para produções teen de fantasia na TV, de Sombra e Ossos a Shadowhunters, que devem muito à estética e à retórica da série de Davis.
Teen Wolf é datada, por outro lado, porque simplesmente não se fazem mais séries como ela. Despreocupada com o conceito do que é prestigioso, ou do que vai ganhar um Emmy, ela não busca conquistar um público (esnobe) que vai desprezá-la de qualquer maneira. Na ditadura-HBO-do-bom-gosto, na qual estamos metidos já há alguns anos nessa “era de ouro da TV”, a galhofa satisfeita e tecnicamente genial de Teen Wolf faz muita falta, e seu retorno é uma excelente notícia.