Por mais que o terror esteja em alta nos cinemas, na televisão o gênero ainda caminha com poucas produções modernas que realmente trazem calafrios. Foi aí que o produtor executivo Ridley Scott viu a oportunidade de adaptar The Terror, romance de Dan Simmons, para as telinhas, sem poupar esforços.
Baseada nos eventos reais da misteriosa Expedição de John Franklin na metade do século 19, a trama acompanha a jornada dos navios Erubus e Terror para encontrar e mapear uma passagem por cima da América do Norte, extremamente valiosa para a época. Algum tempo depois, uma investigação constata que todos os 128 tripulantes da expedição morreram e as embarcações desapareceram. A obra de Simmons vêm então para teorizar o que pode ter acontecido nesse meio tempo.
Quando os navios são imobilizados no gelo, tudo parece se voltar contra os marinheiros. O frio é imperdoável, mutila e pode até matar; do lado externo, uma criatura desconhecida passa a destroçar os invasores de seu habitat; no interior, o aprisionamento coletivo desafia a sanidade dos marujos. O programa se estabelece como um verdadeiro conto de horror psicológico, lentamente levando seus personagens e o espectador em direção à loucura. Enquanto essa estrutura é uma virtude, a execução é uma maldição.
The Terror faz milagres ao condensar as mais de 700 páginas do romance original em um seriado de dez capítulos, mas o ritmo que a história progride beira o angustiante. Ainda que mantenha sua trama focada, constantemente o programa parece estático, por exemplo quando um grande acontecimento do episódio anterior não cria consequência alguma além de um diálogo no seguinte. A natureza do conto pede por um ritmo mais lento, sim, mas um tom inconsistente apenas cria desinteresse e momentos monótonos.
O que torna a experiência toda não só suportável como até mesmo agradável é a qualidade da escrita e atuação. A jornada é narrada pela perspectiva dos oficiais das embarcações, núcleo composto apenas por veteranos da televisão: Jared Harris, de Mad Men e The Crown, como capitão Francis Crozier; Ciarán Hinds, conhecido como o Mance Rayder de Game of Thrones, interpretando o famoso John Franklin; e Tobias Menzies, de Outlander e também Game of Thrones, como o capitão James Fitzjames.
Os três são responsáveis por boa parte das dinâmicas de poder que carregam metade da série, até nos seus momentos mais parados. Os atores entregam performances cheias de nuances que transparecem homens egocêntricos, problemáticos e desesperados, tornando também o roteiro - rebuscado para os padrões de TV - em algo crível e poderoso. Além dos protagonistas, o novato Adam Nagaitis também surpreende como o perigoso Cornelius Hickey.
Outro destaque fica por conta do ótimo trabalho de ambientação. A produção não mediu esforços na hora de criar um ambiente inóspito e ameaçador. Além das vastas paisagens gélidas, o som também ganha uma importância fundamental na tensão: desde o ranger das tábuas do claustrofóbico navio até o cortante vento que desperta a sensação de incerteza, é possível dizer que The Terror vale o esforço de ser escutada por fones de ouvido.
Infelizmente, os poucos momentos que quebram essa contextualização histórica acontecem por parte da criatura que caça os tripulantes. Os primeiros capítulos fazem bem ao estabelecer sua ameaça tanto através de violência gráfica e mistério, quanto pela aparência do monstro. Quando ele então é revelado, muito da tensão se perde pelo visual pouco inspirado e computação gráfica de baixa qualidade - algo que torna-se ainda mais imperdoável quando comparado com o bom uso de efeitos práticos nas demais cenas de mutilação e canibalismo.
Quando levado como um horror psicológico, The Terror deixa a desejar por andar devagar demais e mostrar mais do que deveria. Agora, se observado como um suspense de época, o seriado impressiona ao narrar seu conto de "Homem vs. Natureza" prezando pelos detalhes. O programa da AMC entrega uma jornada inconsistente ao tentar equilibrar os dois, frequentemente parecendo mais morno e longo do que realmente é.
Isso, é claro, não significa que tudo está perdido. Com uma segunda temporada no horizonte com a possibilidade de explorar outra ambientação, o programa cria uma boa base para uma antologia sobre os mistérios não resolvidos da humanidade. Existe um futuro promissor ao combinar o alto padrão de qualidade de escrita, fotografia e atuação com uma história mais dinâmica. Mas enquanto isso não acontece, The Terror se mantém como uma boa série que poderia ter ido muito mais longe.