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Sónar São Paulo 2012

Entre gritos e glitches, evento retoma espaço de festival de vanguarda

14.05.2012, às 12H43.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H45

Não há coisa mais chata do que rotular música “de vanguarda” em pleno 2012. Mas essa é a proposta do Sónar, franquia criada em Barcelona que vai na contracorrente dos famosos festivais europeus.

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Kraftwerk

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Palco Hall

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Cee Lo Green

Aqui, o slogan é “música avançada” – o que dá na mesma – e o resultado é uma série de showcases com boas performances de artistas e DJs de pequeno e médio porte, amparados pelo sucesso de bilheteria das atrações pop.

Na segunda edição brasileira (a pré-estreia aconteceu em 2004), o Sónar retoma um espaço vazio no calendário brasileiro, de grande evento dedicado à música criativa e urbana em São Paulo, boa para curiosos pelo que está acontecendo fora do roteiro. E de quebra reapresenta ao público o bom complexo fechado do complexo do Anhembi, histórico na ronda da música paulistana. Não tem como não ser bem-vindo, certo?

3D + pop + minimalismo + microfonia

Entre mais de 50 atrações de perfis díspares, assim como é impossível acompanhar o festival inteiro, é improvável escolher o melhor que passou nos dois dias deste Sónar. Alguns votam pela indie Little Dragon (suecos que remexem no trip-hop com a tímida vocalista Yukimi Nagano à frente, que fizeram um show bom para fãs), outros preferem o duelo noventista do DJs brasileiros Marky e Patife e há quem vote pela tocante performance da pianista Clara Sverner ao lado do artista multimídia (e filho) Muti Randolph. Four Tet, Totally Enormous Extinct Dinosaurs, Austra e Emicida também foram destaque.

Mas uma das poucas unanimidades fica por conta dos veteranos do Kraftwerk, atração máxima do primeiro dia. Escalados de última hora, substituindo a desistente Björk, os alemães trouxeram para São Paulo versão pocket da retrospectiva recém-apresentada no MoMA de Nova York.

Não se pode esperar grandes surpresas de uma apresentação do Kraftwerk, com o quarteto investindo na costumeira presença fria de palco e uma sequência de clássicos insuperáveis – de “The Robots” e “Music Non Stop” a “Tour de France 2003”. São fieis à sua mise-en-scène e, por isso, bons.

A graça maior da nova versão ficou por conta das projeções em 3D, aditivadas pelos óculos distribuídos entre a plateia. As animações de fundo de cada música, marca registrada do grupo, foram totalmente refeitas com a (não tão) nova tecnologia, mas mantendo o aspecto vintage low-tech. Resultado: números de “Numbers” e o satélite de “Spacelab” voando sobre as cabeças do público, que gritava a cada distorção de realidade no telão.

Sem tanta “tecnologia avançada”, a outra ponta do pop do festival usada para arrecadar público (ao lado dos festivos Chromeo e Justice) foi Cee Lo Green. De visual totalmente anti pop star (atarracado, careca e barrigudo), o cantor se esforça em ser o Elton John de sua geração, com repertório funkeado e falando para uma plateia conquistada pelos hits de Gnarks Barkley (sua dupla ao lado do DJ Danger Mouse) e pelo hit “Fuck You!”, que fecharia a apresentação.

Antes disso, porém, Cee Lo amornou o show com a participação dos três MCs com quem faz o Goodie Mob, grupo de hip hop de Atlanta importante no final da década de 1990. O americano é um rapper agressivo de voz rasgada, e quem só conhece sua versão Pancinha & Amor ficou com cara de paisagem. Melhor foi o inesperado cover de “Let’s Dance”, de David Bowie, no começo da apresentação, em versão à la Ottis Reding.

Do outro lado do Anhembi, enquanto isso, o Mogwai tomava para si o troféu barulhento do Sónar São Paulo, com seu repertório baseado em guitarras, distorções e microfonia – tudo sempre com o volume alto, muito alto. Até alto demais, diriam os não fãs. Mas quem encarou o grave batendo no peito e fazendo tremer as cadeiras suspensas do auditório – e o Mogwai é o tipo de banda que arrasta uma multidão de fieis – acompanhou um repertório baseado no último disco (Hardcore Will Never Die, But You Will, de 2011) e clássicos dos escoceses, como “I’m Jim Morrison, I’m Dead” e “Hunted By A Freak”.

Mas pode-se dizer que o minimalismo sonoro produziu dois dos grandes momentos do festival. O primeiro, dueto do pianista e compositor japonês Ryuichi Sakamoto com o alemão Alva Noto. Sakamoto, que é conhecido por aqui mais por suas incursões na bossa nova ao lado de Jaques Morelenbaum, mostrou parte da sua faceta experimental com o alemão, com quem colabora desde 2002. Sobre os glitches eletrônicos minalistas de Noto, que davam o ritmo, Sakamoto pontuava as notas do piano, enquanto tudo era interpretado em grafismos no telão. Belo mix de acústico e eletrônico, que só ganha mais força ao vivo.

Segundo grande destaque de música minimalista (e “avançada”) do Sónar foi James Blake, inglesinho tímido que lançou seu primeiro disco em 2011, ganhou fama reinventando um hit da cantora Feist (“Limit To Your Love”), é amigo de Bon Iver e tem tudo para ocupar um bom espaço no bom pop desta década.

De voz calma mas forte, quase sem olhar para a plateia, Blake vem acompanhado de um baterista (também minimalista, com alguns pratos mais um set eletrônico) e um guitarrista, além de seu setup de teclados e sequenciadores. É ali que constrói sua versão de dubstep romântica e esperançosa, de tons graves e retorcendo seus vocais sobre uma base eletrônica que é hora reflexiva, hora dançante (mas sem farofas). Bem como o Sónar deve ser.

Fotos: Sónar São Paulo 2012/ Divulgação

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