Depois de cinco anos, Invocação do Mal finalmente está de volta! A franquia principal passou os últimos anos fora das telonas, vivendo apenas de derivados, mas agora retorna com uma nova aparição macabra a ser enfrentada pelo casal Ed (Patrick Wilson) e Lorraine Warren (Vera Farmiga). E, assim como nos filmes anteriores, o vindouro Invocação do Mal 3: A Ordem do Demônio é baseado em um caso real.
Os filmes da saga costumam revisitar os arquivos dos Warren, demonologistas que foram grandes personalidades do ocultismo nos Estados Unidos entre as décadas de 1970 e 1980. Seus vários registros, sobre supostos exorcismos e encontros com o sobrenatural, já foram publicados no Brasil pela DarkSide Books. Mas o evento que inspira o novo longa é um dos raros momentos em que uma investigação paranormal se cruza com um caso de tribunal.
Em 16 de fevereiro de 1981, na cidade de Brookfield, Connecticut, nos EUA, um homem de 19 anos chamado Arne Cheyenne Johnson foi acusado de esfaquear Alan Bono, seu senhorio. O que poderia ser apenas um caso de homicídio tomou ares macabros quando o rapaz alegou que cometeu o crime sob possessão demoníaca e, portanto, não poderia responder por suas ações.
Na época, os Estados Unidos passavam por um momento de histeria coletiva com a possibilidade da existência de demônios e sua suposta influência na cultura, período que ficou conhecido como “Satanic Panic” (ou pânico satânico, em tradução). Nesse contexto, o julgamento atraiu grande comoção da imprensa de todo o país.
O rapaz, que estava bêbado no momento do crime, afirmou não ter memória alguma de ter esfaqueado Alan Bono repetidas vezes após uma confusão. Como defesa ele alegou que estava possuído e não tinha controle sobre seus atos. O argumento, que poderia apenas passar como uma desculpa, ganhou novos ares quando o julgamento teve o envolvimento de Ed e Lorraine Warren que já tinha uma conexão com o réu.,
Em julho de 1980, os Warren lidaram com David Glatzel, irmão de Deborah Glatzel, a namorada de Arne Cheyenne Johnson e uma das únicas testemunhas do crime. O menino de 12 anos havia sido possuído por um demônio e o casal foi contratado pela família para realizar um intenso exorcismo. Além dos demonologistas, foi preciso da ajuda dos pais do menino, de Cheyenne Johnson e sua namorada, e também quatro padres católicos para lidar com a presença nefasta na criança. O desfecho não foi dos melhores: segundo a família Glatzel, Arne Cheyenne Johnson, na tentativa de salvar o menino, desafiou a entidade a possuí-lo.
Nos meses antes do crime, a vida dos Glatzel não foi fácil. O rapaz foi morar com a namorada e os sogros, mas rapidamente a casa se tornou palco de eventos estranhos. A família relatou comportamentos bizarros de David e de Arne, e também aparições fantasmagóricas que alertavam para um perigo iminente. Pouco tempo depois, em fevereiro do ano seguinte, Arne Cheyenne Johnson se tornou um assassino.
Além de ter toda a família Glatzel reforçando a ideia de ter sido possuído durante o exorcismo, os Warren também testemunharam a favor do homem. Logo a possessão se tornou a principal linha argumentativa da defensoria. No julgamento, Martin Minella, advogado de Arne, declarou: “As cortes já lidaram com a existência de Deus. Agora, elas terão de lidar com a existência do Demônio.” [via New York Times]
O advogado, por sinal, foi um dos mais comprometidos na defesa do caso. Minella chegou a procurar especialistas na Europa, como advogados que enfrentaram situações parecidas, ainda que nunca tenha ido à corte, e também ameaçou intimar os padres católicos envolvidos no exorcismo ao palanque, para confirmarem a veracidade dos fatos. O julgamento, que ocorreu em outubro de 1981, não teve uma conclusão favorável para o réu, com o juiz desconsiderando a defesa pela falta de evidências concretas e comprovações científicas.
Arne Cheyenne Johnson foi declarado culpado de homicídio, e sua sentença foi de 10 a 20 anos de cadeia. O rapaz foi liberado apenas cinco anos depois, em 1986, por bom comportamento. “Ele era um presidiário exemplar. Sua condição mental foi cuidadosamente examinada, e nada de negativo foi encontrado”, atestou Hans Fjelman, que supervisionava liberdade condicional na prisão em que Arne cumpriu sua pena [via AP News]. Aos 24 anos, o homem estava livre, além de ter aproveitado seu tempo preso para concluir os estudos do ensino médio, iniciar graduação na universidade, e também se casar com Deborah Glatzel, com quem está junto até os dias de hoje.
De lá para cá, o caso levantou muita polêmica. Os eventos foram rapidamente adaptados para a TV no telefilme O Exorcista do Demônio, de 1983. Nesse mesmo ano, a trama também foi contada no livro The Devil in Connecticut, escrito por Gerald Brittle com a ajuda de Lorraine Warren. O romance despertou a ira da família Glatzel, com os irmãos Carl Glatzel Jr. e David Glatzel - que havia sido possuído antes de Arne - afirmando que tudo não passou de mentiras dos Warren, que queriam apenas atenção midiática e fama.
Em 2007, durante a reimpressão do livro de Brittle, os irmãos processaram o casal, dizendo que eles exploraram o fervor religioso da época e as doenças mentais não-diagnosticadas dos envolvidos para tirar uma grana com todo o caso, que apenas levou má reputação e isolamento para a família. “Foi um verdadeiro inferno quando éramos pequenos. Um pesadelo pelo qual nem eu e nem meu irmão vamos passar de novo”, afirmou Carl. Na época, Lorraine Warren se defendeu das acusações, reforçando que tudo aconteceu de verdade. Curiosamente, nessa intriga toda, Arne Cheyenne Johnson e Deborah Glatzel tomaram o lado da demonologista.
Estrelado por Patrick Wilson e Vera Farmiga como o casal Ed e Lorraine Warren, Invocação do Mal 3: A Ordem do Demônio estreia em 4 de junho nos Estados Unidos.