Ao mesmo tempo em que realizava o excelente As Aventuras de Tintim, seu grande reencontro com o cinema de aventura, Steven Spielberg apaixonou-se pelo livro infantil Cavalo de Guerra (War Horse), de 1982.
Cavalo de Guerra
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A obra de Michael Morpurgo relata a amizade entre um menino e um cavalo, que acabam sendo separados, mas cujas trajetórias continuam entrelaçadas pelo destino durante a Primeira Guerra Mundial. Depois de ler o livro, Spielberg rapidamente assumiu os direitos sobre a história, que considerou dotada de temas universais, que "poderiam ser sentidos em qualquer país".
Afoito para obter tal abrangência, o ícone Spielberg veste sua faceta mais marqueteira/global e entrega um dos filmes mais medíocres de sua cinematografia. Já era de se esperar, graças ao tema, a grandiloquência épica e o tom choroso. Emoções baratas escorrem aos baldes em dramas com animais em sofrimento, afinal. O que era impossível prever era o tom ultrapaternalista e extremamente didático com que a história é contada.
Diálogos são repetidos à exaustão, símbolos (como a desnecessária bandeirola militar) trocam de mãos a cada 20 minutos para deixar bem marcado o seu significado e situações são repetidas em personagens de apoio constrangedores. Tais coadjuvantes, como o amigo ruivo, narram as cenas já efetivamente vistas, em claro retrocesso cinematográfico, já que esse tipo de apoio só fez sentido na década de 1940, quando eles agiam como "consciências" do protagonista.
Outro problema de Cavalo de Guerra é parecer um recorte de tantos outros filmes, tanto em tom como em teor. Spielberg obviamente exagerou na lição de casa - e as referências vão de Nada de Novo no Front a ...E o Vento Levou, passando (talvez não intencionalmente) pelos longas-metragens live-action da Disney da década de 1960. Tudo registrado de maneira extremamente artificial pelo colaborador frequente do cineasta, Janusz Kaminski.
A abertura, em Devon, Inglaterra, é supercolorida, no estilão Disney, com personagens absurdamente caricatos, que nem o ótimo elenco - que inclui Peter Muller, David Thewlis e Emily Mortimer -, consegue salvar. O pior em cena é Jeremy Irvine - justamente o dono do potro que se tornará o cavalo de guerra do título. Inexpressivos olhos rasos d'agua não fazem um bom ator.
A seguir, os horrores da guerra são apresentados com a crueza que Spielberg já demonstrou antes em O Resgate do Soldado Ryan - mas sem o sangue e pedaços, afinal, trata-se de um filme-família. A cinematografia aqui evoca os dois Nada de Novo no Front, com os seus conflitos repletos de arame farpado e explosões na "terra de ninguém". As lutas, como esperado, são o ponto alto do filme, brilhantemente planejadas e com algumas imagens realmente empolgantes - como a carga de cavalaria através da grama alta, que conta com Tom Hiddleston (o Loki de Thor) e Benedict Cumberbach, os únicos atores a realmente brilharem no filme.
Há outros ótimos momentos isolados, como o fuzilamento de desertores, mas nada que sustente a estrutura do filme, que parece mais uma antologia de contos ligados por um personagem central. A racionalização da emoção - o cálculo de quando e como fazer chorar - é especialmente desagradável. Spielberg, manipulador como nunca, sabe fazer muito mais do que apelar para o sentimentalismo barato, ou deixar a trilha sonora de John Williams (outro em um dos piores momentos de sua carreira, exageradíssimo e intrusivo) tomar conta da produção, para não deixar dúvida de que, se você ainda não percebeu, chegou a hora das lágrimas. De um diretor que representa tudo o que há de mais imaginativo e dinâmico na Sétima Arte, espera-se mais. Muito mais.
E não há nem como começar a descrever o clímax vergonhoso, extraído de ...E o Vento Levou sem qualquer escrúpulo. Em sua atrapalhada tentativa de homenagear os clássicos, de realizar um filme às antigas, o cineasta realiza o mais caro fan film da história.
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