Os integrantes do 2Z entraram no show do Teatro Gamaro, em São Paulo, impecavelmente vestidos. Hojin, o vocalista principal da banda, exibia um blazer oversized em amarelo berrante, enquanto o guitarrista Jiseob trajava um conjunto listrado em preto e branco indefectível, que certamente seria aprovado por Michael Keaton em Beetlejuice. Junte aí a calça de alfaiataria longilínea do baixista Junghyun, o conjunto jeans do baterista Bumjun, e a jaqueta de vinil do tecladista Zunon, e você tem um grupo notável de rapazes prontos para fazerem suas melhores poses de rockstar no palco.
Foi exatamente o que eles fizeram por boa parte das impressionantes 2h30 de apresentação no Gamaro, na noite da sexta-feira (17). O repertório do 2Z já é, por si só, uma mistura eclética de referências (do new wave de “East End” ao soul rock de “Roulette”), mas a performance ao vivo da banda solidifica a impressão de uma existência artística entre a realidade cosmética do k-pop e a elaboração mais pretensamente independente do cenário roqueiro sul-coreano.
Primeiro, o rock: A energia do vocalista Hojin não deixava o público, especialmente o fã clube que se posicionou nas primeiras filas da plateia, sossegar por muito tempo. Brincando com os colegas de banda, pulando e socando o ar durante os climaxes instrumentais das canções mais pesadas, apoiando o pé nos amplificadores para se dirigir direto à plateia… ele se mostra um frontman genuíno, um condutor habilidoso para a apresentação.
De fato, Hojin contou muito melhor uma história do que os intertítulos que se sucediam no telão, amarrando uma narrativa solta sobre agentes alienígenas e (é claro) o aprendizado do amor. A ideia aqui, sem dúvida, era simular os voos conceituais de um David Bowie ou de uma Lady Gaga, mas a escala do show não pedia e nem permitia esse tipo de teatralidade. Com o passar das 2h30, ficou claro que o 2Z está em seu melhor nos momentos mais livres no palco.
Vocalmente, Hojin faz a base rouca para Jiseob intervir com notas mais ousadas. Dono de um timbre facilmente projetável, que sobe delicadamente para o agudo em alguns versos, o guitarrista traz um sabor de banda de garagem para as melodias minuciosamente planejadas do 2Z. Eles nunca vão ser os Strokes (e, de certa forma, ainda bem!), mas Jiseob empresta certo charme despojado e blasé ao mix curioso da banda.
Depois, o pop: além de ser o mais velho (aos 26 anos) da banda, Zunon é também o ás na manga do 2Z. No comando dos teclados, da programação dos sintetizadores e da bateria eletrônica, ele se mostra o coração musical do grupo - tanto que, quando ele falha, o show cai pelas beiradas. Vide o erro técnico na música “Rainbow”, uma balada sintetizada à la Charlie Puth, em que os toques de Zunon no sintetizador saíam atrasados da caixa de som, tirando toda a banda do ritmo por consequência.
A gafe foi contornada com honestidade e elegância por Hojin e cia., é claro, duas qualidades-chave de todas as interações da banda com o público. Dos discursos individuais dos integrantes no final até o concurso de dança entre os fãs ao som de “East End”, as tradições desavergonhadamente populistas do k-pop se infiltravam na apresentação o tempo todo, com um efeito bastante positivo. O que o 2Z empresta do k-pop é, por fim, uma convicção pura no valor do espetáculo, no artifício como caminho para a expressão genuína.
Quando o baixista Junghyun, em muitos sentidos o coração pulsante da banda, se disse surpreso com a quantidade de fãs de música coreana no Brasil, definindo o k-pop como “a linguagem comum que pode nos unir”, foi obviamente uma hipérbole. Por outro lado, bom: as 2h30 do 2Z no palco do Teatro Gamaro são o melhor argumento possível a favor dela.