Se você é ligado no mundo da música, já ouviu falar de K-pop. O estilo que hoje é dominado por bandas como Super Junior, BTS, Girls’ Generation, EXO e Big Bang, já existe há décadas, e não para de crescer e invadir a cultura ocidental: em 2017, o BTS marcou as notícias por ser o primeiro grupo de K-pop a entrar entre os dez primeiros álbuns mais vendidos na parada Top 200 da Billboard. O recorde não para por aí: o grupo superou números de Taylor Swift, Katy Perry e Rihanna, com 20 milhões de visualizações em vinte horas no seu clipe "DNA".
E para os que não estão por dentro do universo, quando se ouve K-pop a primeira coisa que vem em mente é o hit de 2012, “Gangnam Style”, do rapper Psy. Mas não só a sub-cultura do K-pop veio bem antes (o pop coreano de hoje tem suas raízes mais geralmente associadas ao início dos anos 90), mas o hit do Psy é muito diferente do k-pop em alta atualmente.
Simon Stawski, do blog de cultura coreana Eat Your Kimchi, explicou em um artigo ao The Verge: “Muita gente acha que “Gangnam Style’ abriu as portas. Mas há muita ironia e humor naquele vídeo, enquanto a maioria das músicas de K-pop são sérias, sensuais, e muito bem pensadas”. Só o visual do rapper é contrastante com o k-pop atual: normalmente, são conjuntos, formados por integrantes jovens atraentes, usando roupas da moda e cantando com profundidade e muita emoção. O estilo é mais abrangente e híbrido também: a maioria dos singles passam pelo pop, com misturas de rap, hip-hop, rock e música eletrônica.
Mas de modo geral, o estilo é marcado por algo muito único, semelhante aos boy bands ocidentais, só que mais descarado. Os idols (como são chamados os integrantes) são reunidos por empresas especializadas em treinar e fundar os conjuntos. Nomes como SM Entertainment, YG Entertainment e JYP Entertainment (conhecidas como as Big 3) são as maiores responsáveis pela seleção e criação dos conjuntos, e seu processo seletivo é excêntrico.
O jornal Korean Times descreveu o processo da SM Entertainment: “Depois de selecionar pré-candidatos, a empresa roda uma simulação para saber como a voz e a aparência dos pretendentes mudará de três a sete anos”. Uma vez selecionados, indivíduos vivem juntos em alojamentos e passam por treinamentos de até 12 horas por dia, com aulas de canto, dança e teatro, além de diversas línguas. Ao Harvard Business Review, Yvonne Yuen, Vice Presidente de Marketing Internacional da Universal Music comentou: “Um estagiário passa por treinamentos por pelo menos dois anos antes de fazer sua estreia como artista. Não tenho certeza se outros países ou gravadoras teriam essa paciência”.
E depois de tanto investimento, o sucesso precisa ser garantido: uma das maneiras de se certificar disso, por exemplo, é incorporar o inglês nas letras, para tornar o produto mais vendável para o mercado internacional. Mas o mercado ocidental não é o único alvo. Alguns grupos, como o Super Junior ou EXO, criaram sub-grupos que cantam em mandarim, sob o nome Super Junior-M e EXO-M (“M” de mandarim). As músicas e coreografias são as mesmas, mas o idioma muda de acordo com o mercado para qual o grupo se direciona.
Os grupos de K-pop tem uma legião de fãs incrivelmente fiel, e as empresas não só contam com isso, mas incentivam fortemente. Segundo Stawski, as gravadoras de K-pop tem uma estratégia única: “As músicas são lançadas em fã-clubes oficiais antes de atingirem as rádios. Assim, os fãs podem decorar as músicas e cantá-las na estreia ao vivo. Esta parte do marketing é crucial”. Além disso, empresas do K-pop são conhecidas por estratégias modernas de marketing, baseadas quase que 100% em redes sociais. Ao manter a base de fãs ativa nas redes, o feedback dos ouvintes é rápido, e a empresa pode moldar o produto para o agrado dos fãs.
Independentemente do processo de seleção e do marketing bizarro envolvido, o sucesso do K-pop é inegável. E seu crescimento está ligado ao investimento colocado na formação e divulgação das bandas. O governo do país também, se aproveita da moda da onda coreana, e utiliza fortemente os grupos de k-pop para divulgar a imagem do país, incentivar o turismo e se infiltrar no mercado internacional, com o ministério da cultura tendo um departamento exclusivo para o K-pop. A autora do livro The Birth Of Korean Cool, Euny Hong, explicou para a NPR: "O governo coreano trata o K-pop do jeito que o governo americano trata a indústria automobilística e bancária, isto é, é a indústria que precisa ser protegida".
A ferramenta é definitivamente um dos maiores mecanismos de soft power da Coréia do Sul. Querendo ou não, o estilo está aparecendo cada vez mais e o visual está rapidamente se tornando mais familiar ao mercado ocidental, e isso é, obviamente, o resultado desejado.