Peacock/Divulgação

Séries e TV

Crítica

Girls5Eva patina em clichês mas acerta a crítica na indústria musical

Série mostra o auge e decadência de uma girlband fictícia dos anos 90 americano

27.01.2022, às 12H06.

Dá pra lidar com os cônjuges e as dores na articulação, ter mais de quarenta anos, ser mulher, criar os filhos, suportar os dramas familiares, ser sufocada pelo etarismo e pelos abusos da indústria fonográfica e ainda assim querer reviver a paixão de um trabalho da juventude? Essa provocação é o ponto de partida que norteia a 1º temporada de Girls5Eva, série de comédia lançada pelo streaming Peacock em 2021, mas que chegou ao Brasil apenas em janeiro deste ano pela Globoplay. 

A série começa com um rapper dentro do estúdio, sofrendo com alguns bloqueios criativos. Tudo muda quando seu produtor lhe apresenta um hit de uma girlband antiga, para que eles pudessem samplear um pedaço daquilo. A música em questão era do grupo Girls5Eva - banda que até então tinha caído no esquecimento popular, após emplacar um hit ou outro lá nos anos 90. Até que a nova música desse artista vira hit e cai no circuito comercial. Com isso, as integrantes da banda retomam o contato entre si (movidas pelo desejo de receber os respectivos direitos autorais) e é a partir daqui que a história se desenrola.

Os anos 90 foram o auge das girlbands na indústria americana (Destiny's Child, Spice Girls, TLC, The Dixie Chicks, entre outras), mas apesar de Hollywood ter a capacidade maquinária de produzir e entregar sucessos em larga escala rapidamente, esses talentos nem sempre se sustentam no decorrer do tempo (e isso não é um fenômeno exclusivo dessa década.) A trama faz questão de cutucar isso debochadamente a todo instante. 

Sem ter um roteiro ácido ou sagaz, a série se prende a muitos diálogos rasos, mas que ainda assim conseguem tecer uma boa crítica a uma indústria tão fragmentada, repleta de histórias de abusos de poder. A começar pelo próprio manager tóxico da banda (algo muito comum dentro do mercado), que detinha a porcentagem majoritária dos royalties do grupo. Ou ainda, pela total falta de conhecimento das integrantes de como funcionava todo o processo de criação, até a finalização de uma música. É apenas no terceiro episódio da série que elas decidem entender e ir atrás das pessoas que compunham as suas canções no período do auge. Nesse momento, elas descobrem a importância dos suecos para a música pop, e por essa trama a série merece um ponto positivo: dessa percepção, várias outras fichas começam a cair. 

Com contestações debochadas e escancaradas, Girls5Eva expõe muito bem um mecanismo falho que até hoje segue enraizado dentro desse gênero musical: compositores que apenas replicam fórmulas, sem se preocupar com a subjetividade do artista em questão. Essa lógica apenas forma artistas que são absolutamente desconectados com o seu trabalho, criando e perpetuando uma codependência enorme do artista a figura do manager, gravadora, e de todos os outros ramos que se equilibram nisso. No decorrer dos oito episódios, a série trabalha esses e outros pontos fragilizados da indústria. Além de todos esses elementos, ela ainda escancara o sexismo e etarismo que seguem latentes nesse meio. 

Protagonizada por Busy Philipps (Summer), Ashley Park (Ashley), Renee Goldsberry (Wickie), Paula Pell (Gloria) e Sara Bareilles (Dawn), e seguindo a fórmula de qualquer formação musical pertencente ao mainstream, cada uma das integrantes do quinteto representa um estereótipo diferente dentro do grupo. Mas conforme essas mulheres vão atrás de respostas e ganhando ferramentas, elas passam a se libertar cada vez mais das tantas amarras que as prendiam.

Ainda que seja uma história leve, lições importantes chegam a ser abordadas na reta final da temporada: apesar de terem ambições individuais muito diferentes, e de cada uma tentar se firmar na indústria individualmente, elas entendem que pra chegar onde pretendem chegar, o caminho deve ser percorrido em conjunto - um final um tanto clichê, mas que ainda se mostra tão necessário e atual, para elucidarmos e enfatizarmos a importância da palavra sororidade. 

Nota do Crítico
Regular