Espera-se que qualquer série focada em histórias de amor esbarre em clichês. Porém, se tratando de uma produção literalmente intitulada Modern Love (“Amor Moderno”, em português), a expectativa era que houvesse mais substância ou, pelo menos, algum nível de originalidade no seu olhar para os relacionamentos de seus personagens. Infelizmente, apesar do seu elenco estrelar, a série antológica do Amazon Prime Video joga no seguro e entrega, por vezes, causos com boas premissas, mas desenvolvimentos pouco interessantes.
Seguindo uma estrutura narrativa semelhante a das crônicas - pertinente, tendo em vista seu material-base -, o seriado não se preocupa em determinar começos e fins. E nem deveria. Trata-se de um recorte da trajetória dos personagens e, portanto, o pouco que se apresenta sobre cada um é o suficiente para que se embarque nos seus dilemas. O problema é que, sem um arco claro, fica a impressão de falta de propósito. Por que, então, valeria a pena ver essas histórias de amor?
Talvez o episódio mais sintomático seja "Renovando pra Manter o Jogo Vivo", no qual Tina Fey e John Slattery vivem um casal há muito tempo fora de sintonia. Com a metáfora recorrente e pouco inspirada da partida de tênis, a série embarca na crise de um longo casamento, apresentando os pontos de tensão, mas não de fato trabalhando a transformação do que parecia ser um problema sem solução em, enfim, um relacionamento mais saudável. A comunicação entre os dois simplesmente começa a funcionar e pronto: final feliz - quer dizer, um interminável set.
Se não é repentino, a conclusão é apenas uma solução simples demais para um tema complexo. Basta observar "Então ele parecia um pai, e era só um jantar, não é?". O Complexo de Édipo tardio da protagonista com seu chefe, um homem mais velho estranhamente fazendo as vezes de um pai/namorado, se resolve com um momento de aprovação vinda do homem. Finalmente ela está livre dos seus daddy issues e pode, enfim, se relacionar de forma madura. Embora o diálogo em si tenha lastro nos traumas da infância da personagem de Julia Garner, ele esvazia a trama e, em última instância, desperdiça uma oportunidade de explorar uma angústia disfarçada de desejo, até mesmo da perspectiva do empresário vivido por Shea Whigham.
Entre tramas heteronormativas e figuras paternas problemáticas, sobram algumas histórias cativantes. Partindo da esquisitice dos primeiros encontros, “No hospital, um interlúdio de clareza” se mostra uma curiosa maneira de colocar os personagens de Sofia Boutella e John Gallagher Jr. para fazer uma autocrítica sobre quem são dentro e fora de um relacionamento. O episódio, inclusive, tira proveito do caráter fugaz do encontro para discutir o amor platônico e os joguetes de qualquer namoro de modo ora dramático, ora cômico.
“A corrida fica mais gostosa na volta final”, por sua vez, encanta ao discutir o amor nos recomeços, ou seja, na velhice e, eventualmente, diante do luto em uma narrativa surpreendente carismática. Já “Um mundo só para ela” mostra-se uma aventura interessante menos pela sua trama, e mais pela performance do Andrew Scott.
De um modo geral, faltou ousadia a Modern Love. Apesar de haver uma ou outra tentativa de criar algo diferente, como foi também o caso de "Me aceita como eu sou, quem quer que eu seja", episódio encabeçado por Anne Hathaway sobre amor a partir da perspectiva da saúde mental, tudo - estrutura, premissas e direção - são convencionais demais para uma produção que se autointitula moderna. Com sorte, depois de ser renovada para uma segunda temporada, a série apresentará histórias de amor mais inspiradoras. E inspiradas.