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Armênia

Continua a terapia regressiva dos franceses em busca das heranças perdidas

06.12.2007, às 18H00.
Atualizada em 05.01.2017, ÀS 06H12

A terapia regressiva dos franceses continua. Depois de argelinos (Exílios), romenos (Transylvania) e marroquinos (A Grande Viagem), agora são os descendentes de armênios a procurar por suas origens perdidas. Como nos demais filmes citados, é o remorso por ver diluído seu passado em meio ao cosmopolitismo de Paris que move os personagens de Armênia (Le Voyage em Arménie, 2006).

O filme do diretor marselhês Robert Guédiguian (A Cidade está Tranquila) começa mostrando que a cultura armênia na França só sobrevive de mimetismo: a filha de Anna (Ariane Ascaride), neta de Barsam (Marcel Bluwal), dança com um grupo folclórico em Marselha os passos fáceis de aprender de seus antepassados. A festa, como em qualquer povo ou lugar do mundo, é o último resquício de uma herança que já se foi.

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A trama é posta em movimento ainda durante a dança, quando Barsam chama a neta para lhe dar um aviso ao pé do ouvido. Corta para Anna dando um sermão no pai: Barsam está doente do coração e precisa ser operado. Quando volta a procurá-lo, Anna não o encontra. Fica sabendo que o pai viajou, sem aviso, de uma hora para a outra, até a Armênia. Criada em Marselha como outros tantos, a mulher fica sem saber o que fazer. Decide então, preocupada com a saúde dele, viajar atrás do pai.

O longa de Guédiguian, evidentemente, não trata da viagem de Barsam, mas sim de Anna - que aos poucos entrará em contato com o mundo que só conhecia pelas fotografias esmaecidas da família. E como em toda regressão movida por remorso, Guédiguian trata Anna com um misto de penitência, auto-desprezo e comiseração. Que se dê um voto ao diretor pela coragem de ter apostado em uma personagem tão anti-carismática para segurar um filme inteiro. Impaciente e exigente como uma boa francesa, a atípica heroína de Armênia passará por todas as lições que lhe cabem.

Como resumão para vestibular Armênia se justifica - é o clássico filme-painel que enfileira cenas ilustrativas da situação do país. Passa-se (frequentemente de carro, pois há muito a ver) pela multiplicação dos postos de gasolina, boates escusas, restaurantes típicos, exageros de salão de beleza, passa-se também pelas favelas, postos de saúde, vilarejos auto-sustentados. Ao fundo, sempre, o Monte Ararat, símbolo da Armênia enquanto apelo por atenção, outro viés que Guédiguian não poderia deixar de abordar.

Enquanto se fizerem filmes assim, com culpas e discursos que sufocam a imagem, o cinema regressivo francês continuará sendo um desfile de cartões postais humanitários habitados por personagens funcionais. Não por acaso, o retrato de Armênia se resume a dois deles: o homem de negócios sem escrúpulos, que representa o armênio desnacionalizado, e o rude porém charmoso militar, que representa o armênio enraizado na noção de nação.

Eliminar tipos funcionais assim, que representam uma idéia antes de representar um ser humano, é o primeiro passo para fazer um cinema realmente aberto para o estrangeiro e para si mesmo.

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