O diretor Baz Luhrmann (Jon Kopaloff / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP)

Créditos da imagem: O diretor Baz Luhrmann (Jon Kopaloff / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP)

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Como começar a assistir Baz Luhrmann?

Diretor de Elvis é um daqueles artistas com um estilo inconfundível desde os anos 90

Omelete
2 min de leitura
18.07.2022, às 16H51.

Baz Luhrmann passou por poucas e boas para realizar o seu primeiro longa-metragem, Vem Dançar Comigo, lançado em 1992. Concebido como uma peça de teatro no Instituto Nacional das Artes Dramáticas (NIDA), palco público australiano onde Luhrmann e seus principais colaboradores (Craig Pearce, Catherine Martin, etc) afiaram seus talentos, a comédia romântica ambientada no mundo da dança profissional foi sucesso de público e crítica, mas lutou para achar financiamento nos cinemas.

Isso porque, é claro, o estilo de Luhrmann não era exatamente convencional. Dado ao espetáculo e à extravagância, às brincadeiras de tom e a fazer comédia com o grotesco e o ridículo, o então ator e diretor de teatro não se encaixava muito bem na onda de artistas australianos e neozelandeses que havia construído uma reputação robusta para o cinema da Oceania nessa época, incluindo gente como George Miller, Gillian Armstrong, Jane Campion, Phillip Noyce e Peter Weir.

O mundo de Luhrmann, ao contrário daqueles criados pelos seus contemporâneos, sempre foi sobre fantasia e exagero - emoções à flor da pele, teatralidade desavergonhada, cores supersaturadas e muita, muita câmera lenta. O cineasta natural de Sydney, de 59 anos de idade, deixou sua marca em seis longas-metragens e uma série de TV até hoje, mas se você não sabe como mergulhar nessa filmografia extravagante, ainda que curta, o Omelete te ajuda!

 

Comece por: Moulin Rouge! - Amor em Vermelho (2001)

Impossível indicar outro ponto de partida: o musical ultrarromântico e anacrônico de Luhrmann não é só o seu filme mais bem-sucedido, como também o que reúne melhor todas as características de sua arte. Indicado a oito Oscar, incluindo melhor filme, e vencedor de duas estatuetas (melhor design de produção e melhor figurino), o longa empresta ideias visuais e narrativas de todo canto para criar uma mistura única.

Luhrmann já falou publicamente sobre sua inspiração em épicos de Bollywood, a vibrante indústria cinematográfica indiana, elogiando a falta de pudor dos filmes da região e a forma como eles usam da comédia mais baixa ao drama mais elevado, só para depois explodir em música e dança”. Ele também admitiu que a trama sobre o amor condenado do compositor Christian (Ewan McGregor) pela cortesã Satine (Nicole Kidman) foi extraída de narrativas clássicas como La Boheme e A Dama das Camélias.

O resultado dessa mistura de mitológico e moderno é uma experiência cinematográfica frenética, deliciosamente brega, espetacularmente indisposta a pedir desculpas por ser o que é. Enquanto Luhrmann faz Christian e Satine cantarem Elton John um para o outro, transforma The Police em um tango trágico e ciumento, ou transfigura o hit inicial de Madonna em uma canção de vilão comicamente diabólica, só não se diverte e se emociona quem está com as garras muito, muito afundadas no próprio cinismo.

Disponível para streaming no Star+.

Para os fãs de música e dança: Vem Dançar Comigo (1992)

O jovem fenômeno das competições de dança australianas, Scott Hastings (Paul Mercurio), esconde um segredo: ao invés de seguir as rígidas regras e os passos pré-estabelecidos do esporte, ele quer dançar com o coração. Ao revelar isso, no entanto, ele perde a parceira e ganha a desconfiança do terrível Barry Fife (Bill Hunter), presidente da associação de dança local. Será que uma parceria com o “patinho feio” da academia onde ele estuda, a tímida Fran (Tara Morice), é a solução para esse dilema?

Luhrmann estreou no cinema com um filme que tem todas as suas marcas, mesmo que tenha passado por consecutivos cortes de orçamento durante uma produção atribulada que incluiu não só a morte de uma das coadjuvantes (Pat Thomson, a mãe de Scott) quanto a do principal produtor e apoiador financeiro do longa. Figurinos extravagantes, antagonistas caricatos, um senso de musicalidade impecável e uma mensagem idealista sobre como o amor e a arte deveriam ser acessíveis para qualquer pessoa, no entanto, entregam: este é mesmo um filme de Baz Luhrmann.

Disponível para streaming no Kinopop.

The Get Down (2016-2017)

Luhrmann se juntou com o dramaturgo Stephen Adly Guirgis para criar esta série musical da Netflix, que retrata a ascensão do hip hop e da disco music pelos olhos de um grupo de amigos e artistas multimídia que vivem e trabalham no Bronx, em Nova York, no final dos anos 1970. Além de ser creditado como criador e produtor, o australiano escreve e dirige o primeiro episódio da série, intitulado "Where There Is Ruin, There Is Hope for a Treasure".

Visualmente espetacular e carregada de performances inesquecíveis, The Get Down brilhou como uma das melhores produções da Netflix no início da era das séries originais da plataforma, entre 2016 e 2017. Com 11 episódios ao todo, divididos em duas partes, a série carrega a assinatura inconfundível de Luhrmann especialmente no começo, mas logo se transforma em um animal próprio, explodindo em celebração queer e euforia artística.

Disponível para streaming na Netflix.

Elvis (2022)

Como falar adequadamente do homem que viveu “100 anos em 42”, cuja carreira esteve na bifurcação de quase todos dilemas morais da segunda metade do século XX, e que até hoje é uma das figuras mais icônicas a sair da indústria fonográfica americana? Para Baz Luhrmann, a resposta é: você não fala sobre ele, mas sobre o que ele significa. Elvis é um espetáculo vertiginoso que entende muito melhor o que o seu biografado foi para a cultura pop do que precisa (ou quer!) entender quem ele era enquanto ser humano.

Luhrmann brinca com o grotesco e com o mentiroso (ambas as qualidades encarnadas no Coronel Tom Parker de Tom Hanks, mais caricatura do que nunca), e evolui o seu estilo opulento para incorporar a decadência brega dos shows de música e magia de Las Vegas. Contando com um Austin Butler que faz imitação impecável de Presley, o diretor faz do seu Elvis um filme conectado à raiz do zeitgeist contemporâneo, e de como ele enxerga (ou poderia enxergar) o seu biografado “super-herói”.

Atualmente em cartaz nos cinemas brasileiros.

Para os fãs de romance e drama: Romeu + Julieta (1996)

Romeu e Julieta na Miami dos anos 1990… mas com o diálogo preservado quase inteiramente da peça original, escrita por William Shakespeare em 1597. A ideia maluca de Luhrmann foi bancada pela Fox após o sucesso internacional surpreendente de Vem Dançar Comigo, e marcou o momento em que o grande público se encontrou pela primeira vez com a sensibilidade única do cineasta.

Se Leonardo DiCaprio e Claire Danes são o seu casal perfeito da adolescência, culpe este filme, que imortalizou os dois nos papéis-título. Com uma trilha sonora carregada por artistas bombados da época (Radiohead, Des’ree, Garbage), mas também remixes criativos de clássicos de outras décadas (mais abaixo nessa lista conversamos sobre “Everybody’s Free”), Luhrmann mostrou que é capaz de extrair amor e tragédia de uma era não muito conectada com essas duas coisas.

Disponível para streaming no Star+.

Austrália (2008)

Luhrmann em seu mais auto-indulgente. Pela própria admissão do diretor, a ideia com Austrália era criar um retrato do país-continente do título que rivalizasse com a forma como E o Vento Levou eternizou o sul dos EUA nos anos 1930. O caminho encontrado por ele foi colocar uma história de amor ardente contra o cenário da Segunda Guerra Mundial e uma abordagem temerária, em sua ousadia, das espinhosas práticas racistas que dizimaram a população indígena da Austrália na mesma época.

Com 2h45 de duração e um orçamento de US$ 130 milhões, o filme resultante de toda essa ambição (diga-se, o primeiro de Luhrmann após o sucesso meteórico de Moulin Rouge!) é uma obra-prima falha que combina o mais puro melodrama com visuais fantásticos, mas também obviamente artificiais. Este é também o filme de Luhrmann menos querido pela crítica, o que talvez o tenha incentivado a voltar à ilha de edição e resgatar cenas deletadas para criar a minissérie Faraway Downs, uma versão de 6h de Austrália que será lançada ainda este ano pelo Star+.

Disponível no Brasil apenas em mídia física.

O Grande Gatsby (2013)

O que você faz quando o seu épico histórico de mais de 2h30 de duração não vai tão bem quanto o esperado, talvez especificamente por que você foi um pouco ambicioso demais na missão que quis abraçar? Bom, se você é Baz Luhrmann, a resposta é: você adapta um dos maiores clássicos literários de todos os tempos, transformando-o em outro filme de quase 2h30 e mais de US$ 100 milhões de orçamento. Por que, você achou que ele ia se intimidar? Pense de novo.

O Gatsby de Luhrmann pesa um pouco menos no melodrama e no grotesco, mas o cineasta empresta sua sensibilidade fabulosa e seu ritmo frenético a uma das narrativas emblemáticas da cultura ocidental moderna, realçando tudo o que ela já tinha de arquetípico. Aqui, o Nick Carraway de Tobey Maguire é o ingénue dos ingénues - e está obviamente apaixonado por Jay Gatsby (Leonardo DiCaprio, no papel que ele nasceu para interpretar), explicitado como o ícone de todos os anseios e mentiras do sonho americano que ele sempre foi. Foi preciso um australiano para ver tudo isso e colocar em tela, é claro.

Disponível para streaming na HBO Max.

Faixa bônus: “Everybody’s Free (To Wear Sunscreen)”

Se você estava vivo em 2003 no Brasil, provavelmente se lembra de Pedro Bial te incentivando a usar filtro solar”. Em um vídeo produzido para o Fantástico, o jornalista declamava conselhos de vida que iam do trivial (“Seja cuidadoso com os joelhos, você vai sentir falta deles”) ao profundo (Não seja leviano com o coração dos outros, e não ature gente de coração leviano) por cima de uma batida eletrônica contagiante e de vocais cheios de soul. Foi um hit - mas também um remake.

“Everybody’s Free (To Wear Sunscreen)”, a versão original, é obra de Baz Luhrmann. Em 1998, o produtor Anton Monstead recebeu - como muitos americanos e moradores de outros países anglófonos - o texto por e-mail, falsamente atribuído ao autor Kurt Vonnegut. Ao lado de Luhrmann, que na época se preparava para lançar o álbum Something for Everybody, uma coletânea de remixes de canções usadas em seus filmes, eles descobriram que as palavras na verdade eram da jornalista Mary Schmich, que as publicou em sua coluna no Chicago Tribune em 1997, com um título bem poético: “Conselhos, como a juventude, são provavelmente desperdiçados nos jovens.

Luhrmann contratou o ator australiano Lee Perry para ler o texto em voz alta e remixou o resultado com o hit noventista “Everybody’s Free (To Feel Good)”, de Rozalla, que ele já havia usado na trilha de Romeu + Julieta. A canção foi parar no topo das paradas no Canadá, Irlanda, Escócia e Reino Unido, além de ganhar versões em vários países (Rússia, Alemanha e Israel fizeram as suas, além do Brasil). Ah, e o texto continua tendo ótimos conselhos, viu?

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