O problema de Hollywood hoje em dia é que a maioria dos seus filmes ruins são ruins por omissão. Não se comprometem com nada, só reproduzem cenas isoladas de impacto para um público que, supostamente, funciona com lampejos de atenção. É como se fossem pequenos filmes dentro de um longa-metragem, e nenhum deles tem muito a dizer ou mesmo a narrar.
a casa dos sonhos
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Por isso que um filme como A Casa dos Sonhos (Dream House) pode ser tão fascinante. O trabalho do diretor irlandês Jim Sheridan (Terra de Sonhos, Entre Irmãos) - que não gostou do resultado e pleiteou ao sindicato de diretores de Hollywood a remoção de seu nome dos créditos, mas teve o pedido negado - está decididamente comprometido em ser ruim do começo ao fim. É um suspense que pode ser acusado de tudo, menos de omissão.
Na trama, Daniel Craig interpreta um executivo bem-sucedido da área editorial que larga o emprego em Nova York e se muda, com a esposa (Rachel Weisz) e as duas filhas, para uma linda casa numa cidadezinha do Estado de Connecticut. No entanto, não demora para que eles descubram que sua casa foi cenário do assassinato de uma mãe e seus filhos, provavelmente mortos pelas mãos do marido, que sobreviveu.
À primeira vista, A Casa dos Sonhos é só um derivado de todo tipo de terror com casas antigas que escondem segredos, mas a coisa vai bem mais longe. Os sinais de que há alguma coisa errada (não só com a casa) aparecem logo no início, na maneira como Sheridan filma a família. Quando as crianças percebem um perigo no jardim, por exemplo, a câmera não mostra o exterior da casa, e sim permanece nos close-ups da família. Da mesma forma, quando Daniel Craig interage com outros personagens, como os polícias no bar, Sheridan pega o ator por espelhos para mantê-lo sempre à vista, mesmo nos contraplanos. Por que é tão importante ver a reação deles ao que está acontecendo ao redor?
As respostas não demoram a aparecer... A partir daqui, é impossível falar de A Casa dos Sonhos sem incorrer em spoilers. É um filme com duas grandes reviravoltas. A primeira, que acontece logo na metade e está presente no trailer, é até certo ponto previsível (por tudo aquilo exposto no parágrafo acima). Já a segunda, aí sim, dá pra ser considerada uma surpresa de fato. Este texto vai discutir, abaixo, apenas a primeira reviravolta - tentando não entregá-la de vez.
Digamos que o título do filme é bastante literal. Alucinação e realidade se misturam ao mesmo tempo em que Sheridan tenta dar às situações mais implausíveis uma justificativa plausível, o que só torna mais tocante esse esforço de A Casa dos Sonhos de se levar muito a sério. O roteiro de David Loucka não é meramente uma cópia de O Amigo Oculto e A Ilha do Medo - é uma cópia que se julga original, que projeta em si uma imagem de gravidade, de importância ("vamos entrar na mente desse personagem atormentado e entendê-la!"). É um filme que não tem medo do ridículo, acima de tudo, porque não sabe identificá-lo.
E isso potencializa a comicidade de cenas como aquela em que Daniel Craig "acorda" (ah, o velho truque do nome formado por números) e aparece com cabelos diferentes o tempo todo, e dá outra dimensão a imagens captadas antes e depois das brigas na produção, durante os reshoots (como Naomi Watts botocada num instante e "normal" logo depois). Em alguns momentos, parece que o filme será interrompido e abandonado para todo o sempre, como aqueles esquetes do Monty Python que terminam na metade, de estafa, soterrados por um acúmulo de absurdos que não permite saída.
A imagem final, com Daniel Craig carregando o corpo pra fora da casa como se fosse um saco de batatas (ah, o romantismo dos marombeiros), sacramenta o bendito fracasso de A Casa dos Sonhos, um filme que deve ter sido um pesadelo no seu friorento set (pelo menos serviu para aproximar os hoje casados Craig e Rachel Weisz) mas lava a alma de quem estava se decepcionando até com o nível de ruindade de Hollywood.
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A Casa dos Sonhos | Cinemas e horários
Ano: 2011
País: EUA
Classificação: 14 anos
Duração: 92 min
Direção: Jim Sheridan
Elenco: Daniel Craig, Naomi Watts, Rachel Weisz, Marton Csokas, Elias Koteas, Taylor Geare, Claire Geare, Rachel G. Fox, Jane Alexander, Brian Murray, Bernadette Quigley, Sarah Gadon, Gregory Smith, Mark Wilson, David Huband