Cena de Furiosa: Uma Saga Mad Max (Reprodução)

Créditos da imagem: Cena de Furiosa: Uma Saga Mad Max (Reprodução)

Filmes

Crítica

Furiosa é filme de gênero “raiz” - e, até por isso, não vai agradar todo mundo

George Miller está em seu melhor quando atende a seus impulsos mais puros

Omelete
4 min de leitura
16.08.2024, às 10H42.

Em alguns momentos de Furiosa: Uma Saga Mad Max, eu me peguei pensando no quanto o longa me lembrava os trabalhos de Russell Mulcahy, e especialmente a sua direção em Resident Evil 3 - Extinção. Não deveria ser uma surpresa: Mulcahy e George Miller são não só compatriotas (ambos australianos), como também contemporâneos, tendo encontrado o seu público e os seus projetos mais marcantes durante os anos 1970 e 1980, mergulhados - para o bem e para o mal - no redemoinho estético de um par de décadas que trouxe a vulgaridade para a frente do palco da cultura pop e que revolucionou o que pensamos como "cinema de prestígio" e (especialmente) como "cinema de gênero".

E, mesmo assim... Mulcahy permaneceu a carreira toda, e ainda permanece, em um território que passou longe do prestígio, realizando trabalhos que se tornaram chave para o contínuo do cinema pop sem amealhar prêmios e notas altas da crítica pelo caminho. Miller, por outro lado, encontrou sua própria forma geniosa de traduzir uma coisa para a outra, e é claro que isso tem um pouco a ver com os talentos e obsessões específicas dos dois cineastas. Mas, quando se trata de Furiosa: Uma Saga Mad Max, esses dois caminhos paralelos de cinema parecem se cruzar, e a impressão que fica após a sessão do filme no Festival de Cannes 2024 é que o próprio Miller é responsável por essa aproximação.

O desvio de caminho é óbvio especialmente quando se contrasta Furiosa com o seu antecessor imediato na franquia, Mad Max: Estrada da Fúria. Contraste esse que, por mais desaconselhável que seja diante da tradição da saga de se reinventar a cada novo episódio, seguindo o caminho dos interesses sazonais de Miller, é também inevitável. Estrada da Fúria encarava o cinema de ação, dentro das dinâmicas e movimentos típicos dele, como todo o seu ponto, buscando a elevação no trabalho técnico, no esmero dos detalhes, da coloração da fotografia à robustez do trabalho de dublês. Já Furiosa não busca nunca essa elevação, até porque entende que o cerne de seu jogo narrativo está justamente na forma como se engaja com as formas mais “rasas” do cinema de gênero.

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Este é, por exemplo, um filme de vingança. Ao traçar a história de origem de Furiosa (Alyla Browne e Anya Taylor-Joy, em momentos diferentes do filme), Miller escolhe se focar na forma como Dementus (Chris Hemsworth), líder de uma numerosa gangue de motoqueiros no deserto pós-apocalíptico australiano, a arrancou do oásis de abundância onde ela vivia e a transformou em mais uma escrava lutando para sobreviver nesse cenário insípido. É contra ele que a protagonista busca retribuição no segundo e terceiro atos de Furiosa, e Miller (que novamente assina o roteiro ao lado de Nick Lathouris) aproveita não só para tirar inspiração da ópera, referência importante para histórias regidas por emoções humanas básicas como a raiva, como também para refletir sobre o ciclo vicioso de violência que está amaranhada na natureza de quem somos, e que nem um apocalipse é capaz de mudar.

Daí que Furiosa adquire uma ressonância tópica mais imediata do que Estrada da Fúria, brincando com conceitos históricos - como quando o narrador lista guerras de séculos passados até chegar ao conflito futurista que acompanhamos no filme - e acenos ao contemporâneo, vide os recortes de manchetes televisivas que embalam os créditos iniciais, que poderiam muito bem ter saído direto dos canais jornalísticos do ano longínquo de 2024. Se a pegada social dos filmes anteriores de Mad Max era muito mais incidental ou subjetiva, pela própria admissão de Miller, aqui ele usa o pós-apocalipse como comentário pop por excelência, dizendo muito de verdadeiro, e de emocionalmente impactante, sem dizer lá muita coisa de substantivo.

Nesse mesmo pique é que Furiosa incorpora também outras obsessões recorrentes de Miller: há algo nele de ficção científica ambientalista (como em Happy Feet), de um faroeste mais áspero do que a tradição estadunidense (referência que emergiu de Mad Max desde o primeiro filme, mas vem sendo esmerada desde então), e de fantasia filosófica que se refugia em uma relação oblíqua e ambivalente com o tempo. Este último elemento, inclusive, é herdado diretamente do espetacular - mas pouquíssimo visto, e ainda menos apreciado - Era Uma Vez um Gênio, que Miller lançou em 2022. E, alías, não digam que eu não avisei.

Enfim, Furiosa é um filme que, como seu autor, desabrocha em vertentes caleidoscópicas. É também, no entanto, um filme que nunca se afasta demais da trilha batida e rebatida dos gêneros que aborda. A impressão que fica é que Miller, um pouco querendo evitar a fadiga de franquia - e ela aparece aqui, especialmente nos momentos em que o cineasta desvia do seu caminho para nos jogar migalhas de mitologia e acenos a Estrada da Fúria - , e um pouco indisposto a cortejar um prestígio acadêmico que, apesar dos aplausos da crítica, continua aludindo seus projetos, fez um filme que acredita profundamente no valor das reiterações em que se aplica, e do olhar pessoal que traz a elas.

É uma receita que tem funcionado há mais de um século, e que continua funcionando aqui - mas que, especialmente em círculos intelectuais, ainda é vista com um pouco de desdém. Para quem acha difícil aceitar que Mulcahy e Miller fazem parte da mesma tradição, Furiosa talvez seja difícil de engolir.

Nota do Crítico
Ótimo

Furiosa: Uma Saga Mad Max

Furiosa: A Mad Max Saga

Ano: 2024

País: Austrália

Duração: 148 min

Direção: George Miller

Roteiro: George Miller, Nick Lathouris

Elenco: Tom Burke , Anya Taylor-Joy , Chris Hemsworth

Onde assistir:
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