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Ganhador do Prêmio do Júri em Cannes nesse ano, Mal dos Trópicos (Sud pralad, 2004), do diretor Apichatpong Weerasethakul, é dois filmes em um. Enquanto na primeira parte encontramos algo naturalista com um tom bucólico, na segunda temos um filme praticamente sem diálogos, mas cheio de mistérios e lendas de fantasmas, numa narrativa sufocante e perturbadora. Trata-se de uma única história, mas com recursos lingüísticos bastante antagônicos.
Keng e Tong são dois jovens apaixonados. O primeiro é um soldado e o outro trabalha no campo. O tempo passa, ritmado pelas noites na cidade, pelos jogos de futebol e pelas agradáveis reuniões na casa da família de Tong. Um dia, quando as vacas da região são decapitadas por um animal selvagem, Tong desaparece. Segundo uma lenda local, um homem pode se transformar em animal selvagem. Keng parte para o coração da floresta, local onde o mito se torna realidade.
Apichatpong dita o ritmo do filme conforme as imagens. No começo da história, acompanhamos a vida em comum do soldado e do aldeão e a paixão que eles nutrem um pelo o outro. São cenas comuns do dia-a-dia, como passeios, idas ao cinema e trocas de sorrisos. Nesta parte, o enredo vai se desenvolvendo bem devagar.
Quando Tong desaparece, o filme muda sua cadência. Conforme Keng penetra na selva, o ritmo vai ficando pesado, claustrofóbico e assustador. Ele vai sendo envolvido pela floresta e leva o público junto. De perseguidor vira perseguido. A escuridão toma conta da narrativa lançando Keng num mundo repleto de fantasmas e espíritos. O tigre da lenda aparece na forma física de Tong. No final percebemos que a busca de Keng é puramente reflexiva. Mito e metáfora mesclam encantando o espectador, estabelecendo um diálogo íntimo com o sobrenatural. O confronto final com o tigre fantasma lembra muito as últimas cenas de Apocalipse Now (de Francis Ford Copolla, 1979).
O elenco do filme é formado por atores amadores, mas isso não diminui em nada a obra, até porque ela é calcada no roteiro e na direção. Isso fica claro nos recursos utilizados pelo cineasta na segunda parte. Ele usa aqueles quadros típicos dos filmes mudos para contar a história. Animais na floresta comunicam-se com Keng sempre acompanhados de legendas para que o espectador compreenda a linguagem.
Analisando as duas partes percebemos que elas possuem uma relação simbiótica, uma completando outra em seu significado.
Ano: 2004
País: Tailândia
Classificação: LIVRE
Duração: 118 min
Direção: Apichatpong Weerasethakul