Você provavelmente está lendo este texto com o rosto enfiado na tela de um computador ou smartphone, com o mesmo olhar perdido, uma mistura de concentração e vazio, com o qual eu mesmo o escrevo, no meu próprio aparelho. O mesmo semblante inócuo que domina cada um dos personagens de Men, Women and Children (2014).
O novo filme de Jason Reitman (Juno, Amor Sem Escalas), como em boa parte de seus longas anteriores, faz um retrato - ou melhor - tira um "selfie" da sociedade de hoje, desta vez discutindo a tecnologia. Como ao mesmo podemos ser tãos obcecados com a conectividade entre pessoas e tão despreocupados com o distanciamento que ela pode causar.
O drama estabelece um verdadeiro pot-pourri das mudanças causadas pela tecnologia, de websites onde todas as perguntas erradas podem ser respondidas, à facilitação da procura por afeto por desconhecidos, aos desvios gerados pelo excesso de pornografia, passando pelo desperdício de tempo em uma vida que não é a sua, questões sobre privacidade e até as promessas de vida fácil em se tornar uma celebridade online. Não há pedra que o diretor não vire aqui.
men woman and children
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A trama acompanha seis adolescentes e suas famílias e suas relações com a tecnologia. No entanto, fica a sensação de que a "selfie" vai amarelar cedo demais. Reitman é muito incisivo em suas colocações, que funcionam espetacularmente bem para este momento, mas, assim como a tecnologia que discutem, ficarão ultrapassadas em pouco tempo. O uso excessivo de metáforas fáceis também deve fazer muita gente torcer o nariz. No entanto, há alguns ótimos momentos aqui, como a maneira que o diretor filma diálogos que estão acontecendo simultaneamente de forma verbal e através da tecnologia, e nas interpretações inspiradas que ele consegue especialmente do elenco, em especial Adam Sandler, Rosemarie DeWitt, Ansel Elgort e Kaitlyn Dever.
Reitman abre o filme, que co-escreveu com Erin Cressida Wilson baseado no romance de Chad Kultgen, com esperada nostalgia e sensação de perda. Mas o faz muito bem. Na abertura, as imagens da sonda espacial Voyager relembram que ali, no objeto que carrega um disco de ouro através da galáxia, estão gravados sons e imagens da nossa civilização. Mas que civilização é essa, afinal? A Voyager foi lançada em 1977, quando nem Carl Sagan, o gênio científico que compilou o conteúdo do disco, sequer sonhava com o rumo que as coisas tomariam nesse piscar de olhos cósmico que são 37 anos.
Sagan, aliás, é mencionado várias outras vezes, em especial sua obra mais acessível e conhecida, Pálido Ponto Azul. Aquela, em que o cosmólogo tão eloquentemente discorreu sobre a pequenez dos nossos atos perante o grande esquema das coisas. Insignificantes ou não, para os personagens do drama, cada ato tem consequências poderosas. Em seus pequenos cosmos, pontuados por telas de diversos tamanhos, pelo menos.
Assista ao trailer:
Ano: 2014
País: EUA
Classificação: 12 anos
Duração: 116 min min