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Crítica

Kong: A Ilha da Caveira | Crítica

Franquia volta pop em queima de energia rápida, intensa e superficial

02.03.2017, às 18H56.
Atualizada em 02.03.2017, ÀS 19H20

Diz a lenda que o diretor Jordan Vogt-Roberts, então com apenas um longa no currículo, convenceu a Warner Bros. de que ele era o homem certo para fazer Kong: A Ilha da Caveira quando mostrou ao estúdio uma versão preliminar da cena que abre o filme. Nela, a paz de uma praia paradisíaca no Pacífico Sul é quebrada com a queda de dois aviões da Segunda Guerra: de um piloto aliado e de um japonês. Se o espaço já tem cores chamativas que lembram os desenhos animados, o duelo que se encena em seguida reforça essa noção, porque os dois personagens - um americano fotogênico de olhos azuis e um japonês endemoniado com sua espada - estão mais próximos dos cartuns do que se esperaria de um filme de guerra.

Essa cena é certeira como síntese e dá o tom de todo o King Kong que Vogt-Roberts se propõe fazer: menos uma obra de reverência à franquia (o que já o distancia do Kong de Peter Jackson) e mais uma obra que reverencia todo o pop, seus potenciais e suas vocações. Produto de uma geração que aprendeu a crescer sem abrir mão de gostos da infância, o diretor se revela em A Ilha da Caveira uma versão light de Zack Snyder. Mistura e estetiza games, quadrinhos e temas orientais com a cinefilia obrigatória pós-Nova Hollywood, de Spielberg a Coppola. O resultado é um filme que fetichiza o imaginário de seu tempo mas não com a mesma carga erótica de Snyder, e sim com uma pulsão pelo colecionismo.

Os personagens de Kong: A Ilha da Caveira são, a exemplo dos dois combatentes daquela primeira cena, pouco mais do que arquétipos cartunescos do filme de aventura: o galã meio Indiana Jones vivido por Tom Hiddleston, a fotógrafa sensível (Brie Larson), o militar enlouquecido pela guerra (Samuel L. Jackson), os cientistas de óculos e caderninho, o pelotão formado por buchas-de-canhão. De alguns desses personagens não esperamos, mesmo, que sejam nada além do arquétipo, e no fim os militares - que parecem mais saídos de Trovão Tropical do que necessariamente de Apocalipse Now - roubam a cena com diálogos espirituosos. Já os dois protagonistas, que deveriam transcender e consumar jornadas, ou pelo menos servir melhor de intérpretes no vínculo que estabelecem com o espectador, ficam devendo: Hiddleston e Larson, subdesenvolvidos desde o começo do filme.

Vogt-Roberts logo demonstra que sua especialidade aqui não é a dramaturgia, quando Kong começa a patinar lá pela metade, em meio a várias cenas-montagens com canções pop que aceleram a narrativa mas não a aprofundam. Em termos de aproveitamento rápido de set pieces bem pensados, porém, ele se esmera. Assim como o boneco bobble head de Richard Nixon que surge em cena para sublinhar um eventual caráter político do filme, tudo em Kong se torna objeto prontamente descartável. E como Vogt-Roberts queima munição com gosto: os primeiros 40 ou 50 minutos são incríveis, até o desfecho da entrada dos helicópteros na ilha, uma festa caótica de montagem clipada, com mudanças de pontos de vista de câmera e soluções visuais frequentemente baseadas no calor das cores (a hora em que Jackson fica soturno no seu escritório, resolvida na iluminação, é anime puro).

Como a premissa se presta ao consumo rápido e à descartabilidade (dos muitos gêneros com que o filme flerta o principal é o da aventura de travessia, organizada sempre de desafio em desafio, como fases de um game) e o roteiro se estrutura de forma a permitir a narrativa ágil (ora seguimos os mocinhos, ora os "malvados", intercalados, como se revisitassem a busca ao tesouro de Os Goonies substituindo os mafiosos por militares), os defeitos de Kong não terminam minando tanto esse prazer e a visível facilidade com que o filme se filia ao pop e lhe presta tributo, tratando a violência de forma caricata com um humor que tornou-se raro nos marrentos blockbusters americanos.

E o King Kong? Bem, criado com esmero pela equipe de efeitos visuais, com ajuda do ator Toby Kebbell em close-ups que exigiam uma captura de movimento facial mais pontual, o belo gorila é a imagem que perdura, em meio a tanta combustão instantânea. De resto, é um filme sobre filmes, sobre acúmulos de referências, transpiradas com urgência.

Nota do Crítico
Ótimo
Kong: A Ilha da Caveira
Kong: Skull Island
Kong: A Ilha da Caveira
Kong: Skull Island

Ano: 2017

País: EUA

Classificação: 14 anos

Duração: 120 min

Direção: Jordan Vogt-Roberts

Roteiro: Max Borenstein, Derek Connolly

Elenco: Toby Kebbell, Brie Larson, Corey Hawkins, Tom Hiddleston, Samuel L. Jackson, John C. Reilly, Tom Wilkinson

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