Filmes

Crítica

O Castelo de Vidro | Crítica

Adaptação do best-seller faz competente relato geracional e deixa Woody Harrelson brilhar

23.08.2017, às 14H33.
Atualizada em 23.08.2017, ÀS 15H02

Em tempos de cisão nos EUA, de movimentos que nos lembram que o país é feito de pólos opostos, social e politicamente, filmes como O Castelo de Vidro (The Glass Castle, 2017) tentam refazer ligações - ou pelo menos realimentar as velhas fantasias de uma identidade americana única. Isso se dá no filme de Destin Daniel Cretton, baseado no romance autobiográfico de Jeannette Walls, por duas vias paralelas, a geográfica e a geracional.

Walls cresceu com três irmãos acompanhando seus pais de cidade em cidade pelo interior dos EUA. O chefe da família, Rex, criou a todos com o controle personalista que se espera dos self-made men americanos que batem no peito pra dizer que tomam o destino nas próprias mãos. O problema é que a parte de ser um autodidata do sucesso nunca deixou de ser um sonho para Rex, e depois de anos de rotina precária, quando Jeannette deixa a família para ter alguma perspectiva de vida, as relações se deterioram de vez.

O período delimitado por Cretton - escolhido, antes de mais nada, para espelhar fielmente a vida da escritora e sua família - facilita que os arcos dramáticos em O Castelo de Vidro fiquem bem definidos, repercutam na história americana, e lhes dê uma pertinência clara. Entre 1960 (o auge publicitário do american way, quando Rex tenta convencer a si mesmo e aos outros que construirá mesmo um castelo para os Walls) e a mudança de Jeannette para Nova York (a era do cinismo da cultura yuppie numa cidade desiludida consigo) transcorrem os anos de maior choque social nos EUA no século 20.

Baby boomers como Jeannette Walls hoje dominam a literatura americana com seus temas geracionais, e embora sua narrativa seja muito mais confessional do que o olhar distanciado e irônico de contemporâneos seus como Jeffrey Eugenides e Jonathan Franzen, O Castelo de Vidro consegue injetar caráter épico num relato de câmara que transcorre em trânsito, entre a correria das mudanças e afazeres domésticos. Felizmente, Cretton não coloca o pano de fundo acima da construção dos seus personagens, e seu filme se sai melhor nesse sentido do que pares recentes como Capitão Fantástico - cujas chantagens emocionais Cretton tenta evitar, na medida do possível.

Embora o grande trunfo que Cretton tenha à mão seja seu bom elenco (o único que destoa é Max Greenfield, castigado com o personagem mais estereotípico) quem carrega O Castelo de Vidro praticamente sozinho é Woody Harrelson. Em uma das melhores atuações de sua carreira, o ator entende que Rex tem o perfil dos grandes homens trágicos dos melodramas hollywoodianos e faz uma insuspeita e excelente emulação de Marlon Brando: uma força da natureza que ocupa espaços e se expande como se fosse um direito de nascença, e que mesmo assim não esconde suas fragilidades. O Brando de Harrelson em O Castelo de Vidro acaba saindo muito melhor que o Brando fake de Harrelson em Planeta dos Macacos - A Guerra.

No mais, assim como Jeannette Walls tem a sensibilidade para a problematização que se espera dos baby boomers, Rex parece extraído por completo de uma das peças de Tennessee Williams do imediato pós-guerra, repletas de alcoólatras traumatizados como Rex. Ao entender que a família Walls é constituída basicamente por esses arquétipos da dramaturgia americana, Destin Daniel Cretton toma a inteligente decisão de não atrapalhar muito: escolhe locações, trilha e elenco de apoio com muita competência, e faz um filme que de fato parece viajar pelo país e seus espaços de mito (o deserto, a montanha) para registrar pessoas marcadas na pele pelo tempo. No fim sua narrativa se manifesta quase como um acúmulo de coisas que não estão sob o controle de Cretton, Walls, muito menos dos personagens.

Nota do Crítico
Bom
O Castelo de Vidro
The Glass Castle
O Castelo de Vidro
The Glass Castle

Ano: 2017

País: EUA

Classificação: 14 anos

Duração: 127 min

Direção: Destin Cretton

Roteiro: Andrew Lanham, Destin Cretton, Destin Cretton

Elenco: Brie Larson, Naomi Watts, Woody Harrelson, Max Greenfield, Ella Anderson, Sarah Snook, Olivia Kate Rice, Dominic Bogart, Shree Crooks, Charlie Shotwell, Sadie Sink, Alanna Bale, Joe Pingue, Iain Armitage, Andrew Shaver, Nathaly Thibault, Brigette Lundy-Paine, Kyra Harper, Chandler Head, Hamza Haq, Kenny Wong, Chris Gillett, Josh Caras, Darrin Baker, Tyrone Benskin, Sabrina Campilii, Philippe Hartmann, Samantha Hodhod, Tessa Mossey, Eden Grace Redfield, Sarah Camacho, Charlie Stowell, Charlie Guyon, Noemie Guyon

Onde assistir:
Oferecido por

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Ao continuar navegando, declaro que estou ciente e concordo com a nossa Política de Privacidade bem como manifesto o consentimento quanto ao fornecimento e tratamento dos dados e cookies para as finalidades ali constantes.