Filmes

Entrevista

Sand Castle | Filme sobre o Iraque "me fez pensar no Brasil de hoje", diz diretor

Fernando Coimbra fala ao Omelete sobre o longa com Henry Cavill

29.11.2016, às 22H46.
Atualizada em 29.11.2016, ÀS 23H07

Falta pouco para sair do papel o primeiro filme em língua inglesa de Fernando Coimbra, diretor aclamado por O Lobo Atrás da Porta (2013), sair do papel. Rodado na Jordânia ao longo de seis semanas, já montado, Sand Castle está passando pelos últimos retoques de finalização, e mostra a visão de Coimbra para a Guerra do Iraque. Ao Omelete, ele diz o que aprendeu sobre a ética militar dos americanos na produção estrelada por Henry Cavill e Nicholas Hoult, e traça paralelos do intervencionismo com o que acontece no Brasil hoje.

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A trama se ambienta no Iraque em 2003. Após a bem sucedida primeira invasão por terra de Bagdá, um pelotão de soldados americanos é enviado a Baquba, na província de Diyala, para resolver um problema na estação de água da cidade, provocado pelos próprios representantes dos EUA no país. A missão, que parecia simples, acaba se revelando um pesadelo. Coimbra, que dirigiu episódios da série Narcos para a Netflix, volta a trabalhar com o serviço de streaming, que comprou os direitos de Sand Castle já no meio do processo de montagem.

Na entrevista a seguir, Coimbra explica sua abordagem para a realidade do Iraque e para os trâmites militares da América pelo mundo afora.

Como foi a experiência de filmar na Jordânia, em inglês, dirigindo um elenco multinacional a partir de uma temática espinhosa: a ocupação do Iraque? 

Fernando Coimbra: Foi uma grande experiência. Parte da minha decisão de fazer esse filme veio da vontade de viver essa experiência. De forma geral, acho que foi incrível. É obvio que teve suas dificuldades, sobretudo por ter levado minha família pra viver no Oriente Médio por quase quatro meses. Trabalhar com um elenco multinacional é sempre uma experiência muito rica. Assim como em Narcos, onde tive o luxo de poder trabalhar com grandes talentos da América Latina, em Sand Castle eu pude trabalhar com atores supertalentosos do Reino Unido, Estados Unidos, Egito, Irã e Palestina. Trabalhei também com figurantes iraquianos. Fiz questão de ter iraquianos de verdade no filme. Acho que foi muito importante pro resultado final ter ao meu lado consultores militares americanos dando seu ponto de vista tanto quanto os jordanianos e iraquianos também. E é isso que o filme se propõe, olhar os dois lados de forma igual.

Como foi a troca com Nicholas Hoult e Henry Cavill?

Coimbra: Não podia ser melhor. O Nick Hoult já estava envolvido no projeto antes de mim. Como protagonista, ele queria ir a fundo nessa história e nesse personagem. A gente teve uma colaboração muito forte e intensa. O Cavill, desde que leu o roteiro, queria muito fazer o filme e isso é um fator fundamental. Mesmo estando envolvido na franquia milionária do Superman, ele queria fazer esse filme independente, que mostraria uma faceta diferente dele. Nós mudamos o visual dele completamente. Ele está quase irreconhecível. Cavill é um cara muito simples e humilde. É muito fácil de trabalhar.

Que abordagem o filme faz para o intervencionismo militar dos EUA mundo afora? 

Coimbra: O filme não é nem um pouco americanista. A visão da guerra que eu trabalhei não é de heróis, de glórias e grandes feitos. O filme é visto sob a perspectiva do soldado enquanto indivíduo para mostrar como, ao longo da guerra, aquilo tudo vai se tornado mais absurdo e sem sentido pra ele. E os conceitos de liberdade e democracia que ele trouxe dos EUA mudam uma vez que ele encontra iraquianos civis e tem a oportunidade de ter uma mínima troca com eles.

O que o filme te ensinou sobre a ética militar?

Coimbra: Existem duas éticas militares. Há a do baixo escalão, que tenta ser a mais correta possível (o que não ocorre sempre) e existe a do alto escalão, no qual residem os interesses reais de uma guerra, que são de ordem econômica e geopolítica. O que eles vendem aos soldados é a ideia de que estes vão levar liberdade e democracia para um país que vive sob um regime opressor. O que está por trás disso é a desestabilização daquele país e a entrega de sua economia a corporações privadas internacionais. O que aconteceu nessa guerra é que a maioria dos soldados voltou pra casa com um tilte na cabeça, porque as suas motivações não batiam com as motivações reais da guerra. Estudando isso, comecei a entender melhor o que está acontecendo no Brasil agora. É o mesmo processo de intervencionismo, mas sem a guerra, assim como ocorreu no Egito. O governo Obama aprimorou a política intervencionista de forma a gastar menos dinheiro com a máquina da guerra e ter o mesmo resultado.

Como ficam seus projetos brasileiros? Há algo mais na Netflix por vir?

Coimbra: Na Netflix agora só tem o próprio Sand Castle. Estamos captando recursos para rodar Os Enforcados no segundo semestre do ano que vem. A Gullane, que produziu Lobo Atrás da Porta, está no projeto. Também estou desenvolvendo com a Academia de Filmes um longa sobre a prisão do Juan Carlos Abadia no Brasil.

Sand Castle estreia em 2017, ainda sem data definida.

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