É inevitável assistir aos dois primeiros episódios de And Just Like That, o retorno de Sex and the City, e não sentir um certo estranhamento, seja na forma ou no conteúdo. O revival comandado por Michael Patrick King, nome por trás de boa parte da série original, adotou episódios mais longos, com mais de 40 min, e optou por dar às agora três amigas uma história mais dramática -- que, pelo menos neste início, ainda está tentando encontrar seu lugar.
Há um alento em reencontrar Carrie (Sarah Jessica Parker), Miranda (Cynthia Nixon) e Charlotte (Kristin Davis), agora com mais de 50 anos, mas ainda inseparáveis e se reunindo para o brunch -- com a exceção notável, claro, de Samantha (Kim Cattrall), cuja ausência é explicada logo no começo. Mas, como esperado, muito mudou: Miranda agora tem surpresas desagradáveis com o filho adolescente; Charlotte é uma mãe ativa no conselho da escola das suas filhas; e Carrie participa de um podcast, mas não se sente muito confortável em falar de temas mais picantes.
O espaço dado a essas questões mais banais do cotidiano, no entanto, sai de cena com uma forte reviravolta logo no primeiro episódio, que muda abruptamente o tom da produção. A reviravolta em si acaba soando gratuita, especialmente dado o pouco contexto prévio que é reservado a um personagem-chave dela. O acontecimento, nessa reta inicial, acaba servindo mais como escada para tratar de um tema específico.
É necessário reconhecer que, no segundo episódio, as consequências do plot twist são bem trabalhadas, abrindo caminho para momentos de emoção genuína que unem as protagonistas e suas famílias. Porém, o texto de King se atrapalha ao tentar conciliar o drama com as pitadas cômica que deram, por tanto tempo, o tom de Sex and the City. E nesse aspecto, em especial, o humor ácido de Samantha faz (muita) falta.
And Just Like That também anda na corda bamba ao se referir a questões atuais relacionadas a representatividade -- um tema sensível, já que a série original foi criticada por seu elenco predominantemente branco. Miranda, por exemplo, tem diálogos constrangedores e nada naturais com Nya (Karen Pittman), uma mulher negra que é sua professora em um mestrado sobre direitos humanos.
A escalação de Pittman e de Sara Ramirez (a Callie de Grey’s Anatomy), porém, mostra-se um acerto. Ramirez, em particular, rouba a cena como Che Diaz, personagem não-binária que apresenta o podcast do qual Carrie participa, e entrega alguns dos melhores momentos cômicos dessa reta inicial. Resta ver se será dado o espaço a elas para que se desenvolvam como personagens complexas.
Neste início, o que And Just Like That provoca pode ser descrito como uma mistura de sentimentos. É uma experiência muito diferente daquela proporcionada Sex and the City, embora alguns elementos ainda estejam aqui para dialogar com a série original. Não que seja um problema mudar, mas a transformação precisa ser genuína. Do contrário, o revival se arrisca a ficar perpetuamente em um “nem lá, nem cá” capaz de alienar até os fãs de longa-data.
And Just Like That é exibida semanalmente pela HBO Max.