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Mais ação, menos piada: Invasão Secreta leva desconfiança da Guerra Fria ao MCU

Lançando mão de artifícios das histórias de espionagem, série não perde tempo para estabelecer riscos e dilemas de seus protagonistas

Omelete
4 min de leitura
21.06.2023, às 06H00.
Atualizada em 21.06.2023, ÀS 17H43

Está posto, logo na primeira cena, que Invasão Secreta não é uma produção convencional do MCU. Por mais que em tela estejam conceitos, rostos e até artifícios familiares, há uma clara sensação de novidade. Os mocinhos pela primeira vez em muito tempo têm bons motivos para se esgueirarem pelas sombras. A confiança que construíram ao longo de décadas, lutando lado a lado, está fragilizada. Até a escuridão dessa vez não é uma artimanha para disfarçar cenários construídos na base do CGI. Ela é bem-vinda, já que a nova ameaça contra a humanidade age sorrateiramente diante dos olhos de todos, inclusive dos heróis que restaram. O máximo que se reconhece aqui é a boa e velha pretensão de grandiosidade — mas, dessa vez, era inevitável: a ameaça silenciosa dos Skrulls de tomar a Terra para si é, por essência, global.

Bastam cinco minutos para que esse tom soturno, há muito ausente do universo cinematográfico, convença o espectador da gravidade do que está em jogo. Trata-se, primeiro, de um contraponto claro à inocência com que os alienígenas foram representados em Capitã Marvel, revelando que há mais nuance ao que Carol Danvers (Brie Larson) e Nick Fury (Samuel L. Jackson) sabem sobre a guerra entre Krees e Skrulls — e, portanto, toda uma área cinzenta a ser explorada. Mas, mais importante ainda, a sequência estabelece de bate-pronto o peso devido à situação. Não há piada que minimize ou alivie a tensão, nem solução aparente que vá resultar em um final feliz sem sacrifícios. Quer dizer, a paranoia a respeito de metamorfos reptilianos assumindo a identidade de figuras importantes não apenas é real, como é justificada e recomendada. E não há muita esperança de que Fury e companhia possam freá-los.

A desconfiança se torna, nesse contexto, o maior trunfo de Invasão Secreta. Em um mundo em que não há garantia de que ninguém seja quem diz ser, o público não tem outra escolha a não ser duvidar das pessoas e de suas intenções, mesmo que até esse ponto do MCU eles tenham provado sua lealdade. A série se aproveita disso e preenche sua trama com elementos clássicos das histórias de espionagem. Porque, ainda que esta seja uma história sobre uma invasão alienígena — ou seja, o fantástico é uma de suas facetas —, no fundo seus personagens lidam com disfarces, agentes duplos e mentiras, seja para negociações em um nível pessoal, seja para fins diplomáticos. Em outras palavras, Invasão Secreta recria o clima da Guerra Fria lançando mão dos moldes da Casa das Ideias e deixa o espectador na beira do sofá. Espantado senão pela mudança de tom, pela sua maturidade — muito embora, valha dizer, sua abordagem geopolítica seja mais escrachada e infantil.

Essa “criancice” é proposital, na medida que combater a Invasão Secreta também passa por administrar egos de todos os tamanhos, a começar por Fury encarando sua perda de relevância. Mas há vezes em que a produção perde a mão e o exagero depõe contra, como é o caso de uma ou outra escalada repentina de dramaticidade. Mesmo no quesito ação, no geral intensa, impactante e dolorida, há momentos em que o efeito prático fica tosco, mais semelhante aos clássicos dos Trapalhões do que propriamente se espera de uma aventura tão perigosa.

Não que isso seja indício de que o CGI seria melhor. Pelo contrário: parte da razão para que os combates sejam carregados e, consequentemente, importantes para a caracterização do seriado enquanto conto de espionagem passa por permitir uma injeção de realismo, com perseguições a pé, luta corpo a corpo e trocas de tiros. A mesma lógica se aplica à veemência de algumas discussões. A questão, no caso, é a inconstância, algo que pode ser suavizado com os próximos episódios — ou simplesmente ficar mais aparente. De todo modo, só o tempo dirá.

Por enquanto, Invasão Secreta tem um início sólido e promete balançar de verdade os alicerces dos velhos conhecidos dos fãs, assim como introduzir novos favoritos — em particular a doce agente Sonya Falsworth (Olivia Colman), que não só bate de frente com Fury, como é capaz de torturar alguém com um sorriso no rosto.

Invasão Secreta é exibida às quartas, no Disney+.

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