Desde os seus primeiros minutos, Arquivo 81 é uma experiência muito envolvente. A nova produção de terror da Netflix é adaptada de um podcast, e não nega as origens: há nela um cuidado óbvio com a ambientação, inclusive no aspecto sonoro da obra, e também um impulso típico de conduzir a história de forma que poderia ser entendida quase toda através de diálogos e ruídos, sem perder a verossimilhança (leia-se: sem parecer que os personagens estão explicando as coisas para nós). O resultado é um produto de televisão curioso e hipnotizante.
Logo fica claro, no entanto, que a série não se acanha de lançar mão não de um, mas de todos os truques narrativos típicos do terror para segurar a nossa atenção. Óbvio que o formato found footage é um deles, embedado na própria premissa da série: Dan (Mamoudou Athie), um restaurador de filmes e fitas antigas ou danificadas, é contratado por um bilionário (Martin Donovan) para dar nova vida à coleção de filmagens de Melody (Dina Shihabi), que morreu em um incêndio no prédio conhecido como The Visser, em Nova York, em 1994. Durante os oito capítulos da série, descobrimos os segredos sombrios do edifício ao lado de Melody, e portanto de Dan, através do conteúdo capturado em sua câmera.
Se a experiência de assistir a alguém assistindo a alguém viver uma história de terror parece entediante para você, não se preocupe: a roteirista Rebecca Sonnenshine (The Vampire Diaries, The Boys), que adaptou o podcast para a TV, tratou de encher a história de Dan de reviravoltas, sustos e explorações de traumas passados, colocando-o no centro da trama e evitando que ele se tornasse um espectador passivo ou, na melhor das hipóteses, uma figura detetivesca sem personalidade. E a Netflix tratou de contratar um verdadeiro timaço de diretores para se certificar que nós, também, nos sentíssemos dentro desse universo.
Rebecca Thomas (A Fita Azul, Stranger Things), Haifaa Al-Mansour (Mary Shelley) e a dupla Justin Benson & Aaron Moorhead (Primavera, Synchronic) formam uma equipe coesa, mas que não deixa de aplicar um pouquinho de suas próprias personalidades aos episódios. Basta ver como a direção de Benson & Moorhead (no centro da série, episódios 3 e 4) traz um senso claustrofóbico à jornada de Melody pelo Visser, com cortes rápidos que servem para sublinhar a simbologia oculta bem resolvida da série; como Al-Mansour (que assina os episódios 5 e 6) centra os aspectos emocionais da história com sua condução mais sóbria; e como Thomas (diretora dos 4 capítulos restantes) abre e fecha a temporada modulando os aspectos mais kitsch e absurdos da trama para que não pareçam bobos demais para o tom geral da série.
No fim das contas, são eles que fazem de Arquivo 81 a experiência quase irresistível que é, porque a showrunner Sonnenshine e sua equipe de roteiristas tropeçam no mais importante em qualquer história de terror (ou de qualquer gênero, na verdade): casar suas peripécias estéticas com uma história que as justifique. Narrativamente, a série brilha somente nos momentos em que consegue conectar seus personagens a um senso de perda muito forte, e propor que o interesse deles no ocultismo, na conjuração do seu tão desejado “outro mundo”, nasce de uma experiência trágica neste mundo de cá, onde estamos todos presos.
Mas todos esses momentos são muito fugazes, quase como se ninguém envolvido na produção estivesse tão interessado neles, e nem quisesse que nós, espectadores, nos demorassemos muito nessa reflexão. Isso deixa o elenco à deriva, é claro, mas decepciona ainda mais por outro motivo: por toda simpatia e atenção que elicita, Arquivo 81 poderia ter arrancado níveis iguais de emoção daqueles que seduz.
Criado por: Rebecca Sonnenshine
Duração: 1 temporada