Lovecraft Country, série criada por Misha Green com base no livro Território Lovecraft de Matt Ruff, é o principal lançamento da HBO para o mês de agosto. Produzida por Jordan Peele e J.J. Abrams, a série mistura elementos do terror cósmico de H.P. Lovecraft com a dura realidade de um Estados Unidos segregacionista dos anos 1950 para construir uma trama assustadora.
Confira abaixo as principais referências históricas da série:
Jackie Robinson
A bela cena de abertura da série narra um pesadelo de guerra do protagonista Atticus Turner (Jonathan Majors). Pouco antes de colocar o rapaz contra monstros das histórias de horror e da ficção científica, é possível ouvir um áudio retirado de The Jackie Robinson Story, filme que conta a história de Jackie Robinson, o primeiro jogador afro-americano da Major League Baseball na Era Moderna. Pouco após a execução da frase “esta é a história de um menino e seu sonho. Mas mais do que isso, é a história de um menino americano e um sonho que é verdadeiramente americano”, retirada do longa de 1950, o próprio Jackie Robinson aparece e destrói Cthulhu.
Originalmente, os jogadores negros tinham seus próprios clubes e ligas, enquanto que a mais famosa competição do esporte, a Major League, era composta apenas por atletas brancos. Este quadro se manteve até a contratação de Jackie Robinson, pelo Brooklyn Dodgers. Robinson jogou sua primeira partida com o time em 15 de abril de 1947, no campo de Ebbets Field. Na ocasião, compareceram mais de 26 mil pessoas, sendo mais da metade pessoas negras que foram apoiá-lo.
O Livro Verde
Quando volta para casa, Atticus visita seus tios George (Courtney B. Vance) e Hippolyta (Aunjanue Ellis), que trabalham na publicação de um guia de locais seguros para pessoas negras. O livro do casal é uma referência clara ao Livro Verde do Negro Motorista, que realmente existiu na vida real. Publicado entre 1936 e 1966 por Victor Hugo Green, se tratava de um guia para viajantes negros que recomendava postos de gasolina, restaurantes e hotéis seguros e hospitaleiros. Tudo isso durante a era das Leis de Jim Crow. Infelizmente, o livro é atualmente conhecido por emprestar seu título ao péssimo Green Book: O Guia, filme vencedor do Oscar de Melhor Filme em 2019.
Leis de Jim Crow
A história da série se passa na década de 1950, enquanto as leis de Jim Crow ainda estavam em vigor nos Estados Unidos. Criadas para segregar a população afro-americana, elas começaram a surgir após a Guerra Civil e a abolição da escravidão no país, assinada em 1863. A partir desse marco, leis estaduais e locais passaram a ser instituídas para separar negros e brancos em estabelecimentos, escolas, transportes, banheiros e até bebedouros.
As leis Jim Crow foram adotadas principalmente no sul dos Estados Unidos e ficaram vigentes até a aprovação da Lei dos Direitos Civis de 1964, ou seja, mais de um século após o fim da escravidão no país. O nome Jim Crow vem de um personagem de teatro de Thomas D. Rice, criado como representação racista de pessoas afro-americanas e sua cultura.
Denmark Vesey
Quando Atticus está tentando encontrar informações sobre seu pai, ele procura dicas em um bar chamado Denmark Vesey's Bar. O nome do bar é uma homenagem a Denmark Vesey, o homem que planejou a primeira grande revolta de escravos dos Estados Unidos, em 1822. Familiarizado com o movimento abolicionista do Haiti e leitor ávido de obras antiescravistas, Vesey conseguiu comprar sua liberdade por US$ 600 e desde então lutou para que outras pessoas também a conquistassem.
Cidades do pôr-do-sol
O primeiro episódio de Lovecraft Country leva o nome de “Sundown” (pôr-do-sol, em tradução livre), em referência às Cidades do Pôr-do-Sol. Criadas também a partir do período de reconstrução do período que sucedeu a Guerra Civil Norte-Americana, as sundown towns eram cidades ou vilarejos que não permitiam a estadia de negros durante a noite, intimidando a presença de pessoas não brancas por meio da violência, amparadas por leis segregacionistas locais até os anos 1960. No capítulo de estreia da série, Atticus, seu tio George e Letitia (Jurnee Smollett) são ameaçados por um xerife de uma das cidades que tinham essa prática racista.
Debate entre James Baldwin e William F. Buckley
Além de contar com músicas de Etta James e B. B. King, a trilha sonora da série também apresenta um trecho de um discurso do escritor afro-americano James Baldwin durante um debate com o autor conservador William F. Buckley. A conversa foi gravada na Universidade de Cambridge, nos Estados Unidos, em 1965, e buscava responder à questão: “o sonho americano foi alcançado às custas do negro americano?”.
Enquanto Buckley defendia que o sonho americano poderia ser conquistado por todos que estivessem dispostos a persegui-lo, Baldwin usou sua experiência pessoal para apontar como os negros viviam em condições degradantes no país. Ovacionado, Baldwin saiu vencedor do debate, que está disponível na íntegra no YouTube.
Gordon Parks
É fácil apontar como a fotografia dessa série está maravilhosa. Cada frame das cenas caberiam em uma moldura, e isso se reflete muito nas homenagens que a faz a Gordon Parks. Gordon Alexander Roger Buchanan Parks foi diretor de cinema, fotógrafo, músico, poeta, romancista, jornalista e ativista. Ele é famoso no meio cinematográfico por dirigir Shaft, um dos filmes mais representativos do gênero blaxploitation. Lovecraft Country homenageia esse gigante ao levar para as telas algumas de suas mais famosas fotos.
O Conde de Montecristo, de Alexandre Dumas
Ao chegar na casa de seu pai desaparecido, Atticus encontra um exemplar de O Conde de Montecristo, clássico romance escrito por Alexandre Dumas. Conhecido por criar grandes obras como Os Três Mosqueteiros e o próprio Conde, Dumas foi um autor negro que sofreu muito preconceito em vida, mesmo com sua escrita genial, suas enormes posses e sua boa relação com a aristocracia francesa. Além de exaltar a obra de um dos mais importantes romancistas negros, a presença do livro serve para explicar qual tipo de literatura Montrose gosta de consumir, já que ele repreende seu filho por consumir obras que tenham elementos racistas - como é o caso dos contos de horror de H.P. Lovecraft e Edgar Rice Burroughs.