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Rio Heroes aposta em violência crua para contar história de campeonato clandestino de luta livre

Nova produção brasileira da Fox, em parceria com a Mixer e a NBCUniversal, chega para sua estreia tomada de controvérsia

24.02.2018, às 18H02.

Nesse sábado, dia 24 de Fevereiro, chega a TV e ao aplicativo Fox Premium (com toda temporada disponível) a nova produção nacional original da Fox, Rio Heroes, que pretende buscar relevância junto ao mercado apostando em uma controvérsia: a violência. 

Rio Heroes é o nome de um campeonato de luta livre que existiu de verdade entre os anos de 2007 e 2009 e que ficou conhecido por sua natureza extremamente crua e violenta. Esqueçam as pontuações, intervalos, tempos de formação estratégica e qualquer outro privilégio que o sistema de regras de uma luta prevê para manter sua ordem. Segundo o protagonista da história “isso tudo é frescura”. A regra do campeaonato era não ter regras (esse é o slogan da série, inclusive) e essa premissa foi cuidadosamente calculada pelo criador do evento, Jorge Pereira (vivido por Murilo Rosa na ficção).

Explicar Jorge é outro ato de controvérsia. A série começa com o campeão num momento da carreira em que o corpo não tem mais a mesma resistência de antes. Já dando aulas, Jorge acompanha os campões da época com suas vidas abastadas, posando para revistas, ganhando essas lutas cheias de regras que ele, gradativamente, vai passando a desprezar. Depois de perder quase toda a visão de um olho e ser impedido de lutar, ele vai morar em Miami, onde acaba sendo encontrado numa boate por um investidor disposto a bancar a organização de um campeonato onde realmente valha tudo.

Honra

Esse piloto de Rio Heroes tem alguns problemas de emissão. Camila Raffanti (que com Fabio Danesi e Alexandre Soares Silva assina os roteiros) estava presente no evento de lançamento e afirmou – diante da pergunta sobre o nível de violência da série – que aquela é uma obra de ficção que não tem a intenção de falar ideologicamente sobre violência e que “são os erros dos personagens que abrem espaço para a crítica”. Ela continua: "É fascinante explorar esse limite da violência e o que isso desperta nas pessoas. Você está no meio de uma luta e vale tudo, mas como essa energia extrapola para fora do esporte?".

Murilo Rosa foi a escolha certa para o papel. Ele aposta de verdade nas motivações do protagonista, que surge na tela como um profissional frustrado com os rumos burocráticos da luta dentro do cenário mundial. Até aí tudo bem... Ainda que dentro de um esporte sejam as regras que obriguem ao raciocínio estratégico, o excesso delas pode ser enfadonho principalmente para quem luta. O problema é que logo nos primeiros 20 minutos de episódio, Jorge já surge como um homem arrogante, cheio de verdades absolutas, com um estranho senso do que é honra (palavra repetida incessantemente no roteiro) sobretudo ao conectá-la ao enfrentamento com um único contexto: dar porrada (outra palavra repetida exaustivamente, para reforçar que o que ele quer mesmo não é “mimimi”, é sangue). Bater é a filosofia do personagem. E bater sem regras, sem estratégia, sem sem esportividade, é que isso é ter“honra” para ele. Em dado momento, Jorge apaga a luz da sala onde dá aula para seus alunos e eles podem se estapear livremente... Ainda que o trabalho dos roteiristas não tenha nenhum compromisso ideológico, o protagonista tem. E enxergar as “lições” típicas desse tipo de dramaturgia – o que ajuda a justificar a violência – não é muito fácil nesse primeiro momento. É preciso admitir: apesar de falar de honra o tempo todo, a série é completamente amoral.

As escolhas artísticas da direção de Pablo Uranga, contudo, são bastante acertadas. O piloto é cru, sem luxo, com pouquíssima luz, refletindo exatamente o espírito do protagonista. O texto não é um problema enquanto estrutura e sim como emissor de impressões. Ainda que possa ser verdade que os próximos episódios desconstruirão essa “ideologia” de Jorge, o que fica parecendo no piloto é que ele representa o pior tipo de macho-alfa-primitivista, agindo como um galo-de-briga que acha que seus métodos desregrados podem vencer qualquer outro lutador do mundo. E dá-lhe frases perigosas de exaltação ao que existe de pior no ser humano: sua capacidade de ser violento deliberadamente. Nesses tempos em que playboys sarados da classe média espancam pessoas na noite, um produto como Rio Heroes precisa ter muito cuidado para não soar um argumento de defesa dessa natureza por vezes tão nociva. Ficção não tem que ser responsável, mas tem que entender sua responsabilidade.

Há certas doses de humor e coadjuvantes como Rogeirinho (Duda Nagle) ajudam a aliviar o peso dramático das cenas. Sem dúvida, a série deve agradar os fãs de lutas e artes marciais (ainda que “arte” não seja uma palavra que se aplique ao estilo de Jorge), que encontrarão na trama uma voz muito familiar dentro do universo proposto. A roteirista Camila Raffanti concluiu dizendo que "A gente está contando a história de um homem que tem uma paixão pelo que faz, é muito bom no que faz e enfrenta dificuldades para fazer o que faz do jeito que quer. Outra coisa que eu acho importante em relação à dramaturgia é que a dramaturgia questiona e propõe perguntas por meio das falhas dos personagens. A gente não está dizendo o que é certo ou o que é errado. A gente está propondo perguntas".

No ar na Fox Premium e com toda a temporada disponível a partir de hoje, os espectadores poderão ouvir essas perguntas e chegar a suas próprias conclusões. Rio Heroes terá 5 episódios e já tem sua segunda temporada garantida.

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