Quando parecia que os fãs mais puristas de quadrinhos da DC estavam perto de se livrar das adaptações irregulares da CW com o iminente fim do Arrwoverse, a emissora anunciou Gotham Knights, série que retrata uma Gotham logo após o Batman ser morto. Centrado nos quatro jovens suspeitos, mas não culpados, pela morte do Morcego, a produção até finge explorar novos becos escuros da cidade fictícia, mas a verdade é que tudo o que foi mostrado em seus primeiros episódios já foi feito de forma melhor e mais eficiente várias e várias vezes tanto na TV quanto no cinema.
Em Gotham Knights, Duela (Olivia Rose Keegan), Harper (Fallon Smythe) e Cullen (Tyler DiChiara) são pagos por uma pessoa misteriosa para invadir o escritório de Bruce Wayne (David Alexander Miller) e roubar de seu cofre a arma usada para matar os pais do bilionário. Quando chegam lá, descobrem que o empresário foi assassinado e que o assalto foi planejado como forma de acusar o trio e o filho adotivo de Bruce, Turner (Oscar Morgan), que supostamente teria contratado os outros jovens para assassinar seu pai antes que ele o tirasse de seu precioso testamento. Procurados pelas autoridades, o quarteto busca limpar seus nomes, com a ajuda de Stephanie (Anna Lore), da Robin Carrie (Navia Ziraili Robinson) e do promotor Harvey Dent (Misha Collins).
Essa versão alternativa de Gotham até tem elementos curiosos, incluindo a união entre alguns personagens que nunca se encontraram nas páginas e o número impressionantemente baixo de Waynes adotados, mas nenhum deles ajuda Gotham Knights a construir uma identidade própria. Ao invés disso, a série pega algumas das partes mais sem graça de Arrow, Gotham e Batwoman e as embola sem qualquer cuidado, criando uma das produções televisivas de herói mais genéricas dos últimos anos.
Não bastasse ser uma pilha de clichês, Gotham Knights também sofre com um roteiro absurdamente esburacado, que muda a personalidade de absolutamente todos os seus personagens entre um episódio e outro. Bruce, por exemplo, começa sendo retratado como um pai ausente para Turner no piloto, mas descrito pelo próprio e por Carrie como um homem extremamente preocupado com o filho e que fazia de tudo para ficar ao seu lado já no segundo capítulo. Harper, Cullen e Stephanie também ganham e perdem habilidades de combate ao crime (ou à polícia, no caso) de acordo com o que a trama pede deles. Mesmo a ameaça mortal da Corte das Corujas parece perder seu peso depois que o quarteto protagonista consegue fugir de seu principal assassino sem muito esforço.
Mesmo que tentem dar alguma emoção à série, o elenco jovem infelizmente não consegue entregar a Gotham Knights nenhum tipo de carga emocional que justifique qualquer envolvimento por parte do espectador. Presos ao dramalhão quase autoparódico que infesta a maior parte das produções da CW, os atores pouco fazem além de trocar olhares desesperados e proferir diálogos que claramente foram escritos por pessoas que não fazem ideia de como adolescentes atuais conversam.
Há, no entanto, duas exceções. Vivendo a filha do Coringa, Keegan consegue ao menos dar um pouco de humor ao seu personagem, mesmo que, pelo menos até aqui, ela não tenha mostrado a loucura característica da anti-heroína. Caso conte com a boa vontade dos roteiristas, a atriz pode facilmente transformar Duela no principal rosto de Gotham Knights. Já Collins, veterano de CW, entende um pouco melhor como elevar o roteiro precário que lhe foi entregue e transforma o futuro Duas-Caras em uma das únicas figuras cativantes da produção.
Apesar de todos esses problemas, Gotham Knights é melhor do que suas prévias e mesmo este texto fazem parecer. Assim como todas as histórias de realidades paralelas que vemos há décadas nos gibis, a série tem pontos interessantes que dão um belo potencial de evolução para produção.
Por mais que tenha sua força amenizada pelas trapalhadas do Garra, a Corte das Corujas ainda é uma ameaça intrigante para os protagonistas. Saber que a sociedade secreta conseguiu se infiltrar na Família Wayne e em praticamente todos os círculos políticos de Gotham torna o suspense central de Gotham Knights interessante o bastante para atiçar a curiosidade de seu público.
Outro grande atrativo da série está em sua proposta de repaginar personagens menos conhecidos dos quadrinhos como forma de apresentá-los a um novo público. Menos populares que outros membros da batfamília, Stephanie, Harper, Cullen e Duela têm sua primeira grande chance de brilhar no live-action e dão aos showrunners Natalie Abrams, James Stoteraux e Chad Fiveash oportunidade para equilibrar pontos-chave dos gibis com mudanças que tornem essas versões únicas.
Muito querida entre fãs do Batman desde que estreou n’O Cavaleiro das Trevas de Frank Miller, Carrie Kelley é outra personagem que, enfim, faz sua grande estreia diante do grande público. Mesmo que levemente diferente de sua contraparte impressa, a Robin ainda mantém as características que a transformaram em uma adorada heroína e uma necessária aliada do Homem-Morcego. Pela primeira vez desde 1986, a jovem vigilante aparece em um live-action como algo além de um easter egg aleatório para se tornar uma substituta em potencial para Bruce e uma guia inesperada para Turner.
Com um início nada encorajador, Gotham Knights ao menos supera um pouco as expectativas nada positivas do público. A série tem pontos positivos o suficiente para merecer uma primeira chance. Agora resta esperar para ver se essa boa-vontade será recompensada ao fim da temporada de estreia.