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Crítica

Crítica: Borat

Enfim estréia no Brasil a melhor comédia de 2006

22.02.2007, às 00H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H22

Ainda que não tenha visto nenhum dos esquetes de Borat que se multiplicaram na web em 2006, é muito provável que você conheça, nem que seja de ouvir falar, o personagem do comediante Sacha Baron Cohen. O repórter do Cazaquistão que viaja pela Inglaterra e pelos EUA atrás de intercâmbio cultural já se tornou ícone da cultura pop. Mas vamos evitar a redundância e deixar de lado a unanimidade para começar a falar do filme, Borat: O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América (2006).

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A melhor comédia do ano passado (com a estréia tardia, a melhor de 2007 no Brasil) surge como uma revolução no gênero não só por sua aberta incorreção política, nem só por conta do talento de Cohen para se manter dentro do personagem, sem se abalar, enquanto expõe à câmera os preconceitos alheios. Borat é um divisor de águas porque consegue encaixar na linguagem do cinema, terreno da mise-en-scène, uma característica que só víamos nas suas pegadinhas da televisão, a entrega ao acaso.

São, pra começo de conversa, dois denominadores inconciliáveis: a encenação pressupõe direção, controle, enquanto a aventura do esquete só funciona apostando no incerto, na liberdade dentro da "cena". O truque de Cohen - e do diretor do filme, Larry Charles - é mascarar os pontos de contato dos dois extremos. Em forma de pergunta: onde termina o improviso e começa a mise-en-scène em Borat?

No seu programa de TV, Da Ali G Show, depois de uma excursão de reportagens pela Inglaterra, Cohen encontrou nos Estados Unidos a mina de ouro para a proposta de Borat. No país do politicamente correto, o comediante fazia comentários anti-semitas e homofóbicos, em tom de folclore do Leste Europeu, e acabava arrancando dos seus entrevistados declarações que revelavam o próprio antisemitismo e a homofobia entranhados nos EUA. A princípio, o que o filme pretende é encadear esse humor-de-constrangimento em longa-metragem.

Para tanto, exige-se uma premissa, um moto dramático. A solução encontrada foi Baywatch. Recém-chegado aos EUA, Borat assiste na TV a uma das reprises da série de Malibu e se apaixona por Pamela Anderson. "Paméla", o novo amor de sua vida, está na Costa Oeste, então Borat cruzará o país atrás dela. No caminho, desempenhará seus números-entrevistas. Essa é a justificativa do filme, rasa e frouxa o suficiente para levar a metragem adiante.

A coisa começa a ficar interessante - e aí a direção de cena e o acaso começam a se confundir - quando as situações que surgem na viagem passam a servir não só como piada, mas como elemento dramático. O exemplo maior é o culto evangélico: uma cena que evidentemente foi pensada, em sua origem, como esquete independente, passa a fazer parte de uma construção ficcional maior. Em entrevista à Rolling Stone, Cohen disse que o material bruto de filmagem chegava a 50 horas. É um segredo de decupagem, portanto, conseguir formatar os esquetes numa estrutura de ficção.

Mas daí vem a pergunta, novamente: já que tudo isso está servindo a uma "proto-mise-en-scène", o imprevisto deixa de ser imprevisto? Dá para perceber que deixa - pelo menos nos momentos de fragilidade da montagem. É evidente, no contracampo, que as meninas que se assustam com o urso no caminhão de Borat foram dirigidas: quando gritam para a câmera elas não estão diante do urso de verdade. A cena da liquidação de garagem é semelhante. A câmera já estava postada no jardim quando o caminhão de Borat se aproxima. Será que aquilo não foi combinado para que o personagem encaixasse sua clássica piada de cigano?

Quanto mais somos absorvidos pelo lado ficcional, mais desconfiamos da espontaneidade documental. A magia de Borat é nos enganar com essa linguagem híbrida. Não digo isso para desqualificar o filme, pelo contrário. Uma piada não deixa de ser engraçada porque foi ensaiada.

Nota do Crítico
Excelente!