Os filmes de assassino estão entre os mais saturados em Hollywood. A essa altura, todo grande astro já deve ter interpretado um matador profissional que se apaixona em serviço, que não consegue se aposentar, que é traído pelos colegas. A moda hoje, na era pós-Bourne, é fazer dessa premissa uma comédia ou um romance suburbano, mas Um Homem Misterioso (The American, 2010) pega a rota contrária.
the american
um homem misterioso
george clooney
Devolver a esse subgênero o que ele tem de essencial parece ser a intenção do diretor Anton Corbijn (Control). O primeiro plano - a câmera parada diante de uma cabana no meio da neve sueca, captando um foco pequeno de luz lá dentro - já sugere que o único refúgio possível para um persongem assim, cercado pela frieza, é a companhia aquecedora de uma mulher. Envolver-se emocionalmente é o eterno tormento de todo assassino, e com Jack (George Clooney) não é diferente.
O roteiro inspirado no romance de Martin Booth A Very Private Gentleman, adaptado por Rowan Joffe, realoca Jack para a Itália, onde no pequeno vilarejo de Castel del Monte ele aguarda o seu próximo serviço, enquanto tenta descobrir o responsável pelo incidente que o forçou a deixar a Suécia. Ali Jack é O Americano do título, um tipo silencioso que evita se misturar com os italianos. Mas você já sabe como são belas e passionais as italianas...
Em seu segundo longa-metragem de ficção, o fotógrafo holandês Corbijn traz para Um Homem Misterioso o seu apreço pela imagem. Capturar a verdade de um personagem em seus gestos, entender uma situação com uma troca de olhares, é isso que o diretor procura, sem pressa. Os filmes de matador já são elegantes por natureza, com seus diálogos breves e seus heróis cheios de métodos e rigores, mas às vezes falta essa sensibilidade "europeia" que Hollywood importa de cineastas do Velho Mundo.
Com Corbijn, o filme se permite momentos que a indústria raramente vê, como a cena em que Jack, o homem que não deixa impressões digitais, se entrega a um cunnilingus na prostituta italiana. De modo geral, as cenas com mulheres são as melhores. O flerte do sexo e da morte, outra característica essencial do bom filme de assassino, é o ponto forte de Um Homem Misterioso, com suas femme fatales de saias transparentes e seus silenciadores fálicos.
Seria um filme melhor se essa sensibilidade europeia não se traduzisse, de resto, numa obrigação de transformar tudo em simbolismo (borboleta não dá) e de levar as boas ideias à exaustão ("Tu Vuò Fa L'americano" tocando no rádio). Nessas horas, dá a impressão - como já dava em Control - de que Corbijn, apesar do bom olho para ambientações, é cineasta de uma nota só. Se ele vai se tornar só um executor das encomendas "de arte" hollywoodianas, veremos em breve.