Há conforto nos relatos de sobrevivência. Quando tudo parecia perdido, alguém superou as adversidades, tornou possível o impossível. É uma boa justificativa para fé, para acreditar que, no final, tudo vai ficar bem. O mesmo alívio acompanha as histórias de amor. Testemunhar o afeto genuíno entre duas pessoas aquece corações pela prova de cumplicidade humana. Não é preciso passar por tudo sozinho.
Depois Daquela Montanha (The Mountain Between Us), adaptação do romance de Charles Martin, une essas duas fontes de bem-estar existencial. É uma história de sobrevivência - o cirurgião Ben Bass (Idris Elba) e a fotojornalista Alex Martin (Kate Winslet) sofrem um acidente de avião e ficam presos em uma região montanhosa sem contato com a civilização - e uma história de amor - na superação de cada dificuldade os dois se aproximam. Porém, apesar de captar bem o peso da paisagem para a trama, com tomadas amplas que refletem o desamparo dos sobreviventes, minúsculos comparados à natureza, o diretor israelense Hany Abu-Assad se deixa levar por praticamente todos os clichês dos dois gêneros.
O exagero com que intercala desgraças e soluções vai aos poucos transformando a intensidade pretendida em uma comédia involuntária. Não há verossimilhança para sustentar o drama de Ben e Alex, o que torna a sua história de amor uma construção mecânica dentro filme. Elba e Winslet salvam o que podem, dando consistência a cenas simples para explicar como um romance pode florescer em condições inóspitas. Todas as etapas de um relacionamento são condensadas até que se chegue ao que realmente importa: compreensão e completude.
É possível consumir essa "água com açúcar" de Depois Daquela Montanha sem questioná-la. Suas situações descaradas (incluindo o cachorro que sobrevive ileso ao acidente e sai com alguns arranhões da luta com um puma) são aceitas facilmente na busca pelo amparo duplo de um romance-catástrofe. A exuberância visual, a trilha de Ramin Djawadi (de Game of Thrones e Westworld) e a competência dos protagonistas também ajudam na hora de ser “enganado” pelo filme. A conclusão, porém, é de uma paródia, não de um drama romântico, pondo em jogo toda suspensão de descrença.
Um filme que exige tanta boa vontade do espectador está longe de ser o conforto pretendido por quem busca uma história de superação ou um romance meloso. É uma história que acaba se tornando um problema, que precisa ser defendida, mas que não justifica o esforço.