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Filme de 1988, Quero ser grande (Big, de Penny Marshall) é um símbolo da juventude oitentista. Ficou gravada no imaginário popular a cena em que o espírito infantil de David Moscow, dentro do corpo de Tom Hanks, dança nas teclas gigantes do piano da loja de brinquedos. Eram os tempos niilistas da chamada "década perdida", e não havia nada mais otimista do que louvar a pureza que sobrevivia na mente e no coração daquele adulto.
O tempo passa, mas o tema não desbota. Pelo contrário, com o gradual juvenescimento do seu público-alvo nos últimos anos, Hollywood ainda tende a trabalhá-lo bastante. Com uma inversão: a idéia agora não é mostrar que adultos podem ser jovens de alma, mas que jovens podem ter responsabilidades de adultos. Tratar infantes como gente crescida traz dividendos, como provam os recentes Sexta-feira muito louca (Freaky friday, de Mark S. Waters, 2003) e De repente 30 (13 Going On 30, de Gary Winick, 2004), a versão feminina de Quero ser grande.
No dia do seu aniversário de treze anos, Jenna (Christa B. Allen) monta um esquema infalível para a festa. Convida todas as meninas populares para, assim, atrair também os bonitinhos do colégio. O nerd Matt (Sean Marquette) não aprova a idéia, mas fica quieto para não desagradar a melhor amiga. Quando tudo sai errado, Matt tenta ajudá-la, mas Jenna está inconsolável trancada no armário. Infeliz com a festa, com as amigas, com o próprio corpo, Jenna só deseja que chegue logo aos trinta anos, uma época da vida em que, como diz a revista Pose, as mulheres se realizam.
Sai a máquina de desejos do parque de 1988 e entra um brilhante pó mágico, que faz Jenna acordar no corpo alto, magro e elegante de Jennifer Garner (Demolidor, Alias). O susto é sucedido pelo deslumbramento, mas logo Jenna descobre que tem missões a cumprir. Agora, como poderosa editora da Pose, ela precisa reformular a publicação para vencer a concorrência. E mais. Precisa mostrar ao novo Matt (Mark Ruffalo) que ainda é digna da amizade. Não será nada fácil, já que a Jenna adulta, que cresceu amargurada, tem fama de metida, desleal, lasciva, mandona, briguenta...
O deslize mais grave do filme - o fato da infantilização se abater não apenas sobre Jenna, mas também sobre o comportamento de outros personagens - não estraga o resultado. De repente 30 não foge do sentimentalismo padrão, é verdade, mas transmite a sua mensagem com graça. Como antítese do amadurecimento masculino, ensina as meninas a terem mais auto-estima e menos confiança nos ensaios das revistas de moda. Exemplar.
Aliás, se o resultado é honesto e até recomendável, isso mostra que o diretor Winick assistiu com atenção a Quero ser grande. Jennifer atua sem vergonha do ridículo, com a mesma energia que tomou Hanks. São idênticas as reuniões de trabalho em que a espontaneidade pueril revoluciona a rotina empresarial. Soube-se criar até uma sequência sinérgica como a do piano. Aqui, a moça comanda a coreografia dos mortos-vivos de Thriller, com direito a participação especial e empolgada de Andy "Gollum" Serkis, no papel do patrão de Jenna. Vale o ingresso. Principalmente para os que viveram os anos 1980 das polainas, blusas rosa-choque e de quando Madonna cantava como uma virgem.