Chris Pine em O Cara da Piscina (Reprodução)

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Crítica

Adorável e capenga, O Cara da Piscina não quer a aprovação de ninguém

Chris Pine estreia na direção com comédia noir personalíssima - e incompetente

09.09.2024, às 13H18.

O Cara da Piscina é exatamente o filme que Chris Pine queria que fosse. De fato, o astro confessou em entrevista recente que reviu o seu longa de estreia na direção alguns meses depois das críticas abismais que se seguiram à estreia no Festival de Toronto 2023, descrevendo a experiência da seguinte forma: “Depois dos reviews, eu fiquei pensando: ‘Talvez eu tenha mesmo feito um monte de m*rda’. Então voltei a assistir ao filme, e quer saber? Eu ainda o amo pra c*ralho”. E talvez seja daí mesmo que vem o pouco charme do filme: sua capenguice, sua incompetência narrativa e referencial, seus tiros no escuro para construir uma homenagem/sátira/atualização do noir ensolarado ambientado nas beiradas carcomidas de Hollywood, nas periferias de Los Angeles… tudo faz parte do conceito.

O conceito, no caso, é um passeio vagaroso e irritantemente liminar (quase engraçado, quase trágico, quase profundo) pela mente de Pine, um artista muito mais interessado na brincadeira de contar histórias do que no ofício de fazê-lo. É um choque de conceito e realidade que forma também a crúcis do protagonista, Darren, um limpador de piscinas que se vê investigando um mistério envolvendo o chefe da câmara dos deputados (Stephen Tobolowsky, de longe a melhor coisa do filme) e uma dupla de magnatas com interesses conflitantes. Darren gosta muito da ideia de ter uma namorada (Jennifer Jason Leigh), da ideia de ser um justiceiro contemporâneo, da ideia de desvendar os malfeitos que afundam sua amada L.A. - mas, na condição terminal de menino-homem que nunca cresceu, ele fraqueja sempre que ganha a oportunidade de realmente fazer qualquer uma dessas coisas.

Nesse estado de não-comprometimento eterno, é claro que o mundo contemporâneo o ultrapassa e o utiliza para chegar a fins escusos. O roteiro assinado por Pine e Ian Gotler (Ad Lucem) lamenta essa condição de Darren, mas ao mesmo tempo não deixa de indiciar a imaturidade do personagem e como ela machuca aqueles ao seu redor. É um texto que, ao menos, tem a qualidade de entender com alguma clareza as suas criações - mas não clareza o bastante, ao que parece, para evitar cometer os mesmos erros que elas. Porque, se O Cara da Piscina não funciona na evocação de todos os chavões de gênero em que toca, base de toda a graça que tenta fazer, de todo o clima que tenta criar, é por não se comprometer com ela.

A pobre DeWanda Wise, que interpreta a proverbial femme fatale da história, é emblemática desse revés do filme. Enfiada em figurinos coloridos deslumbrantes, ela sofre com uma personagem que hora se mostra consciente do próprio pastiche (em uma boa cena, ela e Darren conversam sobre quais atores de noir clássicos estão tentando imitar em seus looks), hora adere a ele sem nem sombra de sorrisinho cínico, hora o subverte para os tempos modernos… feitos ao mesmo tempo, no mesmo filme, todos esses movimentos se anulam. O mesmo vale para os toques de surrealismo e acenos ao camp que Pine teima em inserir aqui e ali - os sonhos proféticos recorrentes do protagonista, as pausas pontuais para os coadjuvantes declamar poesia, um personagem que revela fazer parte de um show de drag queens inspirado em Super Gatas, e por aí vai.

O Cara da Piscina chega ao espectador, enfim, em um estado eterno de “nem aqui, nem ali”, o que não deixa de ser curioso para uma obra que parece tão definitivamente fincada na sensibilidade do homem que a criou, representativa de tal forma dessa sensibilidade que ele se sente seguro dela mesmo diante da desaprovação do público. E há algum charme nessa indiferença privilegiada, confiante, de quem não precisa buscar aprovação - a dissonância que existe no longa pode ser vista como evidência da integridade de Pine, da sua segurança como cineasta. Por outro lado, pode também ser interpretada como prova cabal de sua inaptidão para a função: de que vale um diretor-roteirista tão certo de sua visão, se ele é incapaz de nos convencer a embarcar nela ao seu lado?

Nota do Crítico
Regular