A questão moral norteia a maioria dos filmes de J.C. Chandor desde sua estreia na direção com Margin Call, e de um longa a outro ele experimenta gêneros diferentes sem perder de vista que seus personagens se definem por seus atos. O caso de Operação Fronteira não é tão distinto de Margin Call nesse sentido; são narrativas movidas pelo agir e essa ação é indissociável de seu caráter moral.
Aqui a escolha é uma mistura de trama de black ops com filme de assalto. Oscar Isaac faz um operativo americano que reúne seus antigos companheiros de exército (vividos por Ben Affleck, Charlie Hunnam, Garrett Hedlund e Pedro Pascal) para matar um chefão do narcotráfico na Tríplice Fronteira e ficar com o dinheiro que ele esconde em sua mansão, no meio da selva.
A participação de Kathryn Bigelow e Mark Boal na produção (o projeto foi inicialmente desenvolvido pela dupla de Guerra ao Terror e A Hora mais Escura como um longa para Bigelow dirigir) não significa que Operação Fronteira centra sua preocupação no factual; na verdade a geopolítica aqui é tratada bem superficialmente e Chandor só a usa para justificar a ambientação. Ele busca uma narrativa concisa e urgente de ação, com variações de dificuldade e desafio (a chuva na floresta, os Andes, tiroteio em favela); de novo, a moral está na ação. Chandor e Bigelow têm isso em comum, aliás.
Soa como uma correção de rumo depois que Chandor buscou o relato mais operístico em O Ano mais Violento, seu flerte vacilante com o épico policial hollywoodiano. Embora Operação Fronteira seja menos pretensioso, os nomes envolvidos na produção fazem parecer que o longa não é só um exercício de gênero. Inclusive o verdadeiro avistamento de famosos que é o elenco principal pode ser distrativo. Para potencializar o drama da virada mais trágica do filme, Chandor parece até escolher os destinos dos personagens com base no nível de celebridade dos atores. Fica difícil desassociar realidade e ficção e realmente imergir na segunda.
Apesar dessas escolhas, Chandor faz o que pode para eliminar distrações e focar no que julga essencial, em termos de estudo de personagem e de jornada. O filme é bastante sucinto ao questionar a autoridade moral dos protagonistas, patriotas americanos educados a acreditar na altivez de quem guerreia, sem partir frontalmente para uma trama sobre estresse pós-traumático (como era Guerra ao Terror). Então há evidências sutis para casos de estudo: há o palestrante com a voz da razão que sofre em silêncio pelas mortes que provocou, há o alcoólatra passivo-agressivo, o frustrado com problema com drogas, o lutador de MMA (que no filme se associa com uma vida de pária, pois não é um esporte "nobre"). Operação Fronteira é um filme moral que os coloca em situação de provação para questionar a fortaleza das convicções e do discurso, enfim, e Chandor se equilibra entre o pró e o contra: priorizar o essencial nos personagens e banalizar seus arcos pela simplificação.
A impressão que fica é que falta algo para que a proposta saia mesmo do chão. Operação Fronteira não é exatamente condescendente com seus personagens, mas ao buscar o essencial nos arcos dramáticos o filme parece esgotá-los rápido. Não se trata de um drama em que a provação contra a natureza e o mal dos homens se traduz numa experiência visceral de superação, como aconteceria num filme de guerra de Werner Herzog, por exemplo, como O Sobrevivente. Mesmo dentro da cinematografia de Chandor há um filme melhor sobre desarticulação de discurso diante de um teste de sobrevivência na natureza, o drama de naufrágio Até o Fim.
Operação Fronteira atrai porque é o tipo de relato com um bom potencial de desarticulação: esperamos uma trama de guerra tradicional, triunfante (o que inclusive a última cena valida), mas deparamos com uma história de danação faustiana, que sequestra o gênero e o triunfalismo para problematizar justamente a guerra e seus espólios. Tudo isso, porém, com o filme entregue, acaba rendendo mais na teoria que na prática.