Durante uma recente entrevista com os irmãos Bobby e Peter Farrelly, questionei-os sobre um novo projeto... “Não será um filme com o Selo Farrelly”, responderam rápido, referindo-se à temática mais familiar desse futuro trabalho. A afirmação, ainda que breve, prova que a dupla não só conhece, como aprecia, sua fama como criadores de comédias adultas escrachadas.
Passe Livre (Hall Pass, 2011), mais recente trabalho dos irmãos cineastas, integra justamente esse grupo na cinematografia dos Farrelly, um que usa o absurdo, as escatologias e o sexo para fazer rir. O filme é muito mais próximo de Quem Vai Ficar com Mary, Debi & Lóide e Eu, Eu Mesmo e Irene do que as comédias mais recentes deles, como Antes Só do que Mal Casado e Amor em Jogo. Um benvindo retorno à boa forma dos Farrelly, portanto, motivado - na visão hollywoodiana, em que é necessário um sucesso de terceiros para devolver a mestres seu ofício - pelo retorno das comédias adultas de besteirol como Se Beber Não Case.
Na trama, dois amigos, vividos por Owen Wilson e Jason Sudeikis, ganham das respectivas esposas (Jenna Fischer e Christina Applegate) um passe livre para a infidelidade durante uma semana. A decisão das mulheres acontece quando elas percebem que os maridos, chegando à meia-idade, acreditam ser capazes de conseguir qualquer mulher que desejarem. À soberba dos machos juntam-se o tédio do casamento de décadas, a carência de sexo e o Eldorado do cotidiano, um que estampa a capa de nove entre dez revistas Nova, o mítico bordão “como apimentar a relação”.
O elenco principal não compromete, faz seu trabalho sem surpresas (já faz tempo que Wilson atua burocraticamente), algo que o filme reserva aos personagens periféricos, brilhantemente selecionados. Stephen Merchant, cocriador do The Office original; J.B. Smoove, que despontou nas últimas temporadas de Segura a Onda; Larry Joe Campbell, o gorducho Andy de Acording to Jim; e o genial Richard Jenkins, parte já consagrada da instituição Farrelly de comédia, interpretam os melhores amigos da dupla - e sequestram cada cena em que aparecem com as melhores piadas do filme (a partida de golfe é antológica). Os Farrelly também sempre se superaram no olho para talentos.
Mais do que apenas uma história engraçada, Passe Livre, ainda que não seja um de seus melhores trabalhos, devolve aos cineastas a liberdade de veicular suas piadas dentro de um gênero estabelecido, algo que não acontecia desde O Amor é Cego. Em estrutura, afinal, trata-se de uma comédia romântica - não estão os protagonistas tentando acertar sua vidas amorosas? -, mas uma inchada de gags que, para muitos, estão flertando com o mau-gosto... até que explodem na sua cara como (literalmente) um jorro fecal.
Passe Livre
Passe Livre
Passe Livre
Enquanto os detratores dos Farrelly têm sua impressão de infantilização comprovada por cenas assim, para quem aprecia esse tipo de humor, que remexe no conteúdo das entranhas, é extremamente satisfatório ver os diretores e roteiristas voltando a fazer filmes cômicos adultos (e surpreendentemente sensíveis ao final) que colocam os existencialismos em um distante terceiro plano. Entre a matéria fecal e as lágrimas de gargalhadas, os questionamentos sobre a vida, o amadurecimento e os relacionamentos, afinal, estão todos lá para quem quiser procurar.
Passe Livre | Cinemas e horários