A estreia do remake em live-action de Mulan, da Disney, é um dos acontecimentos deste segundo semestre, por uma série de fatores - desde as controvérsias do discurso pró-regime na China até as implicações do lançamento em formato digital no contexto da pandemia.
Enquanto o filme não chega no Brasil (a previsão é 17 de novembro, com a estreia do Disney+ no país), dá pra fazer um intenso aquecimento com a oferta de épicos que os streamings trazem por aqui. É uma especialidade chinesa revisitar o folclore local e a história do império de um ponto de vista cerimonioso, mas é também no cinema de ação de época que alguns dos principais cineastas do país fazem suas experimentações mais arrojadas com o CGI.
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A Lenda do Rei Macaco 2
Quem conhece o básico de Dragon Ball está careca de saber da Jornada ao Oeste, as lendas que recontam as trocas entre China e Índia nos anos de consolidação do budismo no século VI. O diretor Pou-Soi Cheang adapta os eventos históricos numa festa carnavalesca de divindades e criaturas míticas, de espetaculares fundos digitais e cenas de batalha apoteóticas. Não é preciso ter visto o filme anterior para pegar o que acontece neste, mesmo porque o principal é o desfile de astros e a grandiosidade - um indício da importância que os blockbusters chineses dão para as autohomenagens.
Disponível na Netflix.
O Retorno do Dragão: A Cidade Perdida
Um dos produtores mais prolíficos do cinema chinês, Tsui Hark também se aventura na direção, sempre com resultados imprevisíveis. Este filme de 2011 foi promovido na época como a grande chegada do 3D ao gênero do wuxia (as fantasias de artes marciais ambientadas na China antiga) e é, como um bom blockbuster local, absolutamente abarrotado de personagens e reviravoltas. Pode ser difícil acompanhar a trama desta releitura do clássico Dragon Gate Inn (que o próprio Tsui já havia refilmado quando produziu New Dragon Gate Inn em 1992) mas, como bom coreografista de câmera e ação, além de arrojado adepto das possibilidades da computação gráfica, Tsui faz o arrebatamento visual valer a sessão.
Disponível no Amazon Prime Video.
Justice, My Foot!
Este filme de 1992 já mostrava algumas das qualidades que tornaram Johnnie To o principal cineasta chinês do circuito de cinema mundial de vanguarda nos anos 2000. É uma comédia de tribunal e ao mesmo tempo uma fantasia de artes marciais, sobre um advogado aposentado que volta ao ofício para defender uma mulher de um complô de autoridades corruptas na China imperial. A forma como To vai e vem entre uma comédia de texto rápido e o humor pautado pelo pastelão visual, sempre com cortes muito precisos e rápidos, é absolutamente hipnotizante.
Disponível na Netflix.
A Câmara 36 de Shaolin
O longa de 1978 é um dos maiores clássicos da Shaw Brothers, a produtora de filmes de Hong Kong que foi, em boa medida, a principal fonte de produtos durante a popularização mundial do kung fu nos anos 1970. Como é praxe, a trama ficcionaliza eventos com heróis históricos chineses, no caso um estudante que decide treinar num templo shaolin depois que o governo opressor local extermina um grupo colegial de manifestantes. Muitos anos depois de estrelar A Câmara 36 de Shaolin e suas continuações, o astro Gordon Liu teve sua importância reconhecida em Hollywood ao ganhar de Quentin Tarantino o papel de Pai Mei em Kill Bill 2.
Disponível na Netflix.
O Monge Trapalhão
Depois de Justice, My Foot!, este filme de 1993 foi a segunda e última colaboração entre o diretor Johnnie To e o astro Stephen Chow, que já começava então a trilhar um caminho próprio atrás das câmeras. É um grande compêndio de figuras folclóricas locais, desde o próprio “monge maluco” (inspirado em Ji Gong, personagem do período da dinastia Song) até os três personagens típicos (o pedinte de rua, a prostituta e o bandido) que na trama são colocados no meio de um desafio entre deuses para testar a virtude dos homens. Não falta nem a cena de luta contra um demônio gigante, e a parceria entre To e Chow se encerra ao som de muita voadora no peito.
Disponível na Netflix.
Baahubali 2: A Conclusão
Se a China foi até a Índia pegar os papiros dos textos sagrados do budismo, nada mais justo que o cinema indiano pegue emprestado o gosto chinês pelos épicos de batalhas em CGI. Os dois filmes de Baahubali - que se completam com situações revisitadas, mais ou menos como aconteceu quando De Volta para o Futuro teve uma continuação - foram lançados em 2015 e 2017 e são os responsáveis pelo sucesso emergente de “Tollywood”, indústria do Centro-Sul do país com filmes falados no idioma telugu. A história medieval de dois irmãos que disputam o reino de Mahishmati não é só um dos maiores sucessos do cinema indiano mas também um grande espetáculo visual da era da computação gráfica.
Disponível na Netflix.
Avatar: A Lenda de Korra
Diz muito sobre a importância histórica de Mulan o fato de a maioria dos épicos orientais serem estrelados por homens. Pois uma das grandes qualidades da continuação de Avatar foi justamente inverter papéis e colocar uma garota, Korra, no lugar querido pelos fãs que antes Aang ocupava. Ao lado da proeminência que Ahsoka Tano adquiriu em Clone Wars, a série derivada de Avatar é um grande atestado dos anos 2000 de que épicos de lutas e espadas - wuxia ou não, com sabres-de-luz ou não - já deixaram há muito tempo de ser coisa apenas dos meninos.
Disponível no Amazon Prime Video.