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A grande ilusão

A grande ilusão

24.08.2001, às 00H00.
Atualizada em 07.11.2016, ÀS 12H03
A máxima já atravessa décadas e décadas de conflitos infindáveis, sempre com um apelo pacificador inegável, mas nunca com a devida assimilação prática. "Na guerra, não existem vencedores, apenas derrotados". No período localizado entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, as décadas de 20 e 30, a Europa pôde comprovar toda a veracidade cruel do ditado. Países arrasados, povos amaldiçoados. Fossem levadas em conta apenas essas premissas, o filme de 1937 "A Grande Ilusão" ("La Grande Illusion"), do mestre francês Jean Renoir (1894-1979), um libelo inovador contra a banalidade da luta, um defensor do lema descrito acima, já poderia ser considerado um clássico imortal.

Nessa época, o cinema começava a conhecer as suas potencialidades visuais, sonoras - e persuasivas. O russo Sergei Eisenstein (1898-1948) inventava os fundamentos da propaganda socialista. Hollywood surgia como um meio eficaz de promover os valores da sociedade americana. Renoir aproveita a desencanto do mundo e cria, num filme crítico e apartidário, um manifesto belíssimo da paz. Filho do gênio impressionista Pierre Auguste Renoir (1841-1919), Jean absorveu do pai o gosto pelas artes, a forte referência da fotografia, das paisagens como cenário de dramas humanos. Influenciador de toda a geração da Nouvelle Vague, também contribuiu para a formação da Sétima Arte com pequenos detalhes como o plano-sequência e a perspectiva em profundidade. Já dos serviços prestados ao exército francês na Primeira Guerra, Renoir adquiriu um olhar próprio, realista, sobre as verdades do campo de batalha.

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Nos idos de 1916, um grupo de combatentes franceses acaba aprisionado numa base do exército alemão. A resistência à situação acontece de formas diversas, entre tentativas de fuga, espetáculos teatrais e esperança por boas notícias. "É tudo uma grande ilusão... esperar que a guerra cesse", esbraveja o tenente Maréchal (Jean Gabin, 1904-1976). Além dele, o Capitão Boieldieu (Pierre Fresnay, 1897-1975) e o tenente Rosenthal (Marcel Dalio, 1900-1973) sonham, cada um a seu modo, com a liberdade. Depois de alguns meses, os três são tranferidos para a fortaleza comandada pelo Capitão Von Rauffenstein (Erich von Stroheim, 1885-1957).

Até aqui, Renoir trata de mesclar momentos de humor e abordagens conscientes com tomadas aéreas e fundos de cena bem ousados. A partir da estadia no castelo alemão, começa a fulgurar um aspecto novo, humanista em sua essência, mas que não dispensa a reflexão social, o miolo da obra. Apesar de unidos, os franceses guardam entre si diferenças indeléveis. Maréchal, um civil camponês, entrara em combate por amor à pátria. O banqueiro Rosenthal, descendente de judeus, faz a alegria dos prisioneiros com o estoque de comida que recebe por correspondência. Boiedieu, enfim, se apresenta como um aristocrata, um legítimo homem de guerra, fiel aos seus ideais.

E exatamente o status de Boiedieu o aproxima do comandante alemão Von Rauffenstein, um anfitrião dedicado, apesar da situação. Entre eles existe um certo sentimento de cumplicidade. Ambos prevêem o futuro desastroso do conflito. Enquanto isso, as comodidades da fortaleza não acalmam Maréchal - que planeja a sua fuga. Assim, coloca-se um dilema: a passividade versus a revolta, a sensação de comodidade contra a amizade. Tido por muitos como um dos melhores filmes da história, foi indicado ao Oscar principal (na época, não havia a categoria Filme Estrangeiro) e ganhou o prêmio do Júri em Veneza. Mas que o tom humanista ou os prêmios internacionais não escondam o desejo de Renoir. Ao fim de tudo, divulgar a máxima: "Da guerra, sobram apenas os derrotados".             

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