Ao longo de 10 anos e quatro filmes, John Wick pouco tentou explicar a fantasia por trás de tanta porradaria. Como norma, os longas se afastaram de qualquer tipo de exposição que pudesse diminuir os mistérios fascinantes que cercam o mundo cinzento do viúvo assassino ou distrair da ação incansável pela qual a franquia ficou famosa. Parece paradoxal, então, que o título se expanda para a TV a fim de explorar o passado de alguns personagens importantes. Apesar de O Continental ser, de fato, uma explicação para alguns fatos da franquia, a minissérie não tenta, ao menos em seu primeiro capítulo, resolver nenhuma das características mais inexplicáveis, preferindo focar num desenvolvimento mais profundo de personagens.
Quem espera que a minissérie, que se passa em Nova York dos anos 1970, seja apenas uma repetição de John Wick protagonizada por novos rostos talvez se decepcione. Óbvio que a estreia da série tem cenas de ação espetaculares — a briga de Frankie (Ben Robson) nas escadarias do Continental, inclusive, é uma das mais legais e criativas da franquia —, mas o relacionamento dos principais personagens de O Continental se dá muito mais por meio de diálogos que nos filmes.
Apesar desse apreço pelo desenvolvimento falado, a produção de Albert Hughes nunca é excessivamente verborrágica e pulveriza suas exposições por diferentes cenas, evitando um exposition dump que prejudicaria o ritmo da série. Winston (Colin Woodell), por exemplo, tem sua juventude empreendedora e afastamento do irmão resumidos em curtas, mas eficazes, menções ao longo dos primeiros 90 minutos da produção, de modo que ele mantém o charme quase místico que o cerca também na versão vivida por Ian McShane. Por mais básica que seja, essa diferença de execução dá a O Continental uma personalidade própria dentro da franquia, permitindo inclusive que a série possa ser assistida sem que o espectador precise de um conhecimento prévio sobre John Wick.
Há em O Continental um belo casamento entre direção e trilha sonora, com Hughes incluindo needle drops que maximizam a ambientação setentista da minissérie. A inclusão de alguns sucessos de diferentes gêneros dos anos 1970 ainda concebe ao primeiro capítulo um ritmo quase dançante e que faz com que a urgência dos acontecimentos da trama seja sentida até nos poucos momentos de respiro e alívio cômico.
Nada disso, no entanto, trai o preceito da franquia de manter seus mistérios longe dos olhos do espectador. Os principais segredos de John Wick, como o significado das moedas ou a origem da Alta Cúpula, seguem sem ser tocados nesse início de minissérie. Embora seja investigado um pouco mais profundamente aqui por alguns personagens, o submundo criminoso de O Continental parece introduzir mais perguntas sem respostas à medida que a história se desenrola.
Fugindo da hiperexposição desnecessária que já vitimou inúmeras franquias ao longo dos anos, O Continental mantém presente a violência estilizada de John Wick, mas constrói uma identidade única ao adicionar elementos próprios à fórmula da franquia. Ainda que menos alucinante que os filmes, a minissérie tem um começo animador, o que já é mais do que se pode dizer de muitos grandes spin-offs televisivos por aí.