Embora tenha só 49 anos, Ben Affleck já se qualifica para uma nova volta por cima na temporada de premiações de Hollywood, uma década depois de levar o Oscar por Argo (2012) e quase 25 desde o Oscar de roteiro por Gênio Indomável (1997). Entra nesse pacote midiático tanto a volta da relação com Jennifer Lopez quanto os filmes sobre alcoolismo - particularmente O Caminho de Volta, de 2020 - em que Affleck exorciza seus demônios reais com a bebida.
Nesta semana, Affleck foi indicado ao SAG Awards por seu papel de coadjuvante em Bar, Doce Lar, comédia dramática dirigida por George Clooney baseada no livro de memórias de J.R. Moehringer. O filme conta a história de um garoto abandonado pelo pai que toma para si os sonhos da mãe, de fazer uma faculdade e vencer na vida. Para tanto ele tem o apoio inestimável de seu tio Charlie (papel de Affleck), um dono de bar de Long Island que ensinará ao garoto - vivido por Daniel Ranieri, Tye Sheridan e Ron Livingstone (na narração em off) em idades distintas - uma coisa ou outra sobre bebidas, livros, mulheres, dinheiro e hombridade.
Affleck não está particularmente notável no filme, e inclusive é possível dizer que ele atua alegremente em modo avião, mas o personagem é desenhado de maneira perfeita para dar ao ator uma oportunidade de ser bonachão, galante e irônico ao mesmo tempo. É um papel que não oferece nenhum desafio particular, e basta o carisma de Affleck para tocar as cenas adiante. Dono do seu território, como se fosse um poço de sabedoria, tio Charlie permite que Affleck conduza o personagem na base da experiência de vida, seja encostado numa poltrona ou apoiado no balcão do bar. A distância que ele mantém do drama é sempre segura; na única cena em que Charlie apanha, inclusive, o nosso ponto de vista é encoberto por um carro.
No geral é isso que Bar, Doce Lar tem a oferecer, uma experiência calorosa e desapegada montada por homens bem-sucedidos com um propósito confortavelmente nostálgico e autocelebratório - não apenas Affleck e Clooney, mas também o próprio Moehringer, cujo grande feito na sua carreira de escritor foi contar a história de si mesmo. Como diretor, o que Clooney faz com esse material está longe de oferecer ousadias, com exceção de uns zoom-ins mais exibicionistas, a título de efeito cômico, e algumas elipses que encurtam eventos dramáticos (como os reencontros com Sidney ou a formatura em Yale) para reforçar o despojamento bem humorado do filme.
Esse despojamento, inscrito nos saltos temporais e no encurtamento das cenas (basta prestar atenção em como Bar, Doce Lar é feito de dezenas de cenas, todas meio breves, panorâmicas), é uma característica muito presente no cinema de apelo indie americano. A questão é que Clooney já parece bem defasado (ou no mínimo bem-sucedido demais) para dar meia-volta e arriscar agora uma narrativa de underdog como nas comédias universitárias de Whit Stillman ou Noah Baumbach. Seu Bar, Doce Lar não se engaja muito dramaticamente nem no retrato caricato da classe média baixa americana, como faria um David O. Russell se tivesse esse material na mão.
Da mesma forma, então, que Ben Affleck chegará ao SAG com a consciência tranquila de jogar com a camisa, sem precisar suar demais, George Clooney olha para o material do livro de Moehringer, identifica ali um romantismo que jamais poderia ferir ninguém, e escolhe fazer o filme mais literal possível com isso. Quando as coisas ameaçam um pouco saírem do controle, ou do script, já está na hora de fechar a conta e apagar as luzes.