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SWU 2010

Festival ainda precisa amadurecer para ficar verde

13.10.2010, às 00H53.
Atualizada em 09.11.2016, ÀS 16H08

Com o som mais alto e grosso entre todas as bandas escaladas, os Queens of The Stone Age encerraram com energia boa a primeira edição do SWU - festival que, três dias antes, parecia à beira do colapso.

Pixies

Pixies

SWU

Fotos: Liliane Callegari (Pixies, The Mars Volta e Rage Against the Machine) e Divulgação

The Mars Volta

The Mars Volta

Regina Spektor

Regina Spektor

Queens of the Stone Age

Queens of the Stone Age

Los Hermanos

Los Hermanos

Dave Matthews Band

Dave Matthews Band

Rage Against the Machine

Rage Against the Machine

A trupe de Josh Homme entrou no palco com quase uma hora de atraso (um dos poucos do evento, que primou pela pontualidade dos shows principais), mas mostrou rapidamente porque ainda é a principal banda de "rock macho" que temos hoje por aí. Sem grandes firulas ou afetações, pesaram a mão na guitarra, no barulho e nos hits.

Rated R, álbum lançado há 10 anos, guiou a apresentação a partir de "Feel Good Hit of The Summer", que abriu - "Monsters in The Parasol" viria logo depois. Os últimos três discos também contribuíram em seguida - "Burn the Witch" de Lullabies to Paralyze (2005) e "Sick, Sick, Sick" do último Era Vulgaris (2007) -, mas foi com Songs for The Deaf (2003) e suas "Go With The Flow" e "No One Knows" que o QTOSA fechou o pacote de grande show do evento.

Resultado muito diferente do RATM, outra esperada sigla californiana que tocou por lá. Estreando no Brasil com mais de uma década de atraso, o Rage Against The Machine foi headliner da noite dedicada às bandas ressuscitadas - ao lado dos Mutantes e Los Hermanos. O quarteto "revolucionário" liderado por Zack de la Rocha entrou no palco logo após o show (esquisitíssimo) da texana The Mars Volta e só encontrou problemas que minaram uma apresentação que poderia ser histórica.

Logo no começo, depois de inflamar os fãs com "Bombtrack" (do primeiro álbum, homônimo, de 1992), a banda teve seu show interrompido pela organização do festival. Seguranças tentavam conter a plateia, que se esforçava para derrubar as grades entre a pista normal e a chamada premium (cujo ingresso custava R$ 400 a mais), enquanto um locutor pedia que 50 mil pessoas dessem "três passos para trás" - numa tentativa, talvez, de bater o recorde na maior coreografia conjunta da história de Itu.

De la Rocha, ao contrário do esperado do líder de uma banda que prega a revolta contra o "sistema", entrou na onda e também pediu que o público recuasse. Castigo: quando o show foi retomado, o sistema de som falhou duas vezes, deixando o mar de pessoas a ver navios - e uma banda tocando ensandecida para seu próprio retorno.

Mas noves fora, apesar da falência do discurso anarquista das letras do RATM - que envelheceram mal nesses quase 20 anos -, a banda é mais do que competente e não decepciona no palco. De la Rocha é um vocalista impressionante, assim como a técnica toda própria do guitarrista Tom Morello (de boné do MST na cabeça, mas ganhando bem para tocar em uma fazenda particular de 200 mil m2). Faixas como "Bulls on Parade", "Bullet in The Head" e a clássica "Killing in The Name", que encerrou a noite, validam a qualidade dos californianos.

A sorte é que ninguém mais acredita no discurso como deveria. Sorte da própria plateia, que sofreu para fugir da Fazenda Maeda no final da primeiro noite, e dos organizadores do SWU, que conseguiram passar incólumes sem nenhuma ocorrência grave. Congestionamentos nos estacionamentos, confusão, desinformação e falta de transporte para os presentes fizeram daquela uma longa madrugada, com situações surreais como caminhadas de quilômetros até o meio da rodovia Castelo Branco, atrás de uma rota de fuga.

Faz questionar a validade de se promover um pretenso semi-Woodstock em uma (mesmo que belíssima) fazenda a 15 quilômetros do centro de Itu, a cidade mais próxima. Pesqueiros, natureza e florestas de eucalipto não compensam erros primários de organização e estrutura.

Outro ponto muito (muito mesmo) questionável é o discurso sustentável do SWU. Junto da moda verde - nada dispensável - que envolve o país, o festival se propôs a ser um evento referência na defesa do meio ambiente.

Mas como se fazer um festival de rock que não agride a natureza? A resposta é um mistério que eles estão longe de desvendar. Apesar de iniciativas louváveis - como o Fórum de discussão sobre sustentabilidade, as centrais de triagem do lixo ali produzido, os centros de energia solar ou eólica e os geradores movidos a biodiesel - o gosto que fica é que são movimentos pontuais que, na verdade, não são mais do que obrigação em uma estrutura moderna e gigante como foi o SWU.

Pois de resto o que se viu foi o desperdício de matéria prima e pouca sustentabilidade. Fora dos bastidores, era um festival como qualquer outro, com estruturas dispensáveis e nenhuma economia extra. De que adianta totens feitos de lixo recicláveis se os copos plásticos das bebidas não podem ser reutilizados e o papel e sacos plásticos ainda são usados sem parcimônia? E como fica a cota de carbono, depois de arrastar 150 mil pessoas (mais centenas de bandas e todo o staff) durante três dias para um espaço tão longe das capitais?

Ainda falta muita reflexão além das reuniões de marketing, muito amadurecimento para ganhar a pecha de festival verde.

Outros destaques

  • Além do QTSA e do encerramento do Linkin Park, com seu show à la VMA, outro grande ponto alto do último dia ficou por conta dos Pixies e sua turnê comemorativa dos 20 anos do álbum Doolittle. A banda estava claramente muito mais interessada e entrosada do que na sua última passagem por aqui, em 2004. Frank Black e Kim Deal eram amigos novamente, para sorte do público. E foi a baixista, que não parou de sorrir um segundo, a responsável pelos pontos altos do show.
    Doolittle e Surfer Rosa (1988) lideraram o repertório de clássicos, com "Wave of Mutilation", "Debaser", "Here Comes Your Man", "La La Love You", "Monkey Gone to Heaven"... Tudo perfeito como deveria ser, apesar do som baixo (ainda mais depois da barulheira incomparável de Josh Homme). No bis, "Where is My Mind" foi emendada com a "Gigantic" de Kim nos vocais - quando a baixista, docinha, interrompeu o barulho para dar "boa noite" para cada um dos integrantes. Era tanto amor que dava até para desconfiar. Mas melhor assim do que a banda de 2004, que parecia prestes a distribuir cusparadas de desprezo entre si.

  • De instrumentos surrados e caras idem, sem qualquer pose de roqueiros, o trio do Yo La Tengo mostrou por que é a banda adorada por 10 em cada 10 indies. Mesmo com apenas esses dez fãs perdidos na plateia, o grupo desfiou uma lista dos seus hits, como "Sugarcube", "Tom Courtenay" e "Autum Sweater". No final, ainda sob vaias dos fãs de Linkin Park, o guitarrista Ira Kaplan liderou uma distorção de 15 minutos de "Pass the Hatchet, I Think I'm Goodkind", ao lado do baixo hipnótico de James McNew e da bateria de Georgia Hubley, com direito a cordas de guitarra arrebentadas. Histórico.

  • O segundo dia foi dedicado ao que se pode chamar de "pop adulto contemporâneo", com a bela e competentíssima Joss Stone, a fraca porém radiofônica Sublime With Rome e o megashow de Dave Matthews Band (responsável pelo grande e único "momento Woodstock" do SWU, encerrando sua passagem com "All Along the Watchtower", de Bob Dylan).
    Mas quem chamou atenção maior foi a pequena russa Regina Spektor. Intimista e nada intimidadora, a moça conseguiu manter quieta a plateia durante um show praticamente baseado no seu piano e em uma dupla de violino e violoncelo, mais uma discreta bateria. Mesmo com o gigantismo do palco, e com o repertório baseado no seu último disco, Far (2009), mais introspectivo do que os anteriores, Regina venceu e deixou hits como "Fidelity", de Begin to Hope (2006), que já foi até trilha de novela no Brasil, para o final. Se em campo aberto é assim, resta imaginar como seria uma apresentação da cantora em um lugar com paredes e sem vento interferindo no som. Alô, produtores!

  • Cinco anos depois da sua primeira passagem, os Kings of Leon mostraram que encontraram seu target. Então indies, com um show irregular, os irmãos Followill se transformaram em banda de rock do grande público. Tanto que encerraram o dia da "música adulta" sem maiores estranhamentos, com sua mistura de country e rock setentista. Hits antigos ("Molly's Chamber") misturavam-se a recentes ("Sex on Fire" e "Use Somebody") e faixas de Come Around Sundown, disco que deve ser lançado nas próximas semanas. Não emocionam, mas cumprem bem o papel de banda de arena.

  • De lenço à la Jacques Le Clair amarrado no pescoço, o vocalista Cedric Bixler-Zavala liderou a passagem esquisitíssima da texana The Mars Volta no SWU. A banda já tinha feito apresentação elogiável no Tim Festival de 2004, mas desta vez, apesar de bom, o show pesou a mão no quesito inclassificável da banda - que vai do metal ao free jazz em poucos segundos. Tocando entre Los Hermanos e RATM, deixou uma plateia confusa durante as interações entre Cedric e o guitarrista-de-uma-dúzia-de-dedos Omar Rodríguez-López. E começar com uma mistura de "Cotopaxi" (faixa de Octahedron, álbum de 2009) mais uma versão de mais de 10 minutos de "Broken English", música de Marianne Faithfull de 1979, não ajudou a desmistificar a confusão.

  • Apesar de funcional, a escalação merece alguns puxões de orelha. Intercalar as adolescentes Incubus e Avenged Sevenfold com Queens of The Stone Age, Yo La Tengo e Pixies, na mesma noite, é esquizofrenia digna de Rock in Rio. Com os nossos últimos grandes festivais, achava-se que esse vício da falta de bom senso já tinha sido superado.

  • Ponto alto: a estrutura de dois palcos principais, um ao lado do outro, responsável pelos shows seguidos e sem grandes atrasos.

  • Ponto baixo: com escalação mais bem resolvida do que nos palcos principais, os outros dois espaços soaram como desperdício, com shows acontecendo simultaneamente aos headliners. A tenda eletrônica reuniu nomes (Aeroplane, Gui Boratto, MSTRKRFT) que davam um pontapé nas últimas edições do falecido Skol Beats. Assim como o palco patrocinado pela Oi, dedicado a bandas brasileiras da safra recente (com bons convocados como BNegão, Otto, CSS, Rubinho Jacobina e Tulipa Ruiz, enquanto Capital Inicial e Jota Quest passeavam pelo palco principal, sabe-se lá pra quê) e pequenas estrelas gringas do indie (Apples in Stereo e Josh Rouse). Os dois palcos foram responsávels por grandes momentos que passaram despercebidos em meio à megalomania do SWU e valiam ser desmembrados em festivais à parte.