Quarenta minutos de cenas de ação sem interrupção depois, ouvidos ainda zunindo e olhos vibrando do frenesi 3D, não sei ao certo se Michael Bay é um gênio que será reverenciado no futuro ou o arauto supremo do manto de ignorância hollywoodiana. Transformers 3 - O Lado Oculto da Lua (Transformers - Dark of the Moon, 2011) faz isso com as pessoas.
Transformers 3
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Fala-se muito do cinema como "ride", termo que se usa para definir brinquedos de parques de diversão nos EUA. É conversa recorrente entre executivos essa de comparar filmes com chapéus-mexicanos e carrinhos bate-bate - e Bay é porta-voz dela há anos, seu rei. Por desconhecimento ou pura sem-vergonhice (não importa), o diretor tentou no segundo filme da saga Transformers deixar de lado uma centena de anos de lições aperfeiçoadas pela Sétima Arte e preocupou-se apenas em engatar cenas incoerentes de ação e besteirol. Admitiu, bem mais tarde, que fez besteira e descobriu que, nas telas, mesmo montanhas russas precisam ter uma intenção narrativa.
Transformers 3 - O Lado Oculto da Lua é um pouco melhor nesse quesito ("no fundo do poço só há uma direção: para cima", dizem por aí). Há uma divertida relação com fatos históricos - que o roteiro busca amarrar com cenas de arquivo e recriações digitais (mal acabadas) de presidentes dos EUA - entre o destino de Cybertron, o planeta devastado pela guerra civil entre Autobots e Decepticons, e a corrida espacial travada por EUA e URSS nas décadas de 1950 e 60. Esse estofo histórico e os vislumbres do planeta robô dão um interesse renovado à série, ainda que desapareçam lá pelo meio do filme, logo depois que Buzz Aldrin - o próprio - dá as caras.
Mas não adianta buscar uma amarração e coerências narrativas superficiais se, no fundo, você não se importa muito com isso e o está fazendo apenas para aplacar o inevitável falatório. O péssimo desenvolvimento do "Núcleo Witwicky" salta aos olhos. O texto tenta explicar de duzentas maneiras diferentes - e com um elenco de peso, que inclui gente do gabarito de John Malkovich e Frances McDormand - que Sam Witwicky (Shia LaBeouf), sujeito formado em faculdade da Ivy League (grupo que reúne as oito melhores dos EUA), capaz de conquistar mulheres lindas, herói condecorado com medalha presidencial e humano escolhido como espécie de ligação para o contato com alienígenas, continua o mesmo perdedor do primeiro ato do primeiro filme. Desempregado, sustentado pela namorada (Rosie Huntington-Whiteley, gostosa igual a outra e igualmente vazia) e abandonado pelos aliens, ele vai trabalhar como contínuo em uma empresa de tecnologia. Haja suspensão de descrença...
Para cada descida da montanha-russa, porém, há aquele momento no topo, em que se ri da emoção anterior e prepara-se o espírito para a próxima queda. Armando o circo para o cataclísmico terceiro ato, o roteiro esfrega na cara do espectador alívios cômicos em cima de alívios cômicos. Ação e refresco, afinal, são as moléculas básicas do DNA do cinema de Michael Bay. E tome Ken Jeong (o Mr. Chou de Se Beber Não Case), um entre uma dezenas de personagens equivocados, fazendo suas caretas e em situações sexuais absolutamente deslocadas.
Bay, portanto, não aprendeu coisa alguma com os erros passados. Ele continua encarando os elementos que definem uma história como mera cola para as cenas de ação que ele quer mostrar. Fica óbvio que a ação é pensada primeiro, os grandes momentos climáticos, e só depois pensa-se em como chegar, o mais rapidamente possível, até eles.
A sorte do cineasta é que montanhas-russas são muito divertidas... e quando chegam esses momentos-assinatura de Bay, percebe-se que muito poucos cineastas são tão bons como ele quando o assunto é a demolição total de uma megalópole.
Chicago, coitadinha, não sobrevive ao ataque de 200 decepticons (com direito a lulão-robô-monstro, naves de combate, soldados de quatro olhos, o general Shockwave e Megatron desfigurado) na sequência final, que tem 40 minutos de explosões, atos de bravura, frases de impacto e muitas câmeras lentas. Essa última, uma espécie de cabresto tecnológico que o cineasta encontrou para conseguir filmar em 3D. A estereoscopia, afinal, exige takes mais longos, já que nossos limitados cérebros não conseguem processar cortes muito rápidos e o 3D ao mesmo tempo nas telas. A solução funciona muito bem: aprecia-se o embasbacante trabalho de computação gráfica da Industrial Light and Magic em detalhes e alta definição, com todas as milhares de partes móveis em cada um dos robôs, interagindo com o ambiente e com os humanos em sua volta.
O espetáculo é garantido (e fica melhor ainda em 3D, que está perfeito), mas sempre perigoso se não analisado. O General Bay, através do vozeirão do Líder Optimus (Peter Cullen), entoa mantras da direita republicana e invade o Iraque em plena Era Obama, enquanto pede que se "leve a luta até eles" com todo o aparato militar emprestado das forças armadas dos EUA. Propaganda pura - e as dezenas de agradecimentos militares nos créditos são mais uma prova disso.
De qualquer maneira, visualmente, Transformers 3 é o filme mais impressionante desde Avatar. Na coreografia da guerra particular de Bay, explosões reais e tridimensionais acontecem simultaneamente, enquanto exércitos se chocam em um espaço impossível de ser discernido como real ou imaginário, no que dá a impressão de ser o filme mais caro já feito, tamanha a sua qualidade. Explosivo e deslumbrante, mas burro. Muito burro.
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