Agora que conhecemos, por O Aviador (2004), a trajetória de glória transformada em reclusão de Howard Hughes, fica mais interessante acompanhar a história verídica da falsa biografia do bilionário, centro do interessante, por vezes empolgante, O Vigarista do Ano (The Hoax, 2006).
o vigarista do ano
Em 1970, o escritor Clifford Irving, para dar um novo gás em sua carreira, fingiu ter sido contratado pelo próprio Hughes para escrever sua autobiografia. Inving forjou assinatura e correspondências do bilionário e conseguiu vender o projeto do livro para a editora McGraw-Hill por uma fábula. Mas uma hora a farsa há de cair...
No filme, Richard Gere incorpora Irving à vontade - para um personagem embusteiro, um ator canastrão. Quando Gere atua em dramas, aquele tique da piscadela, quando o ator aperta os olhos como quem se esforça para lembrar o que almoçou no dia anterior, são terríveis. Em uma farsa, especialmente nas ótimas cenas de reuniões na McGraw-Hill, os trejeitos suspeitos de Gere caem muito bem.
Certo mérito deve ser atribuído ao diretor sueco Lasse Hallström, que nunca foi tido em ótima conta pela crítica mas conseguiu se filiar ao rarefeito "cinema de autor" em Hollywood depois de filmes como Regras da Vida (1999) e Chegadas e Partidas (2001). Em O Vigarista do Ano, Hallström emprega um arriscado recurso narrativo: ele elimina os tempos mortos do filme - aqueles planos gerais e planos de transição que intercalam momentos de densidade dramática - e pula de evento em evento com montagem acelerada.
Como resultado, a vertigem do período retratado em cena - governo Nixon com a paranóia ligada no máximo - se intensifica. E se intensifica em Clifford Irving. O falso biógrafo mal começa a escrever o livro e já se encontra no meio de uma crise de identidade, sem saber qual Hughes é o verdadeiro. Pior: acreditando nas próprias mentiras. Criador e criatura se misturam - o mote é mais do que clássico, mas neste filme ganha uma releitura digna.